Na cidade de Ronchamp, a sudeste de Paris, situa-se uma das obras mais significativas da carreira de Le Corbusier, a Capela Notre-Dame du Haut (Nossa Senhora das Alturas), ou mais comumente referida como Ronchamp.
Em 1950, Le Corbusier foi contratado para projetar uma igreja católica para substituir a igreja anteriormente destruída durante a Segunda Guerra Mundial. ”Uma capela de peregrinação? Isso interessa-me, é um problema de torneiras!”, declarava o arquiteto.
O sítio de Ronchamp era há muito tempo um lugar de peregrinação que estava profundamente enraizado na tradição católica, porém, após a guerra, ele foi destituído de seu principal símbolo de comunhão, sua igreja, atingida por um bombardeamento alemão, no outono de 1944. Esse mesmo edifício já havia substituído outro anterior, destruído por um incêncio em 1913.
O programa era simples: nave principal, três pequenas capelas para cultos mais reservados e independentes da missa coletiva e um altar externo para as cerimônias campais, nos dias de peregrinação. Foi pedido também uma sacristia e um pequeno escritório num piso superior. Além disso, o recoletamento das águas das chuvas era um fator importante para o projeto, devido à escassez da colina.
O edifício é configurado por quatro muros, bem definidos em planta, que conformam suas quatro fachadas e representam os quatro pontos cardiais. A grande, pesada e sinuosa coberta de concreto armado aparente é o que dá unidade ao conjunto e é o que evidencia os dois escorços -mais que quatro fachadas- sob os quais o edifício foi concebido: o escorço sudeste, formado por dois muros côncavos, com amplos beirais, convidando o acesso à capela e criando os espaços de congregação; e o escorço noroeste, formado por dois muros convexos, sem beirais, e demarcados pelas três torres das capelas discretamente separadas dos muros adjacentes.
O peso da coberta é reforçado pelo tom escuro e aparência tosca do concreto armado em contraste com os muros brancos e espessos que a sustentam. No entanto, tal massividade externa é subvertida no interior do edifício: uma linha de luz separa a coberta dos muros, tornando-a flutuante. Maciço e pesado externamente, a capela de Ronchamp é uma desmaterialização espacial produzida pela luz, que invade por todas as partes o seu interior, “como se escorresse”.
Dissimulada e diminuída posteriormente em incontáveis metáforas, a coberta da capela é uma estratégia de recoletamento de águas pluviais. Em seu ponto mais baixo, no muro oeste, uma gárgula dirige as águas a uma abertura no solo, com elementos geométricos sobressalientes, conectada ao reservatório.
Desde o cidade, abaixo do monte sobre o qual está implantada a capela, os muros e a coberta curvos são o que definem o edifício, que se impõe como uma resposta ao próprio sítio, embora sob um jogo de contrastes, tão correntes da prática corbusiana.
A Capela de Ronchamp consolida uma postura de Le Corbusier: a de se reinventar de tempos em tempos, de superar a si mesmo, de fazer o que antes negava e, ainda assim, alcançar um mesmo nível de consistência formal, espacial, material e fenomenológica.