Isso é o que muitos querem pensar. Desculpas? Falta de criatividade? Talvez uma combinação de ambas.
Os meios de transporte não motorizados são componentes importantes das estratégias de mobilidade na cidade moderna, com um grande potencial de impactar a qualidade de vida de seus habitantes e de beneficiar diretamente (exercício físico) e indiretamente (diminuição de poluentes) sua saúde. Isso, sem mencionar a oportunidade de diminuir um pouco o acelerado ritmo de vida urbana, de ter tempo para apreciar a cidade e todas as coisas interessantes que ela tem para oferecer aos seus habitantes.
Infelizmente parece mais fácil encontrar desvantagens e barreiras para sua implementação, e a topografia é normalmente uma delas (mesmo que em Lisboa pensem diferente). Deixando de lado o tema de segurança, é fácil entender porque as colinas íngremes em nossa cidade desencorajam tantos potenciais ciclistas urbanos: descê-las pode ser fácil pela manhã quando as pessoas se sentem ativas e cheias de energia, energia que não precisa ser usada e pode ser guardada para a jornada laboral. Mas... subir! Subir é um problema, especialmente ao final de uma pesada jornada de trabalho.
Países como a Colômbia tem sido o berço de alguns dos melhores ciclistas de montanha do mundo (os “besouros”), mas o cidadão comum não necessariamente procura reconhecimento nesse campo. Estamos, então, condenados pela natureza topográfica de nossas cidades? São as bicicletas uma solução factível somente para aqueles que vivem em cidades planas (que, aliás, são poucas nos Andes), ou na parte baixa dos vales? O que se pode esperar então de cidades como Medellín, onde uma porcentagem considerável da população vive nas encostas? Mas o que vemos como barreiras podem converter-se em ajuda. Basta somente sermos um pouco mais criativos e o que é, talvez, ainda mais importante: utilizar os recursos que temos (em muitos casos gratuitos). Mais a frente retomaremos este tema.
Por agora, pensemos em soluções que parecem ser mais óbvias, como por exemplo, os sistemas mecânicos de apoio aos ciclistas. E eles já foram inventados. A cidade norueguesa de Trondheim implementou em 1993 um sistema de apoio mecânico aos ciclistas que continua em funcionamento até hoje. É tecnicamente simples, fácil de usar e pouco invasivo no espaço público, quer dizer, possui pouco impacto sobre o espaço público e sobre os demais meios de transporte, sejam motorizados ou não:
É claro que um sistema mecânico como esse está conectado a outros componentes da cidade, começando pela cultura, o respeito aos ciclistas, os espaços destinados a eles, os limites de velocidade dos automóveis, etc. Mas, existe algum sistema novo para uma cidade que não necessite de uma análise sobre essa perspectiva? Tudo isso já está sendo trabalhado através de campanhas e iniciativas cidadãs. Mas a implementação do sistema não se discute, porque somente são vistas barreiras que a impedem.
Existem mais soluções para esse problema? Certamente existe. Uma opção é começar a analisar como a “barreira” topográfica pode ser explorada e se tornar uma solução e uma vantagem para as nossas cidades tão íngremes. E o melhor? Grátis.
Gunter Pauli, um conhecido empresário belga, comentou uma vez que a gravidade era a fonte energética menos explorada de todas. É claro que as centrais hidroelétricas fazem uso dela, mas já conhecemos os custos econômicos que elas trazem consigo, sem mencionar os custos ambientais e sociais. Não é necessário manter mega-soluções para aproveitar uma força da qual não podemos fugir por mais que queremos. Para contextualizar, sugiro esta “equação”, que muitos associarão às suas aulas de física no colégio:
Montanhas = Altura = Energia potencial
Agora vamos ao ponto: Por que não ver as colinas das nossas cidades como minas de energia? Será tão difícil criar maneiras de carregar nossas bicicletas quando descermos aos nossos trabalhos e utilizar a energia acumulada quando subimos de volta a casa? Em outros contextos já existem equipamentos que usam a gravidade de uma maneira muito eficiente e econômica: GravityLight. Nesse caso, é claro que um LED necessita de pouca energia, mas o ponto aqui é compreender a utilidade de usar a gravidade como fonte de energia. Além das bicicletas plug-in, existem outras opções que não requerem fontes externas, e por que não carregar as baterias e ao mesmo tempo atacar o sedentarismo no escritório? Os freios são outra fonte de carga que pode ser explorada, como fazem os carros e ônibus elétricos. Enormes desafios para inovadores e universidades locais!
A sugestão não é que os cidadãos tornem-se profissionais dos esportes extremos. Mas aqui há um exemplo do potencial das cidades latino-americanas quanto a esse tipo de energia: três minutos descendo em uma grande velocidade em Valparaíso. Em uma velocidade mais “normal”, não teremos tempo suficiente para gerar uma carga que possa nos levar mais tarde de volta para casa, montanha acima?
É necessário deixar de ver as cidades como parasitas que só consomem e acumulam o que os outros produzem. Se considerarmos as constantes e imprevisíveis crises energéticas , a dependência de governos instáveis (donos das grandes reservas de energia) e o esgotamento das fontes fósseis de energia, o aproveitamento de todos os recursos urbanos é indispensável para alcançar a segurança energética. Muitas cidades já utilizam seus desperdícios para gerar energia em forma de eletricidade ou de líquidos e gases combustíveis. Existem cidades que utilizam suas montanhas? Provavelmente não. Que montanha será preciso mover para que façam isso?
Por Santiago Mejia Dugand, doutorando da Universidade de Linköping, Suécia. Sua pesquisa concentra-se no papel que a tecnologia desempenha na resolução de problemas ambientais que as cidades têm enfrentado, e nas condições que facilitam ou dificultam a sua adoção e implementação. Membro da Equipe La Ciudad Verde. Via Plataforma Urbana. Tradução Camilla Ghisleni, ArchDaily Brasil.