Por João Filgueiras Lima
O local destinado à construção da Igreja do Centro Administrativo da Bahia conserva intacta sua beleza natural característica da paisagem de Salvador. Sentimos que nos impunha preservá-la respeitando seu relêvo e sua vegetação. Com êste critério foi fixado o partido do projeto. A indispensável modelação do terreno se integra à topografia existente e limita-se exclusivamente aos trechos onde se localizam as construções. Para o estabelecimento do sistema viário foi levada em conta, ainda, a intenção de utilizar os espaços vizinhos à Igreja como áreas de lazer do Centro Administrativo. Arruamentos estreitos, pavimentados em pedra e acompanhando as curvas de nível naturais serão usados indistintamente por veículos e pedestres. Os gramados que margeiam as vias de acesso e vias secundárias ligadas ao tronco principal serão utilizados como áreas de estacionamento. As ruas se alargam em locais mais sombreados e aprazíveis criando áreas de estar e descanso e servindo também para manobras de automóveis.
A construção principal foi localizada na parte mais alta da colina, com o piso na cota +47. O recinto da Igreja, cujo contorno se desenvolve segundo a forma de uma espiral está limitado por arrimos de pedra contendo o terreno que se eleva em taludes suaves até a cota +50.
O acesso principal se faz ao nível do piso.
Residência dos padres, salas para reuniões e sacristia foram projetadas em construção separada, no nível +44, com acesso por rampa ao recinto da Igreja. Todas as peças ligam-se a jardins internos que criam a necessária privatividade dos ambientes.
Batistério e Capela do Santíssimo foram localizados também em edificação independente. Em sua cobertura foram previstos vãos de iluminação zenital de modo a permitir a incidência de luz natural sobre o altar e pia batismal.
Essas duas construções, cujas paredes externas são também em pedra, contam discretamente na paisagem e seus contornos sublinham suavemente o perímetro da Igreja.
A cobertura da nave ergue-se no topo da colina e constitue o único elemento construido que marca vigorosamente a paisagem. E formada por pétalas de estrutura independente que se apoiam cada uma em pilar único situado no ponto em que as tensões de trabalho da peça se distribuem de forma mais homogênea.
As pétalas estão dispostas segundo um helicoide ascendente. Cada pétala se eleva em relação à anterior 50 cm com uma superposição de 1 m. No vão de 15 cm que resulta entre elas são fixados vidros do tipo “solar bronze”. Dessa forma, iluminação tangencial dourada incide internamente na superfície do concreto tornando a cobertura mais leve e mais rica.
O vão de 6 m compreendido entre a primeira e a última pétala proporciona iluminação intensa no local do altar. Nesse vão forma projetados caixilhos de ferro com vidros do tipo “veneglass” que criam a proteção necessária da insolação Norte.
Por imposição de ordem estrutural foram previstos alargamentos na parte superior dos pilares. Esses capiteis somam-se visualmente criando um contorno semelhante ao de arcadas sucessivas que define o espaço da nave. Estabelece-se assim, pela forma, um discreto contacto com as igrejas do passado.
A ventilação cruzada permanente se faz em todas as direções através dos vãos de contorno e a penetração de ar ao nível de utilização é controlada pelo painel de portas pivotantes do acesso; êste sistema, aliado ao isolamento térmico devido aos arrimos de pedra que envolvem o prédio e à proteção da insolação direta proporcionada pelos grandes balanços da cobertura, criam condições ideais de temperatura no recinto da Igreja.
O tratamento interno é austero e despojado. Os pisos serão executados com placas pré-moldadas de tamanhos variáveis, com juntas bem marcadas.
O painel de fundo do altar é constituido por peças robustas de madeira com secções variadas que se distribuem irregularmente, ora justapostas, ora separadas entre si cerca de 4 cm. Nesses espaços serão encaixados vidros coloridos.
Altar e púlpito serão construidos em concreto.
Os bancos serão peças maciças de madeira ligeiramente elevadas do piso.
As portas de acesso, paineis em treliças de madeira.
Assim é a Igreja que imaginamos para Salvador, cidade cuja cultura e tradição religiosa nos legaram tantas construções de grande beleza que enriquecem e marcam nossa arquitetura. A Igreja, embora simples e singela, conserva o caracter de dignidade indispensável a um templo católico. Procuramos deliberadamente empregar técnicas contrastantes, mas segundo um critério lógico que se ajustasse à nossa ideia inicial: o terreno tratado de forma amena e natural, com muros de pedra à maneira das construções coloniais, formando um receptáculo no qual se insere uma estrutura delicada, mas vigorosa, com grandes balanços em que foram especuladas generosamente todas as possibilidade do concreto armado.
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Arquitetos: João Filgueiras Lima
- Ano: 1975
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Fotografias:Ricardo Amado, Flickr Thiago Mendes, Felipe Paim