Descrição enviada pela equipe de projeto. A Casa das Galeotas é composta por um conjunto de armazéns e habitações, edificados entre o século XVIII e XX, muito desqualificados no início do projeto. A intervenção visou a preparação do conjunto arquitetónico para acolher as sedes da Casa da América Latina - CAL - e da União das Cidades Capitais de Língua Luso-Afro-Amero-Asiáticas – UCCLA.
O local de intervenção insere-se numa zona ribeirinha entre a Rua da Junqueira e a Avenida da Índia, em frente ao aterro ganho ao rio nos séculos XIX e XX. O primeiro registo destes edifícios na planta da cidade data de 1807. Desta planta consta unicamente o edifício perpendicular ao rio, sendo apenas possível identificar o conjunto completo na planta de Silva Pinto em 1911. Trata-se de uma estrutura construída ao longo de cerca de cem anos destinada a acolher uma zona industrial / armazenamento no piso térreo e habitação no piso superior. Destacam-se algumas habitações modestas, possivelmente ligadas à produção, e uma outra, de caráter burguês, destinada ao proprietário. Os três edifícios – nascente, sul e poente – formam um U.
O programa de intervenção organiza-se em quatro áreas distintas: 1) restaurante /cafetaria, no piso térreo do corpo poente, com possibilidade de funcionamento autónomo do restante conjunto; 2) zona administrativa da UCCLA nos corpos Sul e Poente; 3) zona administrativa da CAL no corpo Sul; 4) zona comum às duas entidades, composta por zona expositiva e auditório no piso térreo do corpo a nascente – novo volume – e do corpo a sul.
A entrada nobre do edifício faz-se através de uma passagem coberta que liga a Avenida da Índia ao interior do conjunto. É a partir deste jardim central que se faz o acesso ao restaurante e à receção da UCCLA e CAL. O conjunto conta ainda com acessos a partir da Travessa dos Algarves que correspondem às antigas entradas para as habitações, agora transformadas em acessos de serviço, afetos ao restaurante. Criam-se ainda novas entradas a nascente, destacando-se um acesso ao parque de estacionamento.
O restaurante situa-se no edifício mais antigo do conjunto – a poente -, tendo capacidade para 200 pessoas. Neste espaço, onde são restaurados os pavimentos e o arco em falta, opta-se por tornar visível estrutura do teto, contribuindo assim para acentuar o caráter “tectónico” da sala. O restaurante dispõe também de um espaço de esplanada localizada no topo sul do jardim.
O espaço expositivo e o auditório, utilizados pela UCCLA e pela CAL, podem funcionar de forma independente do restante conjunto. Para tal, contam com um pátio de entrada que garante esta autonomia quando os restantes espaços estão encerrados. O foyer – programa atribuído ao novo volume construído - é um espaço de extensão de ambos os programas, assumindo a sua contemporaneidade pela utilização de uma estrutura de madeira e vidro que atravessa todo o volume nascente.
As áreas de gabinetes da UCCLA e da CAL desenvolvem-se ao longo da fachada, numa sequência modular marcada pelo ritmo dos vãos exteriores, recorrendo a um sistema de divisórias que admite alguma flexibilidade futura. Também as instalações técnicas são colocadas modularmente a eixo dos vãos exteriores.
O projeto procurou recuperar todos os elementos existentes que possuíam significado cultural. Preservaram-se as construções a nascente, de modo a conservar a memória histórica do conjunto. No antigo armazém situa-se hoje o auditório - um espaço polivalente com capacidade de 88 lugares – onde estão visíveis as asnas de madeira pré-existentes. As diversas questões técnicas, nomeadamente as da acústica, decorrentes desta opção pela conservação e reabilitação do volume existente, foram resolvidas através do revestimento com réguas de iroko.
A madeira é, afinal, o material unificador de toda a intervenção garantindo a continuidade entre as diversas partes do conjunto, entre o antigo e o novo. A sua utilização em estruturas de pavimento e coberturas – lamelados colados com pinho nacional -, em portas e caixilharias – iroko ou casquinha vermelha – soalhos e degraus – Riga – é transversal a todo o conjunto arquitetónico. A madeira foi trazida para o exterior na única ampliação de feição contemporânea do edifício - o foyer do auditório, cuja estrutura é de lamelados colados de Douglas fir, preparada para estar exposta à intempérie. Esta estrutura assume também a função de grelha de sombreamento do foyer.
De uma forma geral optou-se por restaurar os pavimentos - à exceção do espaço das escadas principais - e colocar coberturas novas.
PROJECTO DE AZULEJARIA
O projeto de azulejaria, da autoria das arquitetas Catarina e Rita Almada Negreiros, constitui um dos elementos centrais da intervenção neste conjunto, fundamental para a leitura deste projeto como uma operação de continuidade e não de rutura.
O trabalho realizado no volume sul do complexo consistiu no revestimento das suas fachadas nascente, sul e poente. Visto que os azulejos do século XIX existentes constituíam apenas um terço da superfície a revestir, foi necessário criar novos azulejos segundo uma lógica de desmultiplicação e simplificação do desenho original. Este desenho - de padrão com técnica de estampilha num só azulejo - é decomposto, isolando-se apenas um elemento da estampilha original em cada uma das sete novas variantes. Os novos azulejos não escondem a diferença de materialidade em relação ao original, fruto das novas técnicas de produção.
Parte-se da composição densa dos azulejos originais, colocados na parte inferior da fachada, e recorre-se à combinação de azulejos das setes novas variantes para criar um efeito de diluição até ao topo desta fachada, onde são unicamente utilizados azulejos totalmente brancos.