Black Box / Tectoniques

A casa DI-VA, cuja denominação é um anagrama com o nome dos proprietários, ocupa um espaço anteriormente vazio no distrito residencial Croix-Rousse de Lyon.

© Georges Fessy

Dado o limite de largura da fachada e o fato de que há um edifício diretamente do lado oposto, os arquitetos decidiram adotar uma estratégia que chamam de “judo-type”. A casa afasta-se de um confronto direto e explora as fendas na paisagem a fim de favorecer as vistas e os ambientes.

Inteiramente pré-fabricada, a casa foi construída em menos de uma semana. Sua aparição repentina causou a surpresa de vizinhos que tiveram reações distintas. Mas apesar da cor e da forma descompromissadas, a construção não expressa nenhuma agressividade. Pelo contrário, ocupa seu espaço harmoniosamente em relação ao entorno com tranquilidade e um considerável grau de discrição.

© Georges Fessy

Um espaço desafiador

DI-VA ocupa um terreno de 200m² que havia sido abandonado há alguns anos. Ao sul há uma densa e homogênea área que foi construída no século XIX e ao norte há um grupo de edifícios, diversos em alturas e tamanhos, que expressam um espírito mais “moderno”. A rua (Rue Henri Gorjus) é caracteristicamente diferente das demais, mas possui dois estilos basicamente, sendo que a DI-VA marca a separação entre eles. Do lado oeste, os edifícios são alinhados e tradicionais; no lado norte, justapondo a DI-VA, há uma casa isolada dos anos 1970, afastada da rua e cercada por árvores, marcando o começo de um trecho que é mais aberto e menos construído.

Apesar de suas dimensões reduzidas, DI-VA faz o papel de mediadora entre dois períodos e duas visões de urbanismo. Está de certa forma vinculada a um edifício que termina com a sequência clássica de construções alinhadas com empenas cegas, enquanto a fachada principal, do outro lado, abre-se para a parte contrastante da rua. Esta assimetria é acentuada pelo tratamento sutil da entrada principal. Há um espaço entre a porta de aço e o corpo principal da casa, separando domínios público e privado, o que aumenta o efeito criado por esse edifício descentrado.

© Georges Fessy

Ajustando-se

DI-VA é um volume simples, com quatro idênticos pavimentos de 60m² cada. A empena sul está anexada à residência vizinha. A fachada voltada para a rua quase não possui aberturas; é silenciosa e abstrata, ainda que possua uma faixa de vidro vertical por trás de um brise de madeira que permite a entrada de luz na caixa de escada e sugere uma vida interna sem realmente divulgá-la. Há também aberturas horizontais que trazem luz e ventilação para o pavimento térreo, mas que são invisíveis do exterior.

A fachada norte é a mais exposta, sendo perceptível da rua. Os espaços de uso comum possuem dois pilares verticais criando janelas panorâmicas que aumentam a visibilidade, incluindo a visão dos cedros da vizinhança.

© Georges Fessy

A fachada oeste, que não pode ser vista da rua, abre-se para o jardim, o qual é delimitado por um plano esteticamente coordenado. É visto dos dormitórios e de outros espaços privados. A fachada oeste, em suma, coloca-se em contraste com a fachada leste. A primeira é transparente, a outra é opaca.

© Tectoniques

Deliberação lenta, construção rápida

Campeões em pré-fabricação e construção seca, os arquitetos propuseram que se usasse madeira por toda a casa. Além das vantagens ecológicas, isso significava que o processo de construção seria rápido e bem adaptado ao contexto restrito da operação. Os painéis de madeira laminada foram utilizados para paredes, divisórias e pisos. É um material cujas propriedades são semelhantes às do concreto armado, exceto que sua construção é puramente mecânica, de modo “seco”. Os diferentes elementos foram produzidos por uma firma austríaca, Binderholz, na forma de macro-componentes, em pinho, que é de cor clara e homogênea, com uma grana discreta e poucos nós. Os macro-componentes foram entregues prontos para a montagem pela empresa Arbosphère, que é especialista nesta técnica. É importante destacar que o processo de montagem leva apenas cinco dias, ou seja, muito menos do que a fase de projeto.

A fim de minimizar o consumo energético, ainda melhorando o conforto, o projeto inclui isolamento externo para paredes e cobertura, usando painéis Trespa Météon de 160mm. A estrutura externa foi feita em lariço e os pisos em cinzas. Em suma, todos os componentes são feitos de madeira ou materiais vindos da madeira.

© Georges Fessy

Habitat

A casa é proposta para um casal com três filhos, mas que poderia ser adaptada para outras possibilidades. Os espaços de convívios são deliberadamente simples e compactos, organizados ao redor de um núcleo central que concentra as redes de serviço e áreas molhadas (banheiros, lavatórios, cozinha). A sala de estar e a cozinha são no nível térreo que se abrem para o jardim através de um terraço. A sala comum é no primeiro pavimento. O segundo pavimento é voltado para o casal, com dormitório, escritório e banheiro. No terceiro pavimento há três dormitórios para os filhos e um banheiro. Há ainda um terraço solar.

A compartimentação da casa em termos de diferentes níveis é contrabalanceada pela permeabilidade da caixa de escada, cujos tirantes delicados fazem os pisos parecem flutuar no ar sem interromper a continuidade vertical entre os quatro pavimentos ou mesmo a transparência horizontal entre a rua e o jardim. Além disso, o fechamento de vidro do fogão a lenha no primeiro pavimento, instalado sem nenhuma estrutura ou suporte, enfatiza ainda mais essa continuidade.

DI-VA incorpora diferentes sistemas bioclimáticos. Há a ventilação natural que faz o uso das três fachadas possíveis da edificação. O alto grau de isolação e sistemática proteção solar garante o conforto térmico, notável no verão. Há ainda um aquecedor que usa a troca de calor com o solo, apoiado pelo forno a lenha.

© Georges Fessy

Escura por fora, clara por dentro

A parte externa da casa é escura, porém a interna é clara. Seu revestimento liso e tensionado cobre um interior suave e natural. Essa é uma formulação arquitetônica arquetípica: por fora protetora, por dentro acolhedora.

O estilo é consistente. Todo o interior, incluindo tetos e partições, é composto por painéis de madeira de pinho laminada. Não há pintura nem verniz. Por fora, painéis pretos com aparência de resina sintética reveste todo o volume, enquanto preserva a leveza, como uma capa. Esse contraste é explicado pela escolha construtiva de uma estrutura interna, vestida e isolada do exterior. É o resultado de uma aspiração estética, onde yin e yang criam efeitos gráficos em uma articulação entre dois mundos. Quando a luz do dia está mais fraca, o exterior se mistura com a escuridão e estimula a tonalidade clara da madeira que se emana do interior. Um enriquece o outro, suavizando e contrastando. Assim, o uso de um único material, sem efeitos decorativos ou excessos, dá lugar de destaque para a arquitetura como tal.

© Georges Fessy

Ficha técnica:

  • Arquitetos:Tectoniques
  • Ano:
  • Área construída: 220 m²
  • Tipo de projeto: Habitacional
  • Status:Construído
  • Materialidade: Madeira
  • Estrutura: Madeira
  • Localização: Lyon, França
  • Implantação no terreno: Adossado à 1 divisa

Informação Complementar:

  1. Vedação, base em concreto: Alfred Carayol
  2. Estrutura em madeira: Arbosphère
  3. Fotógrafos: Georges Fessy, Agence Tectoniques

Sobre este escritório
Cita: Fernanda Britto. "Black Box / Tectoniques" 20 Jan 2012. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/01-21321/black-box-tectoniques> ISSN 0719-8906

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