O ponto de encontro cultural entre donos da casa e arquitectos situou-se no interesse por uma arquitectura inequivocamente contemporânea, mas, cuja natureza e expressão final, resultasse de uma investigação dos paradigmas da arquitectura tradicional do Alentejo.
O terreno de implantação desta pequena casa situado na aldeia do Possanco, faz a transição entre a nova faixa urbana e a zona agrícola protegida. Uma extensa planície em direcção a norte é rematada ao longe pela esplêndida serra da Arrábida. Manchas pontuais de água dos braços do Sado, juntamente com o oceano que define o horizonte, completam este cenário de forte expressão pictórica.
Pretendiam os donos uma casa de férias, pequena e que permitisse uma vivência informal e descontraída nos seus ocasionais fins-de-semana de fuga ao stress urbano.Povoaram-nos a mente imagens da arquitetura dita popular, produzida antes da generalização das novas tecnologias. São pequenas casas com telhados por vezes assimétricos, com uma das duas águas mais longa, quase desproporcionada, o que reforça a sua aparência maciça de volumes muito comprometidos com o terreno em que se implantam. Esses longos telhados geram casas acolhedoras durante os Verões intensamente quentes, contudo, sombrias no inverno.
A presença dessas casas na planície alentejana constitui quadros de uma beleza surpreendente, reforçada pelo branco da cal que sublinha a sua aparência quase abstracta.O primeiro constrangimento relevante é a própria forma triangular do pequeno lote que, ao aplicar-se os afastamentos regulamentares, quase não permite alternativas formais.
A concepção da casa enfrentaria ainda um paradoxo: as vistas panorâmicas mais interessantes estão a norte, e não a sul, para onde se deveria orientar as janelas em “busca“ da luz. E a sul existe a rua, os carros e o transeunte cujo olhar sobre o mundo interior da casa aos donos interessava evitar. Estes dois aspectos acabariam por ser temas “chave“ do projecto e a solução estaria na introdução de outro paradigma da arquitectura tradicional: o pátio.
O volume é determinado em planta pelos afastamentos regulamentares. Em corte, a altura máxima na cércea é atingida no alçado posterior (2 pisos), tendo a casa no alçado que confina com a rua a altura mínima possível (1 piso). O resultado, para quem caminha ao longo da rua, é de uma casa de perspectiva deformada, em axonometria.
Como forma de captar luz a sul, introduzem-se nesse longo plano 4 pátios: o pátio central, o da sala; o da IS social e o do quarto das crianças. As janelas, quase todas situadas a Norte, orientam as vistas para belíssima paisagem.
Explorou-se a expressão do sólido branco e do seu carácter abstracto. A totalidade do volume será branco, cobertura incluída, onde os pátios se assemelham a escavações azuladas, que sublinham delicadamente a expressividade da casa. Na realidade, compõe-se quase exclusivamente com o repertório alentejano: matéria branca, luz-sombra, espessura/massa, textura.
No interior, os espaços sucedem-se entre “alusões“ ao volume de 2 águas tradicional, e variações sobre escala e profundidade que transformam em cada compartimento a atmosfera daquele mundo interior intencionalmente sóbrio. No meio da sala, a cozinha-ilha assume o papel ancestral da fogueira como elemento central da habitação, em torno do qual tudo se passa.