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Arquitetos: Lioz Arquitetura
- Área: 150 m²
- Ano: 2021
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Fotografias:Francisco Nogueira
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Fabricantes: BRUMA, Cortizo, Faro , GSI, Perfect Wood, Superbotânica
Descrição enviada pela equipe de projeto. Em Lisboa, é impossível estar desvinculado da topografia e da paisagem por esta definida. De quem desce a colina de São Vicente, a Rua Washington é resultante dos constrangimentos de uma malha urbana reticular em confronto com um acidente geográfico na chegada a Santa Apolónia. A sul, o rio, surge pontualmente como vazios na paisagem urbana densamente edificada, por quarteirões, escadarias íngremes e lotes extensos, acomodando-se suavemente a cada curva de nível. É num destes vazios, numa curva apertada, que inerte e expectante encontramos o número 46.
Construído no final dos anos 30, este edifício de habitação apresenta uma tipologia que reúne os ambientes nobres junto ao alçado frontal, orientado a norte, e os ambientes técnicos junto ao alçado tardoz, orientado a sul, distribuídos por cinco pisos. As varandas, estruturas em sistema de abobadilha de tijolo a cutelo sobre perfis metálicos, vinculadas às áreas técnicas, parecem ignorar o potencial contemplativo de um “mar” que se apresenta sem qualquer obstáculo visual, encerradas em si mesmas por marquises em alumínio, de forma a ampliar o espaço coberto da casa que, invariavelmente, seja pela salubridade ou reduzida dimensão, transformaram em espaço de arrumos.
Apesar de se enquadrar numa tipologia de edifício residencial de arrendamento, com as divisões típicas do sistema de alvenaria portante e pisos em estrutura de madeira, eram desde já evidentes gestos que pretendiam quebrar com o paradigma construtivo vigente, com a inserção do betão armado nos pisos das cozinhas e casas de banho, ou mesmo com a inesperada generosidade espacial da escada de circulação interna, que desde cedo nos interessou manter.
Neste contexto, a intervenção buscou potencializar a relação do edifício com o entorno, naquilo que o torna mais peculiar: o rio; numa estratégia simples de inversão da distribuição tipológica dos ambientes internos, atribuindo à fachada tardoz uma nova função, fulcral, na vivência do apartamento. Para isso os ambientes sociais foram integrados num espaço contínuo, conectado à nova varanda, que apresenta na projeção da antiga escada de salvação, um promontório voltado à paisagem. As instalações sanitárias ocupam o quarto interior, originando uma nova tipologia T2 com suíte. No último piso, o espaço do sótão foi incorporado ao ambiente social, com a criação de um mezanino para sala de estar, quarto e casa de banho.
A manutenção dos vãos da fachada frontal, da estrutura da escada principal, de grande parte das alvenarias internas e da tipologia das portas (ainda que redesenhadas), contrapõe com os novos elementos que, ainda que discretos, se apresentam de forma singular, soltos das alvenarias, tais como a escada de acesso ao mezanino, a ilha das cozinha, as superfícies em painéis pivotantes, entre outros. A pedra e a madeira, na sua forma mais crua, foram os materiais elencados para esta intervenção, em comunhão com a cor dourada dos elementos metálicos, como símbolo da conexão do edifício com a paisagem ensolarada.
Para a fachada tardoz, alvo de maior intervenção, foram propostos novos caixilhos pivotantes, tão leves quanto possível, ampliando a relação entre o espaço interior e exterior. Na lateral, a empena aguarda, expectante, um novo edifício que com um gesto de extrema delicadeza possa fechar a longa frente edificada, demarcando aquele enquadramento, aquele promontório natural, que só quem desce a Rua Washington é capaz de contemplar.