Descrição enviada pela equipe de projeto. Desde o início do processo projetual e expográfico da 35ª Bienal de São Paulo, Coreografias do Impossível, fomos provocados a pensar sobre e através do Pavilhão Ciccillo Matarazzo. Projetado e construído ao longo da década de 50, o edifício é notoriamente conhecido como uma obra de Oscar Niemeyer; no entanto, é preciso dizer, em coautoria com os arquitetos Eduardo Kneese de Mello, Hélio Uchoa e Zenon Lotufo. A arquitetura do Pavilhão, marcada pelo peso simbólico e representativo de uma época, nos desafiou a inscrever temporariamente uma coreografia de percursos e espaços outra, com o propósito de cindir, ou ao menos fissurar, o seu caráter monumental.
O caminho que nos interessava era o de borrar os limites definidos por tempos históricos e gestos autorais. Para isso precisamos aprender a dançar com o existente; sem reencená-lo, mas também sem sobrepor a ele uma coreografia totalmente autônoma. Deveria ser uma postura projetual que compactuasse e colapsasse com as referências simbólicas e os repertórios estéticos, uma reflexão muito instigada pela leitura do texto curatorial. Decidimos, então, convidar o edifício para uma contradança.
No interior do Pavilhão, dois desenhos serpenteados rompem o rigor métrico dos extensos planos ortogonais (250 x 50m) modulados por uma malha de pilares: o mezanino e o vão central. Ambos representam os momentos em que o traço autoral se faz mais presente, e foi na releitura de suas matrizes geométricas que essa proposta se desenvolveu.
Após muitas investigações de manipulação e deformação dos desenhos serpenteados chegamos à conformação do que denominamos de Corpo: as construções temporárias que organizam a exposição nos seus dois últimos pavimentos. O Corpo é resultado do escalonamento do vão central em duas vezes e meia, somado ao desenho do mezanino em escala 1:1. Podemos dizer que esse é um desenho que se criou a partir de, e, portanto, não é novo, nem existente.
Apesar da aparição repetida em dois pavimentos, o Corpo configura duas experiências espaciais completamente distintas, onde a relação entre cheios (salas fechadas) e “vazios” (recintos abertos onde trabalhos convivem) se invertem. Esse contraste sugere um movimento de contração e dilatação do Corpo, ou ainda, de inspiração e expiração.
Em um dos pavimentos o Corpo de salas encontra-se em meio à planta, fagocitando o vão central. Essa ação faz com que em um dado momento o vazio entre as lajes do vão apareça envelopado em toda a sua altura, alterando a percepção desse espaço emblemático desde a chegada no primeiro pavimento. A materialidade branca e lisa faz com que essa ação se amalgame ao edifício, causando eventual estranhamento e confundindo a memória entre o que é original e o que é temporário. O mesmo pode vir a acontecer no térreo, onde o espaço livre sob o mezanino foi ocupado por um volume, também branco e amalgamado, que concentra as áreas de serviço.
O projeto se propõe não somente a dançar com o existente, mas também com o disponível, pois 73% dos painéis retos empregados são remanescentes de antigas exposições, chegando a ter até 30 anos de idade. Todo o projeto foi pensado a partir do melhor reaproveitamento do material que veio a definir, inclusive, as alturas desse Corpo.
Durante todo o processo o projeto se ateve também a um arranjo de sequência de movimentos que encadeiam ritmos, alteram velocidades (aceleram, atrasam, pausam) e articulam escalas distintas para além da escala monumental do Pavilhão. A fim de subverter a lógica sequencial e hierárquica do percurso usual (onde os corpos sucessivamente ascendem, batem e voltam os 250 metros de extensão), propusemos uma inversão entre 2º e 3º pavimentos.