Como inserir o Centro Administrativo no mais simbólico dos eixos de Belo Horizonte? É possível elogiar o vazio urbano da avenida Afonso Pena por meio de sua ocupação – e não de sua preservação? Pode este ponto de convergência de modais – estação de metrô, terminais de BRT, terminal de ônibus urbano, ciclovias – se transformar na solução de todas as desarticulações, congestões e falhas do Centro? Esta proposta assume uma postura que explora essa contradição: a hiperdensidade de um edifício de 100.000 m2 como elogio de um vazio urbano e como um meio de reestruturar um tecido urbano esgarçado.
Formalmente, o CABH divide-se em dois, como que partido pelo eixo da Afonso Pena e como que ocupando e liberando este eixo simultaneamente. O edifício parte de uma linguagem geométrica que explora linhas reversas: em resposta ao eixo, abre-se uma fenda diagonal entre as duas partes, como é diagonal a linguagem abstrata tão recorrente nas esculturas neo-concretas de artistas como Amilcar de Castro e Franz Weissman que permeiam a cidade.
Nessa leitura de um contexto situado entre a arte pública e o desenho urbano, não menos importante é a escultura “Liberdade em Equilíbrio” (1982) da também neo-concreta Mary Vieira. Enquadrando a avenida, esta obra é um elemento que materializa o vazio do eixo e insinua a importância da Serra do Curral na cidade, sendo ambas – a serra e a escultura – referências fundamentais na concepção do edifício. Sua linguagem diagonal é resultado do deslocamento de quatro vértices do volume principal. É este deslocamento que delineia um vão triangular entre os dois edifícios, remetendo a iconografia do CABH à uma outra escultura no eixo da Afonso Pena (“Monumento à Paz”, a escultura vertical na Praça do Papa), à plasticidade dos eixos a 45o dos quarteirões da cidade, ao plano urbano original do século XIX, ao triângulo emblemático da bandeira do Estado.
Praça Coberta: um Campo Ativo
O CABH paira sobre um grande rotor de pedestres. O edifício está construído sobre um pilotis de nove metros de altura, o que permitirá o uso do solo como uma grande Praça Coberta inteiramente aberta ao público e à cidade. A Praça Coberta é uma espécie de distribuidor de movimentos: um campo ativo que organiza e catalisa atividades fixas ou transitórias, possibilitando diferentes arranjos e assumindo diversos aspectos de acordo com as circunstâncias. Seu desenho é exatamente o mesmo do piso original da Praça Rio Branco. Como maneira de recuperar a importância da escultura “Liberdade em Equilíbrio” para a cidade, seu pavimento original foi incorporado nessa proposta e estendido a toda a Praça do CABH.
Passarelas
A Rodoviária atual situa-se num rotor de modais desarticulados que urge ser costurado. O que antes era uma várzea do rio Arrudas separando o Centro dos bairros transformou-se num mar de viadutos, num complexo de vias expressas bem típico do urbanismo rodoviarista que infelizmente moldou as cidades brasileiras nas últimas décadas. Nossa proposta vai contra esse urbanismo e privilegia o transporte público, as áreas verdes, o uso dos baixios de viadutos, a reativação das praças e, principalmente, o resgate do simbolismo como potenciais requalificadores da cidade.
Ao norte, o bairro da Lagoinha precisa de uma requalificação da conexão de pedestres com o Centro. A passarela proposta aproveita o vetor da passarela existente para então remodelá-la e transformá-la num jardim elevado. Esse paisagismo revisita os padrões burle-marxistas da Rodoviária e funciona como um segregador de modais, afastando a faixa de pedestres da ciclovia. A outra passarela proposta – entre a Praça Rio Branco e a Praça do CABH – permitirá uma circulação mais fluida de pedestres entre estas duas Praças e segregará o corredor de BRT da Praça do CABH.
Escala
Apesar de sua grande área construída, o CABH busca a mesma escala de seus vizinhos. Ele será o prédio mais alto da cidade, mas ao mesmo tempo seu gabarito e sua transparência buscam mitigar seu impacto na paisagem urbana, afirmando-se mais por sua geometria que por seu volume. Do ponto de vista da Lagoinha, o CABH será visto de todos os ângulos e prenunciará, por meio das linhas cruzadas de suas fachadas, um novo portal para Belo Horizonte. Visto da Rodoviária, fica clara a intenção de repetir os mesmos materiais (concreto e vidro) como maneira de criar semelhanças de texturas, padrões e transparências em respeito àquele prédio dos anos 1960. E visto da Afonso Pena, o projeto anuncia o fim de um eixo sem bloqueá-lo, assentando-se como um portal que recupera a atualiza o urbanismo neoclássico que inaugurou a cidade em 1897.
Estrutura
A estrutura de ambos os prédios é formada por dois elementos básicos: dois núcleos que correspondem às circulações verticais, e pilares em malha de 10x10m (compatível com a disposição das vagas de garagem) uniformemente distribuídos nas áreas úteis. Estes núcleos das circulações verticais (escadas, elevadores, serviços) trabalham no equilíbrio das forças horizontais, enquanto a malha de pilares trabalha com as forças verticais.