Por Ana Elísia da Costa
A casa ocupa um lote de meio de quadra, estreito e comprido. A partir do recuo frontal, são dispostos três volumes: na parte frontal do lote, um pequeno bloco sobre pilotis, que abriga a garagem e as dependências de empregada; ao centro, um grande prisma retangular, com pequenos recuos laterais, que organiza o corpo principal da casa; e, na parte posterior do lote, uma edícula, que absorve a irregularidade geométrica do terreno e acomoda dependências de hóspedes e salão de festas. A volumetria resultante do conjunto é pura e ganha expressão através da contraposição entre a horizontalidade do prisma principal e a verticalidade do volume sobre pilotis.
O prisma principal é rasgado por um grande pátio central, que, como centro compositivo, organiza o zoneamento da casa em três de seus lados – setor de serviço na ala lateral direita, com acesso independente pela garagem; acesso e circulação principal na ala lateral esquerda; ala do setor íntimo na parte posterior do lote, garantindo privacidade aos quartos e orientação solar favorável (noroeste). A ocupação periférica do volume a partir do vazio central, como é clássico neste esquema tipológico, é transgredida com a disposição da ala do setor social, que de modo inusitado “invade” o grande pátio.
A operação é regida por parâmetros de proporção, que garantem a equivalência métrica das duas alas laterais e que regulam as dimensões do pátio central, com cinco módulos transversais e três longitudinais. Definida a geometria das alas, a fluidez espacial das alas social e íntima é perseguida. Em contraposição, os elementos de composição irregulares, como cozinha, banheiros e acesso à adega no pavimento inferior, se concentram nas alas laterais.
O pátio central, subdividido em dois, é coberto por brises ortogonais, configurando jardins de inverno. Estes brises se relacionam metricamente com paredes de elementos vazados que separam transversalmente os jardins das circulações de serviço e íntima, definindo um envoltório reticulado. Os brises também são desenhados como extensão do plano de forro da sala, ao centro dos dois jardins, cujas portas de vidro se apoiam em vigas invertidas, determinando a continuidade visual entre sala e jardins. A espacialidade resultante é única, ficando indefinidos os limites entre o interior e o exterior.
A articulação com os espaços abertos ou semiabertos também é observada nas alas íntima e de serviços. O pátio de serviço, na porção frontal do lote, se funde à garagem e é definido por uma parede de elementos vazados que sugere visualmente ser um outro volume. O pátio íntimo é definido pela disposição da ala íntima e do volume do salão de festas, assumindo uma configuração retangular. Este pátio é uma extensão dos quartos, cujas portas–janelas se abrem para uma pequena varanda, configurada como subtração no volume da ala, que faz a função de espaço de transição entre o interior e o exterior.
As interações física e visual dos ambientes com os jardins e pátios, juntamente com a fluidez da planta, multiplicam as visuais e estabelecem diversos pontos focais de interesse. A casa é um artifício dinâmico, construído para abrigar uma vida privada isolada da rua e ligada a “espaços exteriores artificializados” que são inseridos no lote e no próprio interior da casa.
Referência
Ana Elísia Costa, O Gosto pelo Sutil. Confluência entre as Casas-Pátio de Daniele Calabi e Rino Levi, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Tese de Doutorado em Arquitetura), Porto Alegre, 2011.
Ana Elísia da Costa é professora e pesquisadora da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
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- Ano: 1958