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Arquitetos: Collectif Saga, Indalo
- Área: 138 m²
- Ano: 2015
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Fotografias:Joubert Loots, Maguelonne Gorioux
Descrição enviada pela equipe de projeto. Este projeto está localizado em Joe Slovo, aos arredores de Port Elizabeth, África do Sul. Joe Slovo é um município recém-criado e apenas parte dele foi beneficiada com o programa de habitação RDP (Programa de Reconstrução e Desenvolvimento, ação lançada pelo Governo Sul-Africano 20 anos atrás). O local onde o projeto está inserido não tem instalações básicas e não há estradas asfaltadas. As construções são principalmente barracos feitos de madeira de segunda linha e chapas de metal corrugado. Não há água, exceto uma torneira a cada dois blocos, e apenas algumas casas têm eletricidade. Alguns anos atrás, notando a falta de serviços dedicados à sua comunidade, uma cidadã local, Patricia N. Piyani fundou uma creche em seu próprio barraco. O estabelecimento rapidamente encheu-se de interessados e ela decidiu construir um edifício dedicado à essa função.
A creche existente é pequena em comparação com o número de crianças que hospeda (entre 50 e 80 por dia). Ela também está em uma condição muito ruim, especialmente em termos de impermeabilização. Na verdade, o local é continuamente inundado mesmo com chuvas leves. Considerando isso, Love Story, uma ONG local, envolvida nesta comunidade em particular por um tempo, decidiu lançar um projeto para reconstruir a creche, mas também para adicionar novas instalações, tais como um centro técnico, um centro comunitário e uma horta urbana. O projeto pretende integrar plenamente a comunidade no processo, a ideia é certificar-se que as melhorias são sustentáveis e continuar a trazer uma nova dinâmica em toda a comunidade.
A nova creche foi projetada e construída pelo escritório de arquitetura Collectif Saga, em parceria com Indalo e Love Story. Com, em média, o mesmo orçamento de uma casa de RDP (casas construídas pelo governo) o projeto tenta mostrar que através da construção de uma forma diferente, pode designar melhores usos nos espaços, tornando-os maiores e mais flexíveis. Assim, uma casa RDP tem em média 36m2, enquanto o edifício possui 138m2. Isso foi possível, usando principalmente materiais reciclados que foram gratuitos ou de baixo custo e através do estabelecimento de técnicas de construção eficientes.
O segundo objetivo do projeto era tentar desenvolver processos simples e reproduzíveis, o que daria a comunidade as ferramentas e o conhecimento para replicar estes processos para o seu próprio desenvolvimento. Decidimos usar materiais similares ao que eles usam para construção (paletes, chapas de papelão ondulado, pneus etc.). Os materiais foram, em seguida, transformados em um edifício duradouro e sólido com um bom nível arquitetônico. Nós também integramos vários membros da comunidade durante todo o processo, a fim de compartilhar continuamente este conhecimento. Foi uma troca de conhecimentos de duas vias no sentido de que tínhamos muito a aprender com a comunidade que todos os dias constrói e reconstrói usando recursos limitados de seu próprio ambiente. Era importante para nós mostrar que também é possível se divertir com estes materiais baratos e que, como arquitetos, temos que encontrar os meios e as ferramentas para transformar aqueles em objetos únicos e funcionais.
O projeto consiste em dois edifícios um de frente para o outro: de um lado, a construção de serviços básicos com oito banheiros e duas pias e, no outro lado, o salão principal. A construção já existente foi conectada ao edifício principal, abrigando uma cozinha e uma sala de armazenamento. Para entender completamente o projeto, é preciso considerar que trata-se de uma creche temporária, para abrigar as crianças enquanto a edificação principal é construída no terreno oposto. O espaço se tornará um workshop dedicado à madeira e trabalhos em metal. A ideia é oferecer um espaço para os muitos pequenos empresários locais que desejam lançar o seu negócio. Eles, então, seriam capazes de compartilhar suas ferramentas e conhecimento, mas também teriam um espaço próprio para trabalhar, com excepção das suas casas. Dito isto, o edifício foi concebido como um salão que pode hospedar vários usos ao longo do tempo. Por enquanto, paredes divisórias podem ser utilizadas a fim de separar as três classes da pré-escola.
Finalmente, tentamos usar nossas habilidades para colocar em movimento e as latentes energias que nos rodeiam. Para envolver as pessoas, o local da construção foi utilizado como um palco experimental de mistura cultural. Essa postura mental, mudou o nosso papel e comportamento como arquitetos, nos movendo em uma nova experiência humana, e novamente redefinindo a nossa visão de arquitetura. Nós tentamos envolver as pessoas tanto quanto podíamos, das empresas aos trabalhadores, incluindo crianças e suas mães, em uma sociedade onde o trabalho feminino é claramente definido. A partir de um envolvimento conjunto no projeto, percebemos como, simplesmente oferecendo a possibilidade de participar neste projeto de desenvolvimento social, as pessoas estavam felizes em se sentirem úteis. De fato, em um país traumatizado como África do Sul, o fatalismo, a desconfiança e falta de compreensão são comuns.
Nós também organizamos e participamos de alguns eventos diferentes no município e no centro da cidade para acabar com os preconceitos através da partilha de um grande momento juntos. O projeto tornou-se, em seguida, muito maior do que poderíamos ter imaginado, com a creche materializando o processo humano e social. Graças à todas as pessoas, graças à todos aqueles momentos que passamos juntos no local, graças à toda a paixão ocorrendo no local da construção, a apropriação não demorou a aparecer, muito antes da abertura oficial. Mesmo em um projeto tão pequeno quanto esse, a arquitetura tornou-se a vida, e a vida tornou-se arquitetura. Isso é o que experimentamos, é isso o que queremos mostrar agora, isso é o que queremos fazer amanhã.