O ponto de inflexão crucial na carreira do falecido Frei Otto - agraciado com o Prêmio Pritzker no ano de 2015 - veio quase cinquenta anos atrás, na Expo 67 em Montreal, Quebec. Em colaboração com o arquiteto Rolf Gutbrod, Otto foi o responsável pelo pavilhão de exposições da Alemanha, uma estrutura de cobertura tensionada que levou seus experimentos de arquitetura leve para o palco internacional pela primeira vez. Juntamente com a Biosfera de Fuller e o projeto Habitat 67, de Moshe Safdie, o pavilhão alemão fazia parte da demonstração da arquitetura moderna da Expo, do potencial da tecnologia, pré-fabricação e produção em massa para gerar uma nova direção humanitária para a arquitetura. Esta coleção notável na Expo foi tanto o auge do otimismo moderno, como sua queda trágica; o mundo nunca havia visto uma exposição tão singularmente esperançosa de arquitetura inovadora.
A origem da fascinação de Otto com as estruturas tensionadas e uso mínimo e intensivo de recursos data de sua experiência durante a Segunda Guerra Mundial. Convocado pelo Luftwaffe como piloto, Otto foi capturado e preso em um campo de prisioneiros perto de Chartres, na França, onde trabalhou construindo abrigos tipo tendas para outros prisioneiros, utilizando-se dos limitados materiais à sua disposição. [1] Após o fim da guerra, ele traduziu esses esforços em uma busca de arquitetura em tempo integral, investigando sua potencial aplicação em escala industrial. Suas premissas de projeto radicalmente simples, baseadas em uma arquitetura orientada pela conservação de recursos, a inteligência estrutural e a eficiência construtiva, encontraram uma recepção calorosa na cultura intelectual otimista dos anos 1950 e 1960. Como as esferas geodésicas contemporâneas de Fuller, Otto acreditava que suas coberturas tensionadas configuravam-se como uma solução arquitetônica que era barata, durável e altamente versátil. [2]
Sensível às necessidades em constante mudança dos ocupantes e o impacto da pegada humana, Otto também pregou a necessidade de estruturas temporárias fáceis de montar, como também simples de desmontar e reciclar. Com poucos componentes, todos os quais poderiam adaptar-se a praticamente qualquer condição de entorno e terreno, seus sistemas de mastros e coberturas eram uma simplificação radical dos métodos construtivos tradicionais que valorizavam rigidez e permanência. Uma vez que havia sido projetado e pré-fabricado, o pavilhão alemão em Montreal foi montado no local em apenas seis semanas, sendo desmontado logo após a feira. [3]
Assista a um vídeo do Pavilhão da Alemanha em construção.
A complexidade topográfica do pavilhão - uma envolvente paisagem de curvas hiperbólicas - capturaram a beleza intrínseca das relações matemáticas e físicas naturais. Gerado simplesmente pela conexão entre os pontos suspensos e ancorados, a forma refletia o estado de tensão entre as forças em uma membrana com a mínima interferência artificial. Um repórter na Expo comparou o efeito à simplicidade de "uma folha branca apertada sobre os suportes de uma tenda." [4] Dentro deste gesto caprichoso, os cálculos de um mestre engenheiro eram, no entanto, bastante óbvios.
A cobertura em si foi construída de uma malha de cabos de aço pré-tensionados cobertos com uma membrana translúcida de poliéster têxtil. Em vários pontos no interior do perímetro do pavilhão, a superfície da tenda cai para o chão em cavidades em formas afuniladas dramáticas, apenas para subir novamente à altura dos apoios. O sistema de Otto era tecnologicamente sofisticado e conceitualmente simples, cuidadosamente calculado mas animado pela irregularidade e liberdade de composição de expressão irrestrita. O pavilhão era pouco mais do que uma grande tenda - a estrutura mais primitiva - mas tinha uma beleza pura em seus movimentos que o homem, apesar de todas as suas máquinas e invenções, havia raramente conseguido alcançar.
Em meio à saturação atual de formas produzidas digitalmente muito mais ultrajantes do que o pavilhão alemão, e com, consequentemente, estruturas muito mais complexas, talvez seja difícil apreciar as fronteiras formais que foram abertas pela obra de Otto ou os feitos de engenharia que ele alcançou em Montreal em uma época antes dos computadores. Mas deter-se na estrutura ou nas facetas formais de seu trabalho é ignorar o sentimento muito mais importante que alimentou a aventureira busca formal de Otto. Suas intenções nunca foram construir uma estrutura para a valorização de arquitetos e estetas; foram construídas para o benefício da humanidade. [5] Como Thom Mayne observou recentemente em uma homenagem ao falecido arquiteto, este humanitarismo tecnológico só vai "tornar-se cada vez mais relevante à medida que entramos nesta era digital." [6]
[1] Pogrebin, Robin. “Pritzker Prize for Frei Otto, German Architect, Is Announced After His Death.” New York Times (Online), 10 Mar. 2015. Acessado em 16 Mar. 2015 em http://www.nytimes.com/2015/03/11/arts/design/frei-otto-german-architect-wins-pritzker-prize-posthumously.html?_r=0.
[2] Langdon, David. “Montreal Biosphere / Buckminster Fuller.” ArchDaily, 25 Nov. 2014. Disponível em http://www.archdaily.com/572135/ad-classics-montreal-biosphere-buckminster-fuller/.
[3] Mark, Laura. "Six projects by Pritzker winner Frei Otto." The Architects Journal, 11 Mar. 2015. Disponível em http://www.architectsjournal.co.uk/news/six-projects-by-pritzker-winner-frei-otto/8679835.article.
[4] Keeping, John H. “Montreal’s EXPO 67 Is Going To Be A ‘Fun Fair.’” The Palm Beach Post, 19 Fev. 1967, p. 2.
[5] See, e.g., Del Barco, Mandalit. "From Stadiums to Shelters: Remembering Pritzker Winner Frei Otto." NPR.org, 11 Mar. 2015. Acessado em 16 Mar. 2015 em http://www.npr.org/2015/03/11/392375481/from-stadiums-to-shelters-remembering-pritzker-winner-frei-otto.
[6] Mayne, Thom. “Tributes to Frei Otto” The Pritzker Architecture Prize. Acessado em 16 Mar. 2015 em http://www.pritzkerprize.com/2015/tributes-frei-otto.