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Arquitetos: Paulo Merlini; Paulo Merlini
- Área: 80 m²
- Ano: 2016
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Fotografias:Fernando Guerra | FG+SG
Descrição enviada pela equipe de projeto. Os objetos são cristalizações formais de ideias, e por norma o objeto será tanto mais pertinente para a sociedade quanto melhores e mais bem interconectadas as ideias que o compõe. Mas acontece que por vezes a sua funcionalidade é de tal forma pertinente que o seu valor estético cai no esquecimento. Pois nós aqui no gabinete gostamos muito de boas ideias e gostamos de as valorizar. Gostamos de recuperar estas “cinderelas” do design e traze-las de novo à ribalta para que possam ser apreciadas e valorizadas não só pelo seu potencial funcional mas também pelo seu potencial estético.
Sendo esta a primeira loja de roupa que desenhamos, exploramos potenciais objetos que nos ajudassem na construção de um ambiente apelativo e envolvente, e encontramos. A cruzeta.
Inundamos o espaço com mais de mil cruzetas que pelo seu sentido estético intrínseco, atribuem uma aura especial ao espaço envolvendo o utilizador num ambiente único.
Ainda que possuam um equilíbrio proporcional que lhes atribui uma estética muito própria e cumpram uma função primordial nas lojas de roupa, são quase sempre renegadas para segundo plano. A sua pertinência funcional é de tal ordem que por compensação, ou descompensação renegamos quase automaticamente o seu potencial estético. A mesma característica que a tornou num sucesso global fê-la cair na banalidade, tornando-se numa vítima do seu próprio sucesso.
Para conseguir uma sensação de espaço envolvente distribuímos as cruzetas por pontos de apoio equidistantes localizados no teto. Quando visto em planta a distribuição confunde-se com uma tela pixelizada com mais de 400 pontos distribuídos por 80.00m2 de área. Apercebemo-nos que trabalhando com as altimetrias dos fios poderíamos recriar o negativo de qualquer espaço, qualquer forma. Interessava-nos um espaço que pela sua relevância cultural se tornasse imediatamente reconhecível e que acima de tudo ajudasse na valorização do nosso elemento base, bastava descobrir qual.
Estudamos várias formas e revisitamos várias interpretações espaciais ao longo da história e concluimos que o vazio criado pela forma das naves de uma catedral seria o mais indicado para a nossa intervenção.
Desenhada e aprimorada ao longo de séculos como espaço de adoração teve na sua essência criativa, independentemente dos movimentos ou estilos, a intenção de dignificar e valorizar, e tornou-se de tal forma reconhecível por todos que sem qualquer explicação relativa ao espaço o utente é automaticamente “atirado” para essa aura de contemplação.
Assim, ao entrar na loja o usuário sente-se envolvido pela silhueta das naves, a tensão nos fios evidencia o peso gravítico da roupa e verticaliza o espaço, direcionando o olhar para o eixo cartesiano que se tornou por defeito o da adoração. As roupas flutuam no espaço, são os elementos que atribuem consistência à intervenção. São as fundações da catedral, os elementos que prendem a intervenção ao chão.
Se o espaço vazio é definido pelo arquétipo das naves de um catedral, o cheio é preenchido por luz. Uma série de focos equidistantes projetam a luz em direção ao céu acentuando ainda mais a verticalidade e marcando o ritmo do espaço. A luz reflete na cor branca dos fios atribuindo uma certa materialidade a este material etéreo.
Os tons do espaço foram escolhidos numa patine desaturada para deixar sobresair a cor das roupas, tornando-as no interveniente principal.
Uma outra mais valia do espaço é a de permitir a colocação de roupa em qualquer local.No caso dos clientes querem evidenciar uma qualquer peça especifica poderão expo-la numa cruzeta que crie destaque relativamente ao espaço.