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Arquitetos: Herzog & de Meuron
- Ano: 2016
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Fotografias:Iwan Baan, Maxim Schulz
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Fabricantes: Basaltite, Buchele, Edgetech, Emco, FLASHAAR, FSB Franz Schneider Brakel, Guardian Glass, Hasenkopf, Kaldewei, Kampmann, Linvisibile, Meiser, Neuform-Türenwerk Hans Glock GmbH, Octatube, Rosconi AG, Schüring Ziegelwerke, Sika, Velabran, Waagner-Biro Stahlbau AG, Ziegelei Hebrok, +1
Entre o eixo hanseático e HafenCity
O projeto em Kaispeicher marca um lugar que a maioria das pessoas em Hamburgo conhece mas nunca realmente visitou. Ele converteu-se em um novo centro de vida social, cultural e cotidiana para os habitantes da cidade e para os visitantes de todo o mundo.
É muito comum que um novo centro cultural seja imediatamente associado ao atendimento de uma pequena parcela privilegiada da população. Para fazer da nova Filarmônica uma atração genuinamente pública, é imprescindível proporcionar, não somente uma arquitetura atrativa mas, também, uma atrativa mistura de usos urbanos. O complexo abriga uma sala filarmônica, um salão para música de câmara, restaurantes, bares, um terraço panorâmico com vista para Hamburgo e para o porto, apartamentos, um hotel e estacionamento. Estes usos variados combinam entre si em um edifício como o fazem na própria cidade. E como uma cidade, as duas arquiteturas contraditórias e sobrepostas do Kaispeicher e da Filarmônica garante sequências espaciais empolgantes e variadas: por um lado, a sensação original e arcaica do Kaispeicher, marcada por sua relação com o porto; por outro, o suntuoso e elegante mundo da Filarmônica. No meio existe uma extensa topografia de espaços públicos e privados, todos diferentes em caráter de escala: o grande terraço do Kaispeicher, que se estende como uma nova praça pública, responde ao mundo interiormente orientado da Filarmônica, construída sobre ele.
O coração do complexo é a Filarmônica em si. Ela surgiu como um espaço que coloca em primeiro plano os ouvintes e os músicos a tal ponto que, juntos, representam a arquitetura. A tipologia arquitetônica da filarmônica sofreu uma reformulação arquitetônica que é excepcionalmente radial na sua ênfase, sem precedentes na aproximação entre artista e público, quase como um estádio de futebol.
Arquitetura urbana para os amantes da cultura
A nova filarmônica não é somente um lugar para a música; é um complexo residencial e cultural em sua máxima expressão. A sala de concertos, com capacidade para 2100 pessoas, e o salão para música de câmara, para 550 ouvintes, estão incrustados entre os pavimentos de luxo e um hotel de cinco estrelas com serviços integrados como restaurantes, um centro de saúde e academia, além de instalações para conferências. O Kaispeicher A, um monumento da época do pós-guerra que, ocasionalmente acolhia eventos paralelos, agora se transformou em um vibrante centro internacional para os amantes da música, um ímã para os turistas e visitas do mundo de negócios. A Filarmônica será convertida em um marco para a cidade de Hamburgo e para todo o país. O bairro da crescente HafenCity será revitalizado, garantindo que seja não somente um satélite da cidade hanseática, mas também um novo distrito urbano.
O Arcaico Kaispeicher
O Kaispeicher A, desenhado por Werner Kallmorgen, foi construído entre 1963 e 1966 e utilizado como armazém até final do século passado. Originalmente construído para suportar o peso de milhares de sacos de grãos de cacau, agora empresta sua sólida construção para acolher a nova Filarmônica. O potencial estrutural e a força do edifício antigo foram utilizados para suportar o peso da nova massa que descansa sobre ele.
Nosso interesse no armazém radica não somente no seu potencial estrutural não explorado, mas também na sua arquitetura. O edifício robusto proporciona uma base surpreendentemente ideal para a nova sala da filarmônica. Parece ser parte da paisagem e ainda não é totalmente parte da cidade que agora cresceu até ele. Os armazém portuários do século XIX foram desenhados para refletir o vocabulário das fachadas históricas da cidade: suas janelas, cimentos, empenas e diversos elementos decorativos se ajustam ao estilo arquitetônico da época. Visto desde o rio Elba, estavam destinados a misturar-se com o horizonte da cidade apesar de serem armazéns desativados que não possuíam nem mesmo entradas de luz e ar.
Mas não o Kaispeicher A, que é um edifício de tijolos pesados e massivos, como muitos outros armazéns no porto de Hamburgo, mas suas fachadas arcaicas são abstratas e distantes. A grelha regular do edifício, com orifícios de 50 x 75 cm que não podem ser chamados de janelas, são mais estrutura do que abertura.
O novo edifício de vidro
O novo edifício foi extrudado da forma do Kaispeicher, sendo idêntico em planta ao bloco de tijolo do edifício mais antigo sobre o qual ele sobe. Entretanto, na parte superior e inferior, a nova estrutura atinge um tom diferente da forma tranquila e plana do armazém inferior; a ondulação do telhado se eleva desde o extremo leste inferior até sua altura total de 108 metros no Kaispitze (a ponta da península). A Filarmônica é um ponto de referência visível desde longe, conferindo uma nova marcação vertical à disposição horizontal que caracteriza a cidade de Hamburgo. Há uma maior sensação de espaço nesta nova localização urbana, gerada pela extensão da água e a escala industrial dos navios.
A fachada envidraçada formada, em parte, por painéis curvos, alguns deles esculpidos com aberturas, transforma o novo edifício, pousado sobre o antigo, em um gigantesco vidro iridescente cuja aparência continua mudando ao captar os reflexos do céu, da água e da cidade.
A parte inferior da superestrutura também apresenta uma dinâmica expressiva. Ao longo das suas bordas, o céu pode ser visto desde a praça através de aberturas em forma de cúpulas, criando espetaculares vistas teatrais tanto do rio Elba como do centro de Hamburgo. Na parte interior, as profundas aberturas verticais proporcionam relações visuais sempre mutantes entre a praça e os foyers em diversos níveis.
Entrada e Praça
A entrada principal do complexo Kaispeicher está posicionada ao leste. Uma escada mecânica, excepcionalmente longa, conduz a praça, a qual descreve uma leve curva de modo que não seja possível ver sua totalidade de um extremo ao outro. É uma experiência espacial, cortando diretamente toda a Kaispeicher, passando por uma grande abertura panorâmica com uma varanda que oferece vistas ao porto antes de continuar até a praça. Esta última, posicionada acima do Kaispeicher e abaixo do novo edifício, é como uma gigantesca dobradiça entre o antigo e o novo. É um novo espaço público que oferece um panorama único. Restaurantes, bares, venda de ingressos e hall do hotel encontram-se ali, assim como o acesso aos foyers da nova filarmônica.
A Filarmônica
Qual tipo de espaço terá a filarmônica? Quais preocupações acústicas e arquitetônicas foram levadas em consideração na sua construção? Qual tradição ressoa nesta sala em comparação com outras novas localizações, por exemplo, em Tóquio e Los Angeles ou o modelo em Berlim? Rapidamente ficou claro que a Filarmônica de Hamburgo seria diferente da Filarmônica de Sharoun. Somente as premissas: a localização, o porto e o armazém existente, convidam à mudança. Este é um projeto do século XXI que seria inconcebível antes. O que se discutiu foi a ideia fundamental da Filarmônica como um espaço onde a orquestra e o maestro estão situados no meio da platéia; aqui a arquitetura e a disposição dos estrados respeitam a lógica da acústica e a percepção visual da música, artistas e público. Mas esta lógica conduz a outra conclusão. Os níveis são mais penetrantes, grades, paredes e teto formam uma unidade espacial. As pessoas, combinação entre público e músicos, determinam o espaço, constituindo-o somente por elas. Sobre isso, se assemelha a tipologia do estádio de futebol que desenvolvemos nos últimos anos, a fim de permitir uma proximidade quase interativa entre o público e os jogadores. Também estudamos formas arcaicas de teatro, como o Globo de Shakespeare, objetivando explorar a dimensão vertical. A geometria complexa da sala une o fluxo orgânico com uma forma incisiva e quase estática. Caminhando, sentado, vendo, sendo visto, escutando... todas as atividades e necessidades das pessoas em uma sala de concertos são expressadas explicitamente na arquitetura do espaço. Este espaço que se eleva verticalmente oferece espaço para 2100 pessoas reunirem-se e desfrutarem da música. A forma imponente do hall define a estrutura estática de todo o volume do edifício e reflete na silhueta do conjunto.