Por João Serraglio
Uma estrada sinuosa e estreita percorre o vale entre dois cerros, rodeada por pradarias e casas esparsas. Entre as miradas que as curvas da estrada abrem para a Vila, vê-se, na parte alta do morro, uma construção de madeira e palha que projeta-se sobre o chapadão de pedras.
É o Ventorrilo de la Buena Vista, planejado para ser um equipamento de apoio aos visitantes da região serrana do Uruguai, lugar de grande beleza paisagística mas envolto pelo desamparo da pradaria.
A estrada faz outra curva, desviando o olhar da direção da cabana, e, vencendo a topografia, dá acesso ao Ventorrillo, um conjunto de pequenas construções, composto por um albergue junto a um pavilhão que funciona como restaurante.
O acesso se dá a partir dos fundos, pela parte mais alta do conjunto, que, voltada para o sul, protege os edifícios dos ventos frios.
Este platô principal de terra batida faz a distribuição entre as construções que compõem a implantação: dois elementos lineares, dispostos em V, tendo pátio e horta ao centro, contendo habitações, depósito e banheiros; e o galpão, que surge fundido à geometria de um desses braços, mas lhe corrige delicadamente a angulação, permitindo ao volume principal ajustar-se à topografia e à paisagem, funcionando como refeitório e mirante.
Os dois volumes lineares que dão espaço ao albergue são embasados por muros de pedra, tendo as paredes construídas em alvenaria de tijolos maciços, com aberturas mínimas, e as portas dando para o corredor, aberto para a vista, encimado por armação de madeira roliça e cobertura de palha.
O galpão é o espaço de encontro e contemplação, é a estrutura principal do conjunto. Nesse espaço a estrutura de madeira roliça de eucalipto, com diâmetro de 10 cm, material típico usado na construção dos galpões simples da região, adquire leveza, ao ser conjugada através de pilares em V, que aparecem na fachada que dá para o vale e na linha interna de pilares, mas também na armação do telhado, e na estrutura do encontro dos telhados onde uma peça da cumeeira prolonga-se, tornando-se pilar e, ainda, suporte para tipografia.
A intersecção desses volumes é complexa. Prismas alinhados em diferentes angulações encontram-se nesse ponto e o arremate é feito através de uma deformação que surge na parede do grande galpão com telhado em duas águas, criando duas águas complementares, ambíguas na sua condição simultânea de parede e telhado. Nesse encontro está a porta principal.
Esquadrias de madeira e vidro envolvem três faces do galpão: a luz forte do pampa inunda o espaço interior como numa sala de cinema.
Somente parte do galpão está apoiada na fundação de pedra. Parte dele está solta do chão, pendendo sobre o abismo, apoiada em esbeltos e rústicos pilares de madeira roliça, reforçando a sensação de algo que se solta e flutua.
Essa obra singela faz a ligação entre duas figuras que representam a domesticação da geografia do pampa e invenção de um modo de operar na escala do território: o gaúcho desterrado, flanando pelo pampa, encontra sua correspondência na figura do homem moderno, motorizado, adepto do turismo.
- Ano: 1946
-
Fotografias:João Serraglio