1:1 | Reprodução Assistida

A Galeria Jaqueline Martins apresenta a primeira edição do projeto 1:1, com um trabalho inédito de João Loureiro.

O artista correlaciona o espaço de exposição da galeria com um açougue da região, bairro da Vila Buarque, centro de São Paulo. Mas mais do que ocupar ambos os espaço com um conjunto de obras, João Loureiro concebe uma série de ações encadeadas que são ciclicamente repetidas ao longo do período da exposição, fazendo com que o trabalho se constitua cumulativamente dia-após-dia.

No açougue do supermercado Futurama, uma vitrine congeladora contém várias esculturas de carne moída, reproduções em escala reduzida da obra “Figura Reclinada em Duas Peças: Pontos” (1969-1970) de Henry Moore (1898-1986). Uma vez por semana, uma destas esculturas é exposta entre as outras carnes da vitrine refrigerada principal e depois transportada até a uma criação de moscas-domésticas, onde é usada como alimento para esses insetos. Uma vez por semana, o artista se desloca até ao açougue e recolhe as moscas mortas da armadilha luminosa para insetos ali instalada. As carcaças das moscas são levadas para o espaço de exposição na galeria e ali são espetadas, com alfinetes entomológicos, numa escultura de isopor, reprodução à escala real da obra “Formas Únicas de Continuidade no Espaço” (1913) do artista italiano Umberto Boccioni (1882-1916). Ao longo da exposição os mesmos processos são repetidos e a escultura de isopor vai acumulando cada vez mais moscas mortas.

“Formas Únicas de Continuidade no Espaço” não é apenas o ponto alto da trajetória artística de Boccioni mas também um dos principais símbolos do Futurismo, movimento proto-fascista originado na Itália no início do século XX, e dotado de uma ideologia estética e política que vangloriava o progresso moderno, rompendo ferozmente com qualquer tipo de “passadismo”. Ao almejar uma renovação total da vida humana o Futurismo alargou a sua esfera de atuação para vários campos tais como a culinária. As esculturas de carne são um dos pratos defendidos pelo Manifesto de Cozinha Futurista. Ao transcender a função dietética da comida o movimento não só pretendia explorá-la como um meio artístico, mas também como instrumento de difusão de ideais nacionalistas e fascistas, que almejavam uma transformação simultânea do corpo e da mente da população.

O Homem em marcha representado na obra “Formas Únicas de Continuidade no Espaço” sintetiza esse corpo em mutação, que é o paradigma do Futurismo. O gesso da matriz original da escultura encontra-se no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC USP), e a partir dele foram realizadas as conhecidas versões em bronze; a quarta e última, feita para a TATE Gallery e trocada com o MAC USP pela escultura “Figura Reclinada em Duas Peças: Pontos” de Henry Moore. Ambas as peças sintetizam as trajetórias artística de seus autores, e as suas imagens ficaram imortalizadas num inconsciente coletivo que transcende a História da Arte. As moscas, que no trabalho de João Loureiro são os agentes conectores dos dois espaços, não têm aparências individuais distinguíveis, uma representa todas e todas possuem uma insignificância que lhes garante, por séculos, o mesmo desdém em qualquer lugar.


Sobre o artista:
João Loureiro, (Brasil, 1972), é Mestre em Poéticas Visuais (ECA-USP, 2007) e licenciado em Artes Plásticas (FAAP, 1995). Fez individuais como “Gelo para festas”, SESC Sorocaba (Sorocaba, 2017), “Pedra que Repete”, Casa da Imagem (São Paulo, 2013), “Fim da Primeira Parte”, Galeria Vermelho (São Paulo, 2011), “Blue Jeans”, Projeto Octógono, Pinacoteca do Estado (São Paulo, 2009), “Reaparição”, Paço Imperial (Rio de Janeiro, 2008), entre outras. Participou das exposições “Modos de ver o Brasil”, Oca (São Paulo, 2017), “Ao Amor do Público”, Museu de Arte do Rio (Rio de Janeiro, 2016), “Imagine Brazil – Artists Books”, DHC/ART Foundation for Contemporary Art (Montreal, 2015), “Vancouver Biennale” (Vancouver, 2014), “Panoramas do Sul - 18º Festival SESC/Videobrasil”, SESC Pompéia (São Paulo, 2013), “In Situ – Arte en el Espacio Publico (Argentina, 2012), “MAM na OCA”, OCA (São Paulo, 2006), “Panorama da Arte Brasileira”, Museu de Arte Moderna (São Paulo, 2005), entre outras. Recebeu, a Bolsa Vitae de Artes Visuais (2004) e foi premiado no Edital Arte e Patrimônio - IPHAN/MINC/Petrobras (2007).

Sobre o curador:
Bruno de Almeida, 1987, Brasil/ Portugal. Arquiteto e curador. Desenvolveu projetos com instituições tais como: Harvard University, Graduate School of Design, Cambridge, EUA; Storefront for Art and Architecture, Nova Iorque, EUA; Pivô Arte e Pesquisa, São Paulo, Brasil; Galeria Leme, São Paulo, Brasil, entre outras. Participou de residências de instituições tais como: Ideas City, New Museum, Nova Iorque, EUA, em colaboração com LUMA Foundation, Arles, França; Curatorial Intensive, Independent Curators International, Nova Iorque, EUA; IMPACT17, PACT Zollverein, Essen, Alemanha, entre outras. Próxima residência: TATE Intensive, TATE Modern, Londres, Inglaterra.

Sobre a Galeria Jaqueline Martins:
Espaço de pesquisa, documentação, fomento e exibição da produção artística contemporânea, a Galeria propõe estratégias curatoriais colaborativas, que fomentem o diálogo entre diferentes gerações e distintas perspectivas culturais. Mantém como diretriz principal o estímulo às práticas artísticas caracterizadas pelo conceitualismo, pela ênfase nos processos, e pela postura crítica, e muitas vezes subversiva. Ao integrar pesquisas e práticas que confrontam a cena contemporânea em seu programa expositivo, a Galeria contempla revitalizar o debate que compreende ações artísticas como zona de contato para o exercício de mudanças estéticas, sociais e políticas.

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Cita: "1:1 | Reprodução Assistida" 31 Mai 2018. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/895540/1-1-reproducao-assistida> ISSN 0719-8906

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