Uma caixa, branca, atravessa o céu de Olinda.
Sobre o topo da colina, no local escolhido para fundação da cidade, de onde se avista toda o sítio urbano e o mar, num espaço vacante entre a Sé e a Casa de Câmara, foi plantada uma semente da arquitetura moderna no Brasil.
Um grande prisma de planta retangular serve de base ao conjunto, retificando o terreno delicadamente desnivelado. Esse desnível se acumula, permitindo que na cota mais baixa do terreno aberturas ofereçam acesso ao interior do sólido, onde funcionam banheiros públicos, que servem aos usuários do espaço do sítio histórico.
Nesse ponto, a solidez monolítica do edifício é negada, quando as aberturas dos banheiros fluem para a praça, o que nos leva a desconfiar que o edifício tenha sido implantado dessa forma para delimitar o vazio que o rodeia.
Sobre esse volume, um espaço aberto, tal qual praça elevada, artifício que viria a ser reiterado pelo modernismo brasileiro.
Na sequência, em direção ao céu, elevado da base por pilotis de planta retangular, se eleva a caixa.
Trata-se de um cubo branco com altura equivalente a um edifício de seis pavimentos. Duas fachadas cegas servem como moldura para as fachadas protegidas por cobogós. As fachadas cegas protegem as escadas que dão acesso aos pavimentos, enquanto nas outras fachadas, todo o prisma, com exceção do primeiro piso, tem vedação através desses blocos vazados, que protegem corredores internos que circulam as paredes da caixa d’água propriamente dita.
O caráter de monólito da torre é atenuado pela pele de cobogós, que dá permeabilidade a fachada.
Esse intervalo entre a fachada externa e a parede da caixa-d’água evita a incidência direta da radiação solar nas paredes do reservatório e garante a ventilação natural, recuperando o objetivo do mashrabiya árabe: o de armazenar a água em local protegido da luz, mas ventilado, buscando manter o seu frescor.
No ponto mais alto do sítio histórico, ainda mais alto que as torres das catedrais, os homens do nosso tempo inscreveram essa máquina-caixa, manifestação do respeito pelos sistemas que fazem possíveis as cidades e a vida, num estado assolado pela falta d’água em toda a região do semi-árido.
Tem uma caixa d’água sobre os telhados de Olinda.
- Ano: 1934
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Fotografias:João Serraglio