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Arquitetos: Estúdio Chão
- Ano: 2018
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Fotografias:Renato Mangolin
Descrição enviada pela equipe de projeto. E se os lugares não tivessem muros?
E se nossa casa ficasse sempre aberta?
E se nossa cidade fosse feita apenas de espaços abertos, desimpedidos, irrestritos, interligados?
E se a gente não aceitasse a ideia de que, para convivermos, seria preciso nos prendermos atrás de muros e evitarmos o perigo que acreditamos morar lá fora, a assustadora ameaça do outro?
As violências cotidianas formam a face mais dura da vida na cidade. Para se proteger, a gente demanda muros que cristalizam "nossos medos mais profundos", como diz o arquiteto paulista Angelo Bucci. Essa construção coletiva do medo invade todos os lugares e assume as mais diversas formas, das mais etéreas às mais sólidas, das mais cristalinas às mais opacas. À criança, a imaginação permite enxergar no muro algo além da sua condição de divisão. Permite enxergá-lo como algo a ser atravessado, algo atrás do qual mora o desconhecido, a surpresa, um novo lugar a descobrir. A imaginação tem o poder de desafiar a realidade.
Convidados pelo MAR (Museu de Arte do Rio) a criar uma arena para a programação pública de rodas, debates e performances durante o período da exposição “Quem não luta tá morto! Arte, Democracia e Utopia”, nós nos propusemos a provocar os próprios limites do museu com o espaço público. Imaginamos um conjunto de arquibancadas e plataformas que transformasse o ato de ocupar os pilotis do MAR num gesto de atravessamento de muros e ativação do espaço público.
TransBorda age como um dispositivo poético para provocar a realidade e fazer um chamado à imaginação, pondo corpos de todas as formas e idades em movimento sobre pés e mãos para atravessar o muro de vidro do pilotis do Museu de Arte do Rio. À semelhança de coisas como escorrega, pula-pula e trepa-trepa, TransBorda é verbo conjugado na ação do presente tanto quanto no imperativo, uma convocação à ação: transborda! Levanta pontes e desfaz, mesmo que por um momento, os muros de vidro que aprendemos a aceitar. Enquanto lutamos para derrubá-los, talvez só mesmo a leveza da imaginação das crianças nos permita suspender a gravidade dos muros que conformam nossa realidade.
A instalação funcionou entre setembro de 2018 e maio de 2019, e tornou-se uma atração amplamente apropriada pelas crianças do bairro e visitantes, sendo uma importante iniciativa dentro de um reposicionamento estratégico do museu na comunidade e na cidade, empreendido pela sua nova direção, e que tem resultado em significativa ampliação de público. Acreditamos que projetos como esse, em que pesam a efemeridade provocativa da intervenção, a atenção ao espaço público como gesto artístico e o protagonismo dos encontros humanos sobre a forma arquitetônica per se, ajudam a ampliar o campo de pesquisa da arquitetura para alem dos seus limites usuais.