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Arquitetos: NPS Arquitectos
- Área: 170 m²
- Ano: 2020
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Fotografias:Cunha Pimentel
Descrição enviada pela equipe de projeto. Terá sido porventura algumas horas depois de ter ecoado na telefonia a “Grândola Vila Morena” de Zeca Afonso, 2ª canção ‘senha’ de uma revolução que iria libertar Portugal de um regime ditatorial, no dia 25 de Abril de 1974, que um percurso que tinha sido iniciado uns meses antes, foi abruptamente interrompido. A obra terá sido abandonada nesse mesmo dia, tendo se tornado uma espécie de ruína contemporânea de um edifício de habitação perfeitamente anónimo. 42 anos depois o processo seria retomado, no momento em que foi iniciado o trajeto para tornar esta peculiar parcela de terreno numa Casa – Atelier.
O terreno, de configuração excêntrica, contido numa malha urbana irregular, por vezes precária e industrial, mas consolidada, e profícuo em dobras e quebras, tem a particularidade de ser muito exíguo na área central, alargando ligeiramente de forma desigual, quer para norte, quer para sul. O resultado do seu abandono foi a existência de uma estrutura em betão armado (vigas-pilares), bastante generosa, quase excessiva.
A proposta, que tentou preservar ao máximo a estrutura existente, surge do diálogo/debate entre essa estrutura e a nova. A escada, colocada no local com menor dimensão do terreno, e, por isso, localizada numa posição de centralidade, surge como o novo elemento estrutural que concilia em si a estabilização do conjunto. Toda a estrutura secundária é em vigamentos de madeira, reduzindo ao máximo a carga sobre a estrutura existente. As deformações planimétricas do terreno, acabam por se repercutir na secção, desdobrando os dois níveis que perfazem a cércea do edifício para a via pública (norte) em três sub-níveis para o interior do logradouro (sul). Apesar da irregularidade geométrica, procurou-se estabelecer uma permeabilidade entre as suas partes, que, mais do que a função que integram, procuram ser espaços versáteis com especificidades espaciais e luminosos, capazes de albergar múltiplas utilizações, quer sejam de trabalho, lazer, repouso ou contemplação.
A casa abriga-se do exterior, ora encerrando-se através de duas grandes empenas cegas e recortadas (nascente e poente), ora encerrando-se para a via pública (norte) através de uma fachada pontuada por um postigo e um pátio com luz zenital, para, logo a seguir, se relacionar de forma mais generosa com o interior do logradouro (sul). O edifício surge como uma unidade compacta, um refúgio com relações recorrentes entre espaços interiores e exteriores, mas sempre íntimos. A luz natural, de forma vibrante, ora desvenda e anima, ora recorta e omite a ‘doce desordem’ da composição espacial.
A quase inexistência de acabamentos, acaba por exponenciar uma tensão entre a crueza das superfícies e o adorno provocado pelas juntas dos materiais, como o betão, o bloco de betão, o marmorite e os painéis, quer de madeira natural, quer de derivados de madeira.