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Arquitetos: idsp arquitetos
- Área: 160 m²
- Ano: 2021
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Fotografias:Manuel Sá
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Fabricantes: Bonaluce, Casa Varella, Decoratto, Elevare, Fahrer Design, GP esquadrias, Madel, Madelasca, Rewood, Saltense
Descrição enviada pela equipe de projeto. O terreno em que o projeto é implantado é caracterizado pela presença marcante de um maciço arbóreo com vegetação de diferentes portes e variedades. Anteriormente abrigava parte da sede social do loteamento em que está inserido, deixando como herança algumas pedras desta história, complementadas e reagrupadas, reorganizando e preparando o território para acomodar uma nova casa. Apresenta leve declividade a nordeste, em direção a uma área de preservação permanente que contém um lago, várzea e grandes árvores nativas, contíguas ao terreno. A beleza do terreno determinou o projeto e a casa se desenvolveu numa relação íntima com a topografia e paisagem.
Com o intuito de colocar a casa na altura das copas das árvores, promovendo o convívio diário com a flora e fauna ali presentes, foi projetado um pódio de pedra que abriga área técnica e acomoda uma pequena piscina cuja forma se ajusta ao canto do lote e guarda certa semelhança com um açude presente nas cercanias do terreno. Por cima deste bloco geométrico, trapezoidal, a peça superior, informe, se apoia, desliza e se inclina tal como um agrupamento megalítico, tão presente em nossas zonas rurais. Em “Adjacent, Against, Upon”, Michael Heizer parece ter-se utilizado deste jogo lúdico.
À norte, na área social, inverte-se a lógica estrutural convencional em que o concreto armado atua na compressão e a madeira na tração, propondo delgados pilares de madeira laminada colada (MLC) como suporte para uma “tenda” de concreto armado, “esticada” em frente ao verde. Os pilares, ao mesmo tempo que emulam a verticalidade dos troncos das árvores próximas, reproduzem a elementaridade das estruturas rurais que originaram o loteamento. Sua repetição ordenada faz lembrar das Cariátides, agora sem face e de pinus. À oeste, atualiza e subverte o ‘alpendre paulista’, substituindo a capela por uma biblioteca, que convida ao prazer da leitura e pesquisa. À leste, em busca da luz do sol nascente que vem filtrada pelo maciço arbóreo no fundo do lote, lançam-se dois tubos, à sua procura. Neste momento, o “Laboratório de Tizas” de Jorge Oteiza e alguns dos “Seres Imaginários” de Jorge Luis Borges veem à cabeça.
A obra procura se encaixar como uma prótese na paisagem: encaixa-se no vazio deixado pelas árvores. Acopla-se naturalmente, mas não tenta imitar a complexidade da natureza. Geometriza-a. Numa escala ambígua, a edificação pequena e fragmentada talvez seja mais que um refúgio e talvez menos do que se espera de uma casa, assumindo um caráter de ‘pavilhão’ – um espaço coberto cercado de ampliações – como aqueles que (ainda) existem nos arredores das cidades paulistas.
Projetada pouco após a releitura de “O Constante Diálogo” de Drummond, capta a atmosfera do poema, numa espécie de ‘tradução matérica’, num exercício de comunicação direta com o contexto, natureza, herança cultural, ancestralidade, ao mesmo tempo que acena para o futuro. Uma casa-pavilhão para aprender com o voo dos pássaros, o vento nas folhas, o “movimento” do sol, da lua e dos astros. Uma obra em constante diálogo, em tempos em que este se faz cada vez mais necessário.
“O Constante Diálogo”
Há tantos diálogos.
Diálogo com o ser amado
o semelhante
o diferente
o indiferente
o oposto
o adversário
o surdo-mudo
o possesso
o irracional
o vegetal
o mineral
o inominado
Diálogo consigo mesmo
com a noite
os astros
os mortos
as ideias
o sonho
o passado
o mais que futuro
Escolhe teu diálogo
e
tua melhor palavra
ou
teu melhor silêncio.
Mesmo no silêncio e com o silêncio
dialogamos.
Carlos Drummond de Andrade, in 'Discurso de Primavera e algumas sombras ' (1977)