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Arquitetos: Cidade Quintal
- Área: 98 m²
- Ano: 2023
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Fotografias:Ana Luzes
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Fabricantes: Condor, Coral, Grafilito, Kärcher
Descrição enviada pela equipe de projeto. Vinte e quatro mil tampinhas plásticas doadas por moradores do bairro Morro do Quadro em Vitória-ES, serviram como base para melhorias sócio-espaciais em um mirante na região. O projeto, que envolveu agenciamento comunitário, criação e execução, foi desenvolvido pela Cidade Quintal e fez parte das ações do Festival MC - edição favela, realizado pelo Movimento Cidade.
O Mirante do Cabral é um espaço que oferece uma vista panorâmica da paisagem urbana e natural da ilha de Vitória. Fica no alto, em um cruzamento entre becos e a escadaria principal, que segue para o topo do morro. No dia-a-dia dos moradores, é um ponto de parada para descanso após uma longa subida. Para as crianças que moram no entorno, é um local de brincadeiras, visto que a praça do bairro fica na baixada.
Para além das vivências cotidianas, é ponto de encontro do coral Serenata D'Favela, iniciativa que há 13 anos impulsiona jovens talentos do bairro a partir da música. De acordo com integrantes, é o cenário perfeito para gravação de videoclipes e apresentações que mostram a potência do lugar: as pessoas e sua vista incrível de outras comunidades. Foi o Serenata D'Favela que abraçou o projeto, ajudou a definir o espaço da intervenção e acompanhou de perto o desenvolvimento.
No caminho até o Mirante está a casa do Vicente, pedreiro que inovou no bairro ao revestir a fachada da sua casa com tampinhas coloridas. O resultado é um efeito semelhante a pastilhas de vidro que torna a casa um ponto de parada para observação. Vicente inspirou as primeiras ideias para a transformação do mirante e foi mentor durante o processo.
As melhorias envolvem a construção de um platô de frente para a vista, além de reparos, pinturas e da inserção de painéis gráficos, feitos com tampinhas plásticas. O acesso até lá se dá a pé, por becos e escadarias. Este foi um dos maiores desafios enfrentados na execução do projeto, devido a quantidade de materiais que precisou ser carregada manualmente, como areia, brita, cimento, tinta e ferramentas.
Em um curto tempo foi realizado um encadeamento de atividades desde a mobilização de resíduos, co-criação com a comunidade, montagem dos painéis com o plástico e a implementação, o que foi possível graças ao senso de colaboração de todos os parceiros durante o processo.
O espaço central nas transformações do Mirante do Cabral foi um platô que fica de frente para a vista principal. De acordo com vizinhos, antigamente ali havia uma casa ocupada por 3 irmãs, Maria, Eliza e Serafina, que deixaram o espaço um tempo antes da prefeitura construir a escadaria principal que corta o alto do morro - e também cortou a casa. Mesmo com o que sobrou dela, um piso quebrado, uma escada e bastante mato, havia crianças que gostavam de brincar no local. No projeto, o piso foi formalizado, possibilitando novas apropriações mais seguras e divertidas para as crianças.
O platô se tornou o espaço mais amplo do mirante, ideal para apresentações e gravações. Foi aproveitada uma escada que havia no local de onde é possível ter ângulos privilegiados para filmagens e ensaios fotográficos, além de servir como arquibancada de onde se vê as pinturas e a vista.
Prática circular: Do resíduo plástico ao espaço requalificado. O Morro do Quadro não é a única periferia que vivencia os efeitos da falta de uma política de gestão de resíduos adequada. Por mais que possam ser vistos pontos irregulares de 'lixo' pelo bairro e todo o estigma que esse cenário carrega, também deve-se considerar trabalhos como o da casa de tampinhas do Vicente, que de alguma maneira ressignifica essa realidade.
"Doe tampinhas e contribua com um projeto na comunidade", foi a frase em destaque nos coletores espalhados pelos comércios locais e escola. Ativar a comunidade para uma campanha de doação de resíduo e apresentar um resultado final em que todos possam se beneficiar, é uma prática circular capaz de promover conscientização e mobilizar mudanças mais duradouras.