Arquitetos
Vinicius Mazzoni (Profissional Responsável), Akanoe Martins Ferreira e Giuliana Siqueira MocelinLocalização
São Paulo, BrasilAno do projeto
2013Fotografias
Cortesia de Vinicius Mazzoni
Este projeto foi destacado pelo júri do Concurso para Adaptação do Edifício da Biblioteca da Faculdade de Direito da USP. A Comissão julgadora considerou esta "proposta arrojada, com solução construtiva que contempla a remoção da estrutura do edifício e, a partir desta liberdade cria uma nova espacialidade, diferenciada no panorama dos projetos apresentados, alcançando consistente unidade conceitual". Confira as imagens, desenhos e texto sobre o projeto que seus autores compartilharam conosco a seguir.
Do Arquiteto. Na Pré-História o homem buscou se comunicar através de desenhos feitos nas paredes das cavernas. Com essas pinturas o homem trocava mensagens, passava idéias, transmitia desejos, necessidades e conhecimento a seus semelhantes.
Através da história, a biblioteca surgiu, evoluiu e suas funções foram transformadas juntamente com a transformação das sociedades.
A primeira função da biblioteca, historicamente, era indistinta da função do arquivo e tinha a função de memória, que se refere a reunir e preservar os registros do conhecimento. Seu caminho, contudo, entre avanços e retrocessos, possibilitados pela estrutura social, cultural, tecnológica, política e econômica, tem hoje a função de dar acesso, possibilitando a democratização da informação, como meio de assegurar o exercício da cidadania.
A Antiguidade nos apresentava uma biblioteca marcada pelos sentidos de restrição, onde poucos possuíam a possibilidade de adentrar e fazer uso de seus acervos. Até mesmo a espessura arquitetônica dos prédios, que abrigavam as bibliotecas, era projetada para impedir que as obras circulassem, ficando restritas dentro daquele espaço. A grande maioria das entradas das bibliotecas possuía guardas para impedir a circulação e roubo das obras; e isso continuou e intensificou-se no período que corresponde à Idade Média, já que, nas bibliotecas, existiam portas que não levavam a lugar algum, corredores sem saída, entradas e saídas falsas, que eram aleivosas, enfim, um real labirinto no qual poucos entravam e saíam impunes.
No século XVI a biblioteca passou a responder novas necessidades e questões, tendo uma concepção voltada para uma constante democratização, ganhando ainda mais força no século XIX, motivada por questões como a Revolução Francesa, Industrial e Liberal.
As bibliotecas do século XXI mudaram incrivelmente ao passar do tempo e estão conseguindo acompanhar o grande avanço tecnológico com os diversos recursos eletrônicos, possibilitando o dialogo com a nova geração.
Este projeto propõe a reforma de parte da biblioteca, Anexo IV, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, localizada no centro da cidade de São Paulo. Esta que foi pioneira no ensino juridico do Brasil e tem uma historia importante de representação ativa na formação do sistema juridico nacional, e consequentemente, no comportamento de cada cidadão. A reforma do Anexo IV é de extrema relevancia para possibilitar o abrigo de todo o conhecimento fisico adquirido durante os anos.
A função deste novo edificio vai além de seu objetivo direto, biblioteca, representando uma intervenção urbana que apoia a revitalização e a valorização do centro velho da cidade.
A busca deste projeto era melhorar e criar espaços novos de interação e percepção para seus usuários, que fossem atrativos e que exercessem sua função.
Nesta proposta os livros são os protagonistas dos espaços, eles aparecem como destaque em todos os lugares, atraindo também quem resolve apenas passar rapidamente pela frente do edifício.
O edifício se abre para a cidade através do térreo com pé direito alto e convida seus interessados a adentrarem e usufruírem deste contexto acadêmico, atraídos pelos livros que já aparecem desde a chegada através de uma caixa de vidro, posicionada dentro de um novo vazio que permeia todos os andares da biblioteca e armazena parte do acervo. Este se torna um elemento forte no conjunto que puxa o olhar neste mesmo sentido até encontrarmos novamente o ambiente externo através do vazio na cobertura.
Este novo elemento em destaque criado dentro de edifício apelidamos de “cérebro”, pois assim como o nosso (humano), este também se preenche de conhecimento ao longo dos anos, os livros. Então é dentro deste espaço que consideramos a durabilidade desta proposta para mais 50 anos de existência.
Hoje, dentro deste volume estão previstos espaços de leitura e algumas estantes, que com o passar do tempo, outras novas vão aparecendo e isso vai se preenchendo e ocupando seu espaço até este ser tornar “adulto”.
A ideia de um elemento que sofre esta mutação ao longo do tempo e que pode ser visto de diferentes maneiras quebra a monotonia do edifício, deixando-o vivo, de certa forma. Dentro desta peça central existe uma circulação vertical que permite os usuários desfrutarem da biblioteca livremente “imersos” nos livros, deixando-os participar de toda esta história.
Os vazios cortam todo o conjunto no sentido vertical em dois momentos, permitindo que este novo volume central se solte em relação ao existente, diferenciando harmonicamente as duas fases do edifício, além de permitir um maior contato com o ambiente externo, mesmo que no centro do prédio, levando mais ventilação e iluminação.
O andar do subsolo se abriu através de um vazio em relação ao restante do conjunto e passou a interagir com toda a biblioteca, deixando-o mais atrativo e confortável, permitindo que independentemente do uso se torne possível participar do restante da dinâmica do edifício, sem atrapalhar.
As bibliotecas (acervos) se distribuíram ao longo dos andares e se comunicam visualmente através dos vazios, interagindo neste aspecto em todas as direções. No andar intermediário se concentrou o uso comum com o intuito de centralizar e priorizar a todos os usuários.
No centro vertical da fachada do edifício surge uma abertura com pé direito duplo que permite um respiro para dentro e para fora. Se torna um lugar de maior interação com a cidade, onde é possível admirar o entorno de um andar privilegiado, porém ainda próxima à rua, de onde é possível ver o Edifício Histórico da Faculdade, a Catedral da Sé, entre outros. Se tornou um espaço contemplativo e descanso no meio do conjunto, não perdendo a interação com o próprio edifício.
Nos dois últimos andares do edifício concentrou-se o programa administrativo da biblioteca, que também se aproveitou destes vazios verticais para interagirem visualmente com o restante do conjunto e terem luz e ventilação natural para o meio das lajes.
Sobre a cobertura do edifício está um terraço, com banhos e apoios, para múltiplo uso e contemplação, tanto da cidade quanto do vazio do céu. Consideramos neste andar a possibilidade de fecharmos estes vazios que permeiam o interior do prédio, afim de evitarmos chuvas, se for necessário.
A circulação vertical do prédio se concentrou no fundo do lote com o intuito de tornar o edifício mais convidativo para a fachada frontal, aumentar a iluminação natural e ventilação dos andares, além de facilitar toda a movimentação neste sentido versus os fluxos horizontais, organizando todos os setores do prédio.
Em relação à estrutura existente, basicamente, com a abertura das lajes e a retirada de alguns pilares, resolvemos concentrar toda a carga distribuída nas duas laterais do edifício, prevendo reforços laterais em concreto e vigas metálicas que reforcem as lajes novamente.
Assim, aproveitamos esta situação estrutural para concentramos os livros neste mesmo conceito, em toda a periferia dos andares, com o intuito de aproveitarmos a estrutura lateral existente e seu reforço para colocarmos mais esta carga, evitando reforçar as lajes existentes neste sentido e para o volume central, que está aproveitando este novo reforço lateral na estrutura para descarregar esta nova carga, que através de tirantes e apoios metálicos laterais forma sua leveza.
O acréscimo de lajes e a retirada de outras, deu ao edifício uma maior flexibilidade e proporcionou criar vazios que valorizaram a qualidade dos espaços e criou-se uma dinâmica nova de uso.
Os dois vazios que permeiam todo o edifício, além de trazerem maior interação sensitiva com o espaço externo, trouxeram luz natural para todos os andares, e uma ventilação constante dentro do conjunto. Através do famoso efeito chaminé.
A fachada principal do prédio está para o lado de maior incidência do sol e isso foi resolvido com uma tela metálica perfurada, com vidro e película protetora, afastada da fachada, permitindo a entrada de luz difusa e ventilação constante, proporcionando uma proteção térmica e luminosa.
Usamos o simbolo juridico como base para desenvolvimento da nova estrutura da fachada e para o novo volume central do edifício. Levando em consideração a estrutura atirantada da balança que se mostra ludicamente ao sistema. A tração deste sistema se repassa diretamente para a estrutura do novo volume proposto no interior do edifíco, e usamos isso de maneira simbólica para a fachada principal, trazendo esta reptição de desenho uma malha que sustenta a nova pele do conjunto.
Assim, o novo edifício foi pensado para resolver os problemas de espaço e disposição atual da biblioteca de modo que fosse atrativa e permeável para seus usuários, mas também com o intuito de ajudar a cidade na formação direta e indireta de uma sociedade melhor.