No ano de 1997, Londres tinha vários problemas similares aos nossos: qualidade da educação, déficit de investimento na infraestrutura do transporte, desemprego e um grande desequilíbrio entre as distintas zonas da cidade. Mas em 1998, o primeiro ministro da época, encomendou ao arquiteto Sir Richard Rogers do Urban Task Force, a tarefa de identificar quais eram as causas do declínio urbano local, e com base nesse plano, recomendar soluções sustentáveis. E assim nasce o Plano Estratégico de Londres 1998-2004, com uma projeção para 2020, e que abrange estratégias de crescimento, infraestrutura, habitação, desenvolvimento econômico, segurança, cultura e meio ambiente.
Para isto foram identificadas as zonas de regeneração urbana, de oportunidade, os diferentes centros, as zonas culturais estratégias e clusters . Esta informação foi investigada e estudada sob uma estrutura de organismos com funções e objetivos específicos, que vão desde o prefeito, os subprefeitos dos 33 distritos, a GLA (Greater London Authority), LDA (London Development Agency) e a LTGDC (London Thames Gateway Development Corporation). Estas três, dentro de outras, estão diretamente envolvidos no plano, em sua implementação, financiamento e manutenção.
Especificamente a LTGDC é a agência envolvida na regeneração do leste de Londres, a East End, que é onde está concentrada a população de menos recursos na cidade. A regeneração é buscada através da geração de novos empregos e da criação de políticas habitacionais. Dentro da zona leste estão a Lower Lea Valley (LLV), que foi descrita como “a maior oportunidade de regeneração dentro de Londres”. E é especificamente esta área a que será beneficiada com o Plano de Londres para as Olímpiadas de 2012.
A LLV é uma zona pós-industrial, com habitações precárias e espaços sub-usados, além de estar inserida num contexto complexo, cercado de canais. Além disso, é uma das zonas com maiores índices de desemprego, e menores índices de escolaridade. Porém, está a apenas aproximadamente 5 km do centro de Londres, muito próxima do Canary Wharf, que é o centro financeiro da capital. Sua localização, com o planejamento adequado, poderia transformar o que hoje é visto como um problema em uma oportunidade.
Haviam problemas e uma boa oportunidade para colocar a cidade no âmbito internacional e atrair recursos, assim Londres entrou numa acirrada competição para ser sede das Olimpíadas 2012. Ganharam a disputa em 2005, e criaram um organismo especial para receber os jogos, a LOGOC (London Organising Committee for the Olympic Games). O prefeito da época, Ken Livingstone, disse “Não participei da competição porque queria três semanas de esporte….participei porque é a única maneira de conseguirmos bilhões de libras do governo para desenvolvermos East End”.
Efetivamente, os jogos Olímpicos custaram cerca de 9,3 bilhões de libras, e investiu-se em um plano progressivo de três etapas. A primeira etapa correspondente puramente aos Jogos,onde seus espaços estão pensados para receber multidões. Criou-se um grande parque com vários estádios, que terão seus tamanhos reduzidos ou serão desmontados após o evento. No norte do parque criou-se um sistema ecológico de paisagismo que permite o uso sustentável das águas do rio que o atravessa, mantendo a biodiversidade, e dessa maneira também gerar visuais dos estádios. Ao sul, onde está o acesso principal, o planejamento urbano é mais intenso, e a zona abriga também o ArcelorMittal Orbit, – que é uma grande escultura que funciona como mirante – , e o maior estádio do conjunto, o Estádio Olímpico, projetado pelo arquiteto Populus, que possúi capacidade para 80.000 pessoas, reduzindo sua capacidade a 60.000 após o término dos Jogos. Todas as construções foram revistas em padrões de projeto e sustentabilidade.
O mais importante vem logo depois dos Jogos.
Imediatamente após o encerramento das Olimpíadas de Londres 2012, inicia-se a etapa de “conversão”, cuja finalização está prevista para 2020, e que pretende transformar os espaços fechados em espaços de uso público,com a criação de áreas comerciais e com a abertura de novas ruas. E finalmente, o Plano de Legado, mais extenso, deverá estar pronto em 2030, envolvendo principalmente a criação de projetos habitacionais.
Foi elaborado também um Plano de Transporte para assegurar a eficácia do investimento do Legado, facilitando o acesso à East London, considerando utilizar os rios como meio de transporte, e aumentando o uso de bicicletas. Esse plano contempla o uso integrado de vias, trens e canais da cidade. Investiu-se aproximadamente 86 milhões de libras no metrô do setor para ampliar as linhas e melhorar a frequência dos trens.
Embora o plano não tenha sido totalmente aceito pelos londrinos, já que muitos consideraram exagerado investir tantos bilhões de libras de uma forma tão concentrada, ou ainda a rejeição por parte dos cidadãos que foram expropriados para a construção do parque, ou simplesmente os que estao contra o plano que atenta contra a memória local, considerando que o plano literalmente apagou o passado industrial da zona, arrancando um pedaço da história da cidade para sempre.
Nós em nossa parte do globo podemos extrair varias lições, o Plano é resultado de uma série de ações que partem no ano de 1998 com o Urban Task Force, e que serão concluídas em 2030, o que são 18 anos ou 4 mandatos de prefeitos ou primeiros ministros. Ou seja, é uma soma de uma série de iniciativas que foram potencializadas com o tempo, e com a consciência de que os resultados não serão realizações pessoais de alguém. Outro fator é a criação de uma estrutura institucional adaptada para as diferentes necessidades e desafios que será enfrentados para a regeneração em grande escala, onde cada instituição em separado exige que a outra funcione bem. Isto nos leva a ter um plano integral, que incluí o transporte, a criação de escolas, hospitais, centros comunitários e comerciais, redes de transporte e habitação.
Provavelmente não contaremos com os mesmos recursos para Rio2016 que já golpei nossa porta, mas esta é a maior motivação para desenvolver a consciência de que tipo de projetos e investimentos queremos ver em 2016 no Rio de Janeiro. Esperamos que o grande evento seja um catalizador de mudanças, e que a cidade maravilhosa receba os investimentos necessários para a criação de uma infraestrutura urbana duradoura e que a visão integradora das diferentes camadas que compõem a cidade, como o transporte, as vias de transporte, os serviços, os usúarios, a cultura, e principalmente o desejo dos usuários de melhorar sua qualidade de vida têm de viver melhor, sejam consideradas e planejadas responsavelmente.Finalmente, um investimento não é um fim em si mesmo, é um meio para que os cidadãos, efetivamente, vivam melhor, as olimpíadas passam, a cidade fica.
Por Consuelo Roldan