Nadia Somekh, convidada do Betoneira, fala sobre habitação para todos. Com sua larga experiência no poder público, atuando como arquiteta, gestora e militante, Nadia começa a conversa dizendo que ainda não estamos em um bom momento de políticas públicas de habitação, mas estamos caminhando. Seus estudos sobre a verticalização mostram que desde 1957 a legislação e regulação urbanística da cidade de São Paulo excluiu os mais pobres dos apartamentos. A legislação impediu a construção de quitinetes na Avenida Nove de Julho e Avenida Paulista, por exemplo.
A arquiteta disse que não há abrigo para a população mais pobre do país e que políticas como o Minha Casa, Minha Vida, são programas de comprometimento da renda do trabalhador, não exatamente programas de habitação social. A regulação urbanística, historicamente, excluiu a população mais pobre, negando o acesso ao mercado.
É necessário fazer uma política nacional de ATHIS.
Outra informação importante trazida pela convidada foi o cenário precário envolvendo as condições de trabalho dos arquitetos: 55% dos profissionais ganham até três salários mínimos. O CAU-BR está fazendo um trabalho no Congresso Nacional para ajudar os arquitetos, gerando empregos e emendas para o programa ATHIS (Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social). Segundo Nadia, é preciso proteger a sociedade, melhorar a vida da população e também dos arquitetos. Dois por cento do orçamento do CAU-BR e do CAU em diversos estados, no mínimo, é para pagar projetos de arquitetura, visando melhorar a vida da população.
A Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social oferece a possibilidade de um arquiteto recém-formado ou em início de carreira atuar junto à população que mora precariamente. Ele pode propor, de maneira mais técnica, soluções para os problemas habitacionais dessas comunidades. “Queremos mais arquitetos trabalhando para melhorar a sociedade, essa é uma das missões do CAU-BR.” A gentrificação está presente no país inteiro e a regulação urbanística prioriza os interesses imobiliários. A informalidade das periferias é o resultado do urbanismo corporativo.
O urbanismo corporativo só pensa na lucratividade; é possível construir com qualidade e dar lucro, o problema é só a lucratividade e a gentrificação.
Para o arquiteto que deseja se envolver com o programa, o passo a passo é buscar os editais no seu estado, nas redes sociais do CAU. O arquiteto precisa estar vinculado a uma comunidade e propor um projeto. Aprovado, ele é remunerado pelo edital e pelo CAU. A ideia, segundo Nadia, é ganhar escala, e, para isso, os representantes do CAU-BR estão batendo na porta dos gabinetes e ministérios.
Nadia Somekh também explicou que uma janela mal virada e um chão mal feito, a depender das circunstâncias, pode causar doenças e, portanto, o arquiteto é um profissional de saúde. “Cada sede do SUS poderia ter um arquiteto”. A perspectiva do trabalho do CAU é, também, achar trabalho para os arquitetos.
A capacitação para o programa ATHIS começa na faculdade, uma vez que o arquiteto precisa ser um pouco transgressor para lidar com todas as complexidades das comunidades, propondo soluções. Já o Minha Casa, Minha Vida, foi tema do final da conversa. É preciso construir com qualidade, residências bem feitas com varanda e dignidade. Não pode ser qualquer coisa. E as construtoras não devem cooptar totalmente o programa. Nadia Somekh convidou todos a se juntarem na empreitada de melhorar a habitação e a vida dos arquitetos.
Quem é Nadia Somekh: Professora emérita da FAU-Mackenzie e doutora pela FAU-USP, Nádia foi eleita presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, o CAU-BR, em janeiro de 2021, para a gestão 2021/2023. É autora de A Cidade Vertical e o Urbanismo Modernizador, além de outros livros e artigos. Pesquisa a verticalização das cidades brasileiras e projetos urbanos com inclusão social e proteção ao Patrimônio Histórico/Cultural na metrópole contemporânea.