A proposta "Tu Reflexión", dos arquitetos chilenos Guillermo Hevia García e Nicolás Urzúa Soler, foi anunciada como vencedora do concurso privado YAP_CONSTRUCTO 2015, uma das cinco versões do YAP (The Young Architects Program), uma parceria anual entre o Museu de Arte Moderna e o MoMA PS1 que "fomenta a pesquisa relacionada a projetos inovadores e promove o talento emergente".
Nesta ocasião, apresentaremos em detalhes o projeto ganhador que busca, segundo os autores, "construir uma experiência incerta, uma situação de estranhamento, da qual não pretendemos ter o controle", esperando que "o visitante esteja na expectativa do que lhe será apresentado no próximo espaço".
Conheça a proposta a seguir.
Nota do Editor: os números entre parêntesis no texto do memorial descritivo faz menção às referências artísticas presentes nas pranchas adjuntas.
Dos arquitetos. Não sabemos com clareza se "tu reflexión" é uma experiência, uma ilusão, uma paisagem, um lugar, um objeto, uma tentativa de construção surrealista, uma aproximação artística ou uma mistura de tudo. Esta posição instável ou de incerteza - o estar a frente de algo que é difícil de se classificar - mas que é capaz de interpelar o visitante, e devolver à ele o que dá "sentido ao projeto" nos seduz (1).
"A incerteza é uma posição desconfortável. Mas a certeza é uma posição absurda."
- Voltaire
Queríamos construir uma experiência incerta, uma situação de estranhamento da qual não pretendíamos ter o controle, já que as possibilidades de reflexão e deformação provocadas pelos planos bidimensionais côncavos e convexos de aço espelhado são infinitas, na medida em que nos movemos através deles (2).
Queremos que o visitante esteja na expectativa do que lhe será apresentado no próximo espaço
O projeto tem seu ponto de partida nas duas definições da palavra reflexão: por um lado a reflexão ótica literal, (deformada e multiplicada) no sentido físico do fenômeno [A] e por outro, a reflexão de ordem mental [B] ao ver-se refletido/deformado no projeto, fazendo com que esta dualidade crie um certo estado de introspecção (3).
Precisamente, dessa dupla condição, sensorial e mental, surge o nome da proposta "Tu Reflexão", onde o pronome pessoal "tu" faz referência ao fato de que o projeto existe a medida em que o visitante se encontra nele e com ele, e o projeto então, é capaz de produzir algo neste visitante. Sem esta testemunha, "o projeto" não existiria (4).
Não trata-se somente de ver a obra, mas sim de permitir que ela o rodeie, o envolva, para que você passe a formar parte dela, e que ela passe a formar parte de você, de uma forma passiva ou ativa, segundo nossas próprias capacidades de observação e reflexão.
A materialização dessa experiência é obtida através de duas operações:
A primeira é a definição de um suporte ou topografia, uma paisagem de montanhas suaves, saturadas de pasto e vegetação macia, colorida por uma infinidade de flores silvestres diferentes (5), e que, além de tudo, é atravessada por um pequeno córrego passível de ser cruzado com um pulo. Esta paisagem é trazida de um lugar imaginário, que poderia ser uma pradaria silvestre ou o instante de alguma pintura de Alfred Sisley (6). Acreditamos que a inclinação natural (artificial) e macia é um dos lugares mais agradáveis para caminhar, sentar, descansar ou relaxar.
A segunda operação é a inserção de três planos bidimensionais de aço espelhado que constroem uma série de espaços interiores e exteriores, esfumaçando os limites, desaparecendo, deixam que seu entorno refletido seja o verdadeiro projeto.
Estes elementos se configuram e se estruturam através de uma abundância de concavidades e convexidades que lhe permitem se auto-suportar e manter-se em pé no mesmo horizonte de 3,20 m com somente 40 mm de espessura (7), quase sem elementos fixados no solo, somente nos pontos mínimos que permitem a construção.
É a relação entre estes planos bidimensionais que configura um volume assimétrico, quase desarticulado, onde não nos interessa a construção da forma propriamente, mas sim, a interação entre os planos espelhados, as curvas e as contracurvas onde multiplicamos a quantidade de situações refletidas e deformadas, de maneira a produzir uma interação pertencente a um mundo de ilusões, mais surreal do que real, dado que na natureza não existe reflexão vertical (8).
Como acontece no Palacio del Alba y el Ocaso (9), não existem elementos horizontais de cobertura. A luz a sombra se configuram e se projetam sobre o solo pela incidência no plano vertical. A proximidade dos planos deverá sombrear as colinas durante a maior parte do dia, criando um ambiente quente, que é refrescado pelo som e pela presença do córrego que atravessa a paisagem.
José Antonio Coderch empregou, de maneira admirável, o mesmo recurso de planos verticais e sombras projetadas para configurar e sombrear o terraço da ampliação do edifício da ETSAB (10) que realizou entre 1980 e 1984, em Barcelona.
As curvas, contracurvas e o fato de que em muitos momentos os elementos se encontram em diferentes distâncias, criarão um universo de reflexões, multiplicações e deformações como se estivéssemos em alguma pintura de René Magritte (11) ou vendo alguns retratos de Francis Bacon (12). Esta experiência é obtida a medida em que entramos ao projeto e o nosso grau de proximidade varia, nos aproximamos, nos afastamos. Estas situações se intensificam quando mais corpos se movem por este lugar, criando coreografias de cores e movimentos que se multiplicarão de maneira infinita.
Queríamos mudar o centro da proposta do objeto para a experiência do sujeito - a interação deste e outros - e como seu contexto se refletirá e se deformará com ele e frente a ele. Não pretendemos, finalmente, construir uma proposta fechada, mas articular um universo de sensações e experiências abertas onde muitas coisas podem acontecer.
[A] RAE 1. f. Fís. Mudança de direção ou de sentido da luz, do calor ou do som quando há um obstáculo.
[B] RAE 2. f. Pensamento ou consideração de algo com atenção para estudá-lo ou compreende-lo bem.
Arquitetos
Guillermo Hevia García, Nicolás Urzúa SolerLocalização
Araucano Park, Las Condes, Las Condes, Santiago, ChileColaboradores
Cristian Fuhrhop, Felipe Droppelmann, Cristóbal Montalbetti e Diego RiveraCliente
ConstructoAno do Projeto
2015Fotografias
Cortesia de Guillermo Hevia García + Nicolás Urzúa