PARA os que pensam que a Rua da Estrada é um inferno, lhes diria que é o seu contrário e que não é difícil provar tal facto de tão visível e argumentada que está a existência do paraíso, decorado interior e exteriormente e equipado com mobiliário de jardim como lhe compete. As portas do paraíso teriam que dar para a Rua da Estrada que é coisa que vai a todo o lado e não tem portagens como as vias mais rápidas.
Depois de terem provado do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, Adão e Eva foram expulsos, como se sabe. Ei-los, no entanto, sentados à porta, já completamente calçados, vestidos e penteados de caracolitos, razoavelmente refeitos dos seus desentendimentos com o Todopoderoso. Em todo o caso, o querubim disfarçado de anjinho papudo, deve ter a espada de fogo guardada debaixo da túnica, não se lembrem eles de voltar a entrar. Da fartura do éden e da paz que reinava entre as bichezas que o habitavam, vislumbra-se daqui a fertilidade de uma galinha no choco e uma águia em sã e branca convivência. Confere.
Como é Paraíso, a Rua da Estrada organizou-se como nunca: ele é passeios, rampas, baias de estacionamento, passadeiras, iluminação, bandeiras, petúnias em vasos e tiras relvadas, separação de faixas de entrada e saída de veículos, caixotes verdes para o lixo e o que mais se poderia ver ao longe se não fosse a curva.
A série de textos do livro A Rua da Estrada é publicada no Correio do Porto