Recentemente anunciada, a mostra "JUNTOS"representará o Brasil na Bienal de Arquitetura de Veneza deste ano. A participação brasileira no evento busca evidenciar histórias de pessoas que lutam e alcançam mudanças na passividade institucional das grandes cidades do país. Farão parte do pavilhão projetos de diferentes escalas e locais, e um dos representantes do Rio de Janeiro é o projeto “Ciclo Rotas do Centro", criado com o intuito de estruturar uma rede cicloviária no centro da capital fluminense.
Washington Fajardo foi o curador escolhido pela Fundação Bienal de São Paulo para escolher os exemplos brasileiros a serem mostrados em Veneza. São 15 trabalhos que compõe a mostra “JUNTOS” que irá compor o Pavilhão do Brasil da Bienal de Veneza. A idéia é buscar “evidenciar histórias de pessoas que lutam e alcançam mudanças na passividade institucional das grandes cidades do País, conquistando arquitetura em processos lentos cujo vagar não é problema, mas um apontamento de soluções ao esfacelamento político do planejamento do território.”
Ciclo Rotas do Centro do Rio de Janeiro
O projeto nasceu em uma parceria entre a Transporte Ativo, o ITDP Brasil e o Studio-X Rio. Foi durante o período pré-eleitoral de 2012 que nasceu a ideia das “Ciclo Rotas Centro”. Um presente da Sociedade Civil ao Prefeito recém empossado, visando estruturar uma rede cicloviária no centro da cidade. Para isso, ciclistas cariocas se uniram para construir um plano completo de ciclorrotas cruzando toda a região central, uma rede capaz de integrar os bairros centrais e ao mesmo tempo unir a Zona Sul à Zona Norte.
Para além do cicloativismo, a proposição de um plano estruturado foi uma maneira eficiente de municiar os técnicos da administração municipal para que eles pudessem ter subsídios para aumentar a malha cicloviária. Uma estratégia que independe dos humores políticos e que se constrói para além do calendário eleitoral.
Já em 2013, a malha proposta pelo projeto Ciclo Rotas Centro foi oficializada e passou a fazer do parte do planejamento da Prefeitura do Rio de Janeiro. Aos poucos a infraestrutura construída coletivamente vem ganhando as ruas.
Veja, a seguir alguns resultados da pesquisa realizada pelo Ciclo Rotas:
Uma malha cicloviária para o centro do Rio de Janeiro
A bicicleta é um dos meios de transporte mais eficientes já inventados: a tecnologia mais apropriada para distâncias curtas, com baixíssimo custo operacional. Uma pessoa pedalando viaja duas vezes mais rápido, carrega quatro vezes mais carga, e cobre três vezes a distância percorrida por uma pessoa caminhando. A bicicleta não emite poluentes e contribui para fazer da cidade um espaço livre de congestionamentos. Desta forma, tem um papel fundamental no mosaico de mobilidade urbana das cidades do futuro. Cidades que buscam um modelo de desenvolvimento urbano mais humano/humanizado e sustentável devem priorizar uma rede densa e bem distribuída de infraestruturas para bicicletas, que propiciem conveniência, segurança e conforto para o ciclista.
O Rio de Janeiro passa por um momento especial, em que profundas transformações estão em curso. Este é o momento de se pensar novas formas de viver na cidade e de lançar mão de ideias e estratégias que possam contribuir para um ambiente urbano mais eficiente, saudável e agradável de se viver.
A infraestrutura cicloviária é uma alternativa simples e econômica para deslocamentos entre 5 e 10 km, que vem sendo adotada com sucesso em diversas cidades do mundo: Cidade do México, Bogotá, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Nova Iorque, Paris, Berlim, Copenhague, Amsterdã, Guangzhou, entre outras.
Segundo estimativas que só consideram o trajeto casa-trabalho, na região metropolitana do Rio de Janeiro são feitas 1.2 milhões de viagens de bicicleta por dia, sendo 446 mil na capital. A experiência internacional comprova que o número real é geralmente de 4 a 6 vezes maior.
O centro em transformação
À semelhança de diversas cidades do mundo, o Rio de Janeiro está empreendendo a desafiadora tarefa de recuperar e revitalizar sua área central, incluindo importantes investimentos em mobilidade. Mais de R$ 11 bilhões estão sendo investidos em projetos de grande porte, com objetivo de ampliar a mobilidade entre os bairros centrais e sua integração com o restante da cidade, tais como os bondes modernos (VLT), o corredor de ônibus transbrasil e a expansão do metrô conectando o centro à barra da tijuca.
Uma vez conduzidos os grandes sistemas, é hora de olhar para a mobilidade urbana na pequena escala. A implantação de uma rede cicloviária aumenta a capilaridade e é uma maneira eficaz de atrair e reter os usuários do transporte público. Articulada à ampliação do sistema de bicicletas públicas Bike Rio, o Ciclo Rotas centro contribui para o estabelecimento de um novo modelo de mobilidade sustentável para o rio, e para a ressignificação de sua área central.
Preenchendo o vazio
O centro do rio é uma das regiões da cidade ainda não contemplada por uma malha cicloviária, resultando em um obstáculo tanto para a circulação interna, como para sua articulação com as malhas da zona sul, tijuca/maracanã. A ciclovia em implantação na zona portuária, dentro do projeto porto maravilha, irá totalizar 17 km. Apesar disso, não possui nenhuma conexão com as outras ciclovias já implantadas na cidade, configurando-se numa ilha. Ao propor uma integração destas redes com uma infraestrutura cicloviária que ofereça segurança, conforto e conveniência, a bicicleta se tornará uma alternativa clara de transporte para moradores de São Cristóvão, Tijuca, Rio Comprido, Catete, Laranjeiras, Flamengo, Botafogo, Copacabana que poderão acessar o centro do rio sem dificuldades de bicicleta.
Quem pedala no centro hoje
Para entender quem pedala hoje no centro, foram realizadas cinco contagens em pontos estratégicos: Candelária, Passeio Público, Estácio-Cidade Nova, Praça XV e Av. Chile. Foi encontrado um total de mais de 3.000 ciclistas, sendo 40% bicicletas de serviço, e 25% destas, triciclos. Um dos principais indicadores que atesta a qualidade da infraestrutura para o ciclista é a quantidade de mulheres pedalando. Neste quesito, o centro foi reprovado: apenas 3% eram mulheres.
Desenhando a malha Ciclo Rotas Centro
Liderado pelo ITDP Brasil, Studio-X Rio e Transporte Ativo, o estudo Ciclo Rotas Centro começou em junho de 2012 e teve como princípio norteador o aspecto participativo e democrático, resultando num diálogo constante com ciclistas, ativistas e demais indivíduos interessados na implantação de uma infraestrutura cicloviária no centro da cidade.
Entre julho e dezembro de 2012, uma série de atividades foram realizadas, incluindo:
- Discussões iniciais sobre a ideia conceitual, revisão do plano para a área desde os anos 90, definição de prioridades;
- Workshops e coleta de dados online para mapeamento de demanda;
- Cinco contagens em pontos estratégicos da cidade, para confirmar a demanda e verificar particularidades e desafios dos usuários atuais;
- Medições e coleta de dados em todos as ruas da rede sugerida para avaliação das possíveis alternativas de implantação;
- Discussões com o governo sobre potencial de implantação; e
- Discussões com todos os envolvidos para validação da proposta.
A exposição do estudo foi inaugurada no Studio-X, em julho de 2013. O entusiasmo dos visitantes, inclusive de técnicos da prefeitura e do estado, confirma a validade desta iniciativa como uma peça importante no mosaico da mobilidade da cidade.
Conclusão
Desde a década de 60, a política de mobilidade do brasil tem sido de incentivo ao uso do carro. As cidades se adaptaram ao aumento da frota automobilística, construindo cada vez mais vias urbanas e diminuindo o espaço para pedestres e ciclistas.
O aumento da infraestrutura para automóveis levou a um aumento ainda maior do seu uso. Entre 2001 e 2011, a taxa de motorização nas doze regiões metropolitanas brasileiras cresceu em mais de 8,9 milhões de automóveis. 77,8% em uma década. Em média, foram adicionados mais de 890 mil veículos por ano nas cidades. O resultado, todos nós conhecemos: trânsito intenso, conturbado, violento. Pouco espaço para o pedestre e o ciclista.
A viagem diária de todos nós começa desde o momento que saímos de casa até chegarmos ao nosso destino. As condições das calçadas, ciclovias, estações e transporte público, assim como sua inserção no espaço urbano, definem a qualidade de vida das cidades. A cidade ideal deva oferecer opções de qualidade para todos e, para isso, precisamos de transporte diversificado e de qualidade - acessível, seguro, confortável e inclusivo.
Estamos em um momento muito oportuno para ampliar e aprofundar o diálogo entre governantes e a sociedade para, juntos, definirmos uma nova forma de se viver na cidade. Para isso, é imprescindível quebrar paradigmas e o status quo que vem orientando o desenvolvimento de nosso país no último século.
Via Transporte Ativo. Acesse a pesquisa aqui.