Forensic Architecture reconstrói digitalmente uma prisão síria a partir da memória de sobreviventes

Forensic Architecture, uma agência de pesquisa com sede na Universidade de Londres, em colaboração com a Anistia Internacional, criou um modelo 3D de Saydnaya, uma prisão de tortura síria, usando sistemas de modelagem arquitetônica e acústica. O projeto, iniciado este ano, reconstrói a arquitetura do centro secreto de detenção a partir da memória de diversos sobreviventes que são agora refugiados na Turquia.

Desde o início da crise da Síria em 2011, dezenas de milhares de sírios foram levados a uma rede de prisões e centros de detenção secretos administrados pelo governo de Assad sob alegação de crimes contra o regime. Após passarem por uma série de interrogatórios, muitos prisioneiros foram levados a  Saydnaya, um "destino final" notoriamente brutal, onde métodos de tortura são usados não apenas para obter informações, mas também para aterrorizar e frequentemente matar os detentos. 

Localizada cerca de 25 km ao norte de Damasco, Saydnaya ocupa um edifício dos anos 1970. Recentemente, nenhuma visita de jornalistas independentes ou grupos de monitoramento foram permitidos, portanto, não há registros fotográficos recentes dos interiores do centro, a única coisa que existe são as memórias daqueles que escaparam de lá com vida. 

Visando reconstruir o interior dos espaços, especialistas em modelagem arquitetônica e sonora trabalharam com as testemunhas, que "descreveram as celas e outras áreas da prisão, incluindo escadarias, corredores, portões, portas, janelas, grades e alçapões", além de objetos como cobertores, tigelas e ferramentas de tortura.

"Ao passo que o modelo ficava mais detalhado, as testemunhas podiam se localizar virtualmente dentro dele, experienciando os espaços no nível do observador e se aproximando dos elementos que os constituem. Esse modelo tornou as testemunhas participantes ativas no processo de reconstrução. 

Cortesia de Forensic Architecture

Quando encarcerados em Saydnaya, o som se convertia em uma ferramenta dos prisioneiros para compreender o ambiente, devido à falta de luz natural e ao fato de estarem constantemente vendados. Além disso, falar ou fazer barulhos é proibido, mesmo dentro das celas ou quando são espancados. Consequentemente, os prisioneiros se tornam sensíveis aos sons ambientes, que podem ser unidos para reconstruir a arquitetura do edifício.

O investigador de áudio Lawrence Abu Hamdan utilizou modelagem com eco e reverberação para ajudar a confirmar as dimensões de espaços como as celas, corredores e escadarias, a partir de sons como encanamentos pingando ou outros prisioneiros sendo torturados.

Por terem passado por eventos traumáticos, o projeto reconhece que a memória dos sobreviventes pode apresentar equívocos. "Nós cruzamos as referências de espaço e som de diferentes testemunhas para construir um modelo geral do edifício. Quando identificamos potenciais equívocos ou contradições entre diferentes testemunhas, buscamos cuidadosamente resolver elas, mas também modelamos o que sabíamos serem divergências. Erros, contradições e lacunas são ricas de informações pois contêm a experiência subjetiva de um detento e sua condição mental. Tais erros poderiam ser considerados evidências por si só."

"O que estamos tentando fazer é construir a história desta prisão e dar voz a todas as pessoas que ainda estão lá, porque não é algo que está acabado", explica Christina Varvia, coordenadora de projeto na Forensic Architecture.

Cortesia de Forensic Architecture

Com sede na Universidade de Londres, Forensic Architecture é uma agência de investigação que "realiza pesquisas avançadas de arquitetura e mídia em nome dos procuradores internacionais, organizações de direitos humanos, bem como grupos de justiça políticos e ambientais."

Na Bienal de Veneza 2016, Forensic Architecture está apresentando partes de quatro projetos recentes, incluindo uma micro-análise dos efeitos de um ataque de drone a uma ruína em Miranshah, Paquistão, e um estudo urbano da cidade de Rafah, em Gaza, devastada pela guerra.

O modelo de Saydnaya está disponível em inglês e árabe aqui.

Saiba mais sobre o projeto aqui.

Via Forensic Architecture.

Sobre este autor
Cita: Santos, Sabrina. "Forensic Architecture reconstrói digitalmente uma prisão síria a partir da memória de sobreviventes" [Forensic Architecture Digitally Reconstruct Secret Syrian Torture Prison from the Memories of Survivors] 08 Set 2016. ArchDaily Brasil. (Trad. Baratto, Romullo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/794782/forensic-architecture-reconstroi-digitalmente-uma-prisao-siria-a-partir-da-memoria-de-sobreviventes> ISSN 0719-8906

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