Há um mês, o Brasil perdia um de seus patrimônios mais antigos e representativos. Destruído por um incêndio que apagou mais de 200 anos da história arquitetônica do Paço de São Cristóvão, edifício que serviu de residência da família real, e reduziu a pó milhares de itens do seu acervo (muitos dos quais únicos no mundo), o Museu Nacional tenta se reerguer após a tragédia.
Diversas instituições têm se manifestado e iniciativas sido realizadas neste sentido, mas o início das obras emergenciais para contenção, limpeza e proteção da estrutura remanescente no último dia 21 de setembro é, sem dúvida, uma das mais emblemáticas neste sentido – até mesmo pela agilidade com que foi realizada, diferentemente do que ocorreu com outras edificações históricas que já passaram por sinistros pelo país.
Contratada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para executar esta primeira etapa das obras de reconstrução do museu após seleção pública, possível a partir da liberação de R$ 8,9 milhões pelo Ministério da Educação (MEC), a Concrejato Engenharia trabalha no local desde aquela data e conta que os trabalhos devem ser concluídos dentro de seis meses, conforme prevê a legislação.
“Será um trabalho muito criterioso e atuaremos em conjunto com a equipe de arqueologia da UFRJ e com a Polícia Federal [PF]. Antes de serem retirados do local, todos os materiais obrigatoriamente passarão por uma inspeção prévia dos arqueólogos para se ter a certeza do que é possível ou não resgatar. Paredes ruídas, telhas, elementos expositivos e outros materiais serão submetidos a análises acerca da sua importância e valor histórico”, destaca em entrevista exclusiva a HAUS Maria Aparecida Soukef Nasser, diretora de Operações da Concrejato Engenharia, empresa que também é a responsável pelas obras emergenciais, de restauro e reconstrução do Museu da Língua Portuguesa (MLP), em São Paulo, que teve sua estrutura destruída por um incêndio, em 2015.
A obra
Além da limpeza do local, estão previstas para esta primeira etapa a proteção e o escoramento da estrutura remanescente e a instalação de uma cobertura provisória (com estrutura e telhas metálicas) com fixação independente em relação ao remanescente do Museu Nacional.
"Os elementos da edificação serão separados e catalogados, de forma a possibilitar o resgate futuro da volumetria e dos elementos decorativos. Essa primeira etapa da obra é fundamental para viabilizar os estudos técnicos no local voltados à reconstrução do museu, e os critérios que serão adotados para os projetos”, avalia a diretora de Operações.
Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1938, o Paço de São Cristóvão foi construído no início do século 19 pelo comerciante luso-libanês Elie Antun Lubbus (Elias Antônio Lopes, nome aportuguesado) e, em 1º de janeiro de 1809, passou a ser a residência oficial de D. João.
Erguido em arquitetura eclética, contava com três pavimentos e área útil de 13,6 mil m², que contemplava 122 salas. Cerca de 80% desta estrutura foi destruída pelo fogo, como avaliou à reportagem de HAUS o engenheiro Luís André Moreira Alves, coordenador técnico da Defesa Civil do município do Rio de Janeiro, que vistoriou o imóvel na manhã seguinte à da data do incêndio.
Reconstrução
Logo após a tragédia, a vice-diretora do Museu Nacional, Cristiana Serejo, chegou a estimar em R$ 15 milhões o orçamento necessário para a reconstrução da edificação. Agora, no entanto, a direção do museu trabalha para incluir no Orçamento da União de 2019 uma previsão de R$ 50 milhões a R$ 100 milhões para dar início à reconstrução do Paço de São Cristóvão.
Em entrevista coletiva no dia 2 de outubro, o diretor do museu, Alexander Kellner, disse que os recursos seriam o primeiro passo para que o museu possa ser reaberto em no mínimo três anos. Em entrevista ao “O Globo”, ele acrescentou ainda que a fachada e a parte externa do Museu Nacional serão mantidos na reconstrução, mas que o interior do prédio será outro, baseado em materiais com baixa emissão de carbono, que demandem menos energia e “sejam mais amigáveis ao meio ambiente”.
Tal orçamento, no entanto, refere-se somente a parte estrutural da edificação, uma vez que as peças do acervo perdidas no incêndio dificilmente poderão ser recuperadas ou repostas.
Para apoiar o Brasil neste sentido, o governo de Portugal manifestou intenção de realizar um levantamento do acervo disponível no país que possa, no futuro, ser transferidos para o Museu Nacional. O anúncio foi realizado por Luís Filipe Castro Mendes, ministro da Cultura de Portugal, durante reunião com o ministro da Educação, Rossieli Soares, no último dia 14 de setembro, conforme nota divulgada pelo Ministério da Educação (MEC).
Ainda segundo a pasta, na ocasião a diretora-geral do Patrimônio Cultural de Portugal, Paula Araújo da Silva, comentou que já vinha mantendo contato com a direção do Iphan para alinhamento de ações conjuntas entre os dois países.
Procurado pela reportagem, o Iphan confirmou por meio de nota que, desde 2017, “firmou acordo de cooperação bilateral com a Direção-Geral do Património Cultural de Portugal, com o propósito de promover o intercâmbio de especialistas e desenvolver projetos de promoção da herança cultural comum entre os países”. O texto destaca, no entanto, que até o momento a instituição não recebeu nenhum contato do governo de Portugal para tratar especificamente sobre a reconstrução do Museu Nacional.
Via Gazeta do Povo.