- Ano: 2016
Descrição enviada pela equipe de projeto. A casa, de Aura, Wilder, Moisés e Ángela (a família Marchán) responde a duas realidades: o doméstico-produtivo e o desenvolvimento emergente da periferia da cidade, frente ao qual se propõe como alternativa. Ela é resultado do inventário de verificações do programa "Residências em Bairros Produtivos" (Viviendas Barriales Productivas), que explora as condições da habitação, ao mesmo tempo que resolve a precariedade resultante da relação entre necessidade e determinação que se apresenta nestes contextos em função da casa.
O projeto atente à atividade produtiva em escala familiar, entendida como recurso local para a produção de alimentos, conhecimento, manufatura e produtos sociais em geral, associada à residência como núcleo produtivo, que não se coloca enquanto uma novidade, mas como uma realidade que está cada vez mais presente nas cidades. Residências que suportam e combinam diversas atividades. Empreendimentos integrados à lógica doméstica, agrupando muitas realidades diversas e atividades do cotidiano.
Em função disso, o espaço doméstico é capaz de dividir-se em um conjunto de fragmentos espaciais e tecidos sociais que se transformam no tempo e que são os que, por associação, configuram "o entorno da domesticidade". Isso significa que não se desenvolve unicamente dentro dos limites de uma residência estável, em uma realidade autônoma e desvinculada do contexto em que se encontra. No caso específico de Aura Marchán, esse entorno doméstico se nutre a partir e com sua cozinha, em uma economia de bairro não monetarizada, junto a um grupo de vizinhos, das cinco regiões do bairro que conformam a comunidade, que cotidianamente se alimentam em sua casa e que, através de um modelo associativo de cooperação e troca de insumos cultivados e/ou adquiridos, se apoiam para manter suas condições de vida. Esse tipo de vida doméstica e micropolítica econômica possibilita, estimula e desenvolve vínculos produtivos e também afetivos.
Por outro lado, a proposta de residência é uma soma de ações, saberes, procedimentos e tecnologias locais. Um dispositivo auto-construído de forma colaborativa entre 14 vizinhos e 3 visitantes, em uma cooperativa de trabalho temporário que administra socialmente o conhecimento, com o alcance e a capacidade de adaptar-se à realidade de condições já pré-determinadas, tanto do ponto de vista técnico (fabricação molhada-seca, protocolos administrativos, disponibilidades materiais e econômicas, condições operacionais), como comunitário (os casos prioritários, suas demandas e necessidades, desejos e expectativas individuais e da organização coletiva), características da residência de periferia (o pátio, o solo de cultivo), mas também características próprias do contexto (terrenos irregulares, topografia acidentada) onde se situa.
A nova casa, como substituição da anterior, entende as preexistências e reconfigura noções de implantação e construção. Retoma a lógica da varanda aplicada agora em diversos níveis, gerando um novo solo útil no mesmo espaço disponível, repensando os protocolos de ocupação do solo para futuros empreendimentos na região, em acordo com os vizinhos. Se constrói um elemento em altura, liberando este novo solo para sua incorporação ao interior, o qual é nutrido por irrigação passiva e retoma as experiências locais de horta-jardim cultivável e comestível, ao mesmo tempo que incorpora um pátio ao interior da casa. Os ambientes para descanso e repouso se localizam nos pavimentos superiores ao de cozinha-sala de refeições, que, por sua vez, está mais próximo da rua. A configuração dos espaços se da em módulos que permitem a progressividade em futuras ampliações (que acontecerão) como resultado de um projeto aberto. A partir dessa ideia é possível criar novas 10 variações da casa.
A casa, e seu conjunto de condições, nos permitiu propor uma resolução singular e inédita, uma resposta alinhada aos desenvolvimento de novos sistemas de entornos domésticos e habitações em contextos emergentes, com a intenção de explorar modelos que sejam possíveis inclusive em momentos de crise, ao mesmo tempo que se apresentam como referências de fácil reinterpretação e/ou reprodução para a comunidade e seus demais habitantes.
A casa, e seu conjunto de condições, responde a realidades expostas, e propõe perguntas abertas diante da realidade de qualquer cidade: Que tipos de domesticidade(s) acontecem hoje na cidade? Que formas de sociabilidade estão sendo desenvolvidas? Qual é o potencial por trás destas realidades? Quais andaimes, não apenas tipológicos, mas também sociais e econômicos, poderiam potencialmente sugerir novos ou outros modelos sociais, de bairro, de urbanismo?