A qualidade das ruas e calçadas é um tópico bastante debatido no Brasil e a pandemia de coronavírus acrescentou mais um fator de complexidade ao tema – a saúde pública —, fazendo-nos questionar se é, efetivamente, possível para o pedestre praticar o distanciamento social. A inquietação levou o estudante de arquitetura Conrado Freire a desenvolver um mapa da largura das calçadas de São Paulo.
Adaptado do projeto Sidewalk Widths NYC de Meli Harvey, sobre as calçadas de Nova Iorque, o Largura do Passeio toma os dados das calçadas disponibilizados pelo portal GeoSampa e sintetiza de forma visual informações sobre os passeios de São Paulo que não são acessíveis ao público em geral. A partir dos códigos abertos disponibilizados por Harvey, que já foram também adaptados para cidades como Toronto, Washington, Berlim e Milão, Freire cria uma cartografia visual que informa aquilo que é apenas sentido pelos pedestres ao se deslocarem no espaço urbano de São Paulo.
O mapa, além de oferecer uma base de dados sobre a largura dos passeios na capital, apresenta uma classificação em níveis de dificuldade de realização do distanciamento social, considerando 1,9 metros a largura mínima necessária para o distanciamento de 1,5 metros recomendados pela OMS.
Na aba de gráficos é possível ter acesso às informações específicas de cada um dos 96 distritos, o que possibilita a comparação da quantidade de passeios adequados ou não entre as localidades. Ao clicar sobre o gráfico, é possível filtrar os níveis de dificuldade do mapa, permitindo uma visualização clara dos contrastes entre a presença dos níveis de adequação nas diversas áreas da cidade.
A partir dos dados gerados no projeto percebe-se que dentre os 26 mil km de calçadas da cidade, cerca de 72% apresentam condições precárias para o distanciamento social. Fato que marca uma imensa complicação de ordem sanitária para a cidade mais populosa do Brasil. É importante ressaltar que os dados não levam em consideração outros fatores que também prejudicam a circulação dos pedestres, como a presença de árvores, postes e degraus, a qualidade da pavimentação e o fluxo de pessoas. Imagina-se que caso estes fatores fossem considerados, o impacto seria muito maior. – Conrado Freire, autor do projeto Largura do Passeio
Como se poderia prever, os distritos que apresentam a maior quantidade de calçadas inadequadas são os mais periféricos, aspecto explicado tanto por terem se originado, em sua maioria, de loteamentos irregulares e autoconstrução, quanto por não estarem no centro dos investimentos. Exemplos disso são o Distrito de Marsilac, que apresenta 93% de suas calçadas com largura inferior a 2,7 metros, e o Distrito de José Bonifácio, cujas únicas ruas com largura acima de 5,5m se localizam nos conjuntos habitacionais de interesse social.
Em contraponto, os bairros mais centrais frutos de um planejamento mais estruturado apresentam as maiores porcentagens de passeios com larguras acima de 4,5 metros, com destaque para a Sé, República e Jardim paulista. Porém, mesmo apresentando larguras mais generosas nas calçadas, esses também são os distritos com a maior circulação de pedestres, o que acaba dificultando a prática do distanciamento social.
O autor afirma que o projeto não tem como objetivo servir de guia para as ruas que devem ou não ser frequentadas pela população – tal decisão exigiria outras informações não englobadas por esta cartografia –, mas também destaca que os dados fornecidos pelo mapa demonstram claramente a enorme necessidade de medidas públicas que possibilitem o distanciamento social adequado nas calçadas de São Paulo, sobretudo nesse período de abertura gradual dos comércios e serviços.
Acesse o mapa e percorra os passeios de São Paulo aqui.
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