“Aprendendo com Las Vegas” é um dos mais importantes livros da história e da crítica em arquitetura e urbanismo. Seus três autores - Robert Venturi, Denise Scott Brown e Steven Izenour - trouxeram uma curiosa abordagem a respeito de uma cidade que viu seu crescimento acontecer em prol do jogo de azar e da associação perigosa com a máfia. Las Vegas, cidade repleta de letreiros, estacionamentos e cassinos, foi a referência para os três autores, em um projeto de pesquisa da Universidade de Yale. O objetivo era estudar o desenvolvimento de uma nova tipologia urbana, a strip, em busca de um novo ponto de vista sobre a cidade e a arquitetura.
Publicado no ano de 1972, o livro traz uma discussão urbana fruto de seu tempo. Na sua primeira parte, análises urbanas são realizadas, influenciadas por autores como Aldo Rossi, Kevin Lynch e Gordon Cullen, já que algumas ferramentas utilizadas nos mapeamentos foram amplamente apresentadas por eles em publicações no período, como “A Arquitetura da Cidade”, “A Imagem da Cidade” e “Paisagem Urbana”. Bruno Sarmento, arquiteto e urbanista convidado do episódio, relata não só os mapas criados pelos autores, mas também a comparação direta que os mesmos fazem com o mapa de Roma do século XVIII feito por Nolli, mais conhecido como “mapas figura e fundo”. Dessa forma fica nítida uma primeira tentativa de comparação entre morfologias de distintas de cidades, bem como a busca por experimentações a fim de tecer críticas à um projeto de cidade total modernista. Nada melhor que buscar em sua antítese, a strip, argumentos para a batalha.
Uma questão importante abordada no episódio é a escolha por um modelo peculiar de cidade: Las Vegas é atravessada pela Rota 91, rodovia americana das mais importantes. O livro compara a strip (rodovia) com a main street (rua principal), reforçando a presença do automóvel como meio de fruição da paisagem, e reconhecendo que é o meio pelo qual se percebe e vive parte dessa cidade. Neste caso, os letreiros são elementos fundamentais no meio urbano, exercendo um papel importante na arquitetura, a retomada do simbólico, defendida pelos autores e utilizada para azeitar a crítica iniciada em outra publicação conhecida, “Complexidade e Contradição em Arquitetura”.
Na parte dois, o livro traz o tão famoso desenho do “pato” e do “galpão decorado”. Segundo os autores, a arquitetura de Las Vegas enaltece o simbolismo na arquitetura, já que esse foi um aspecto negligenciado pelo Movimento Moderno. O galpão decorado seria a forma mais eficiente de representar de forma literal seu uso, resgatando o valor do programa e através dos novos “ornamentos” resgatam elementos históricos e simbólicos presentes no imaginário dos usuários, do neon ao templo grego. Já o “pato” simboliza toda elucubração modernista, que substitui os valores culturais pra mera articulação do objeto e seus discursos de espacialidades, o “pato” é ineficiente e rígido, não possui a habilidade de se adaptar às reais demandas da arquitetura, serve apenas ao formalismos presente na doutrina moderna.
“Aprendendo com Las Vegas” é uma das obras mais significativas do chamado “pós-modernismo” cunhado e defendido por Charles Jencks no campo da arquitetura e do urbanismo. Os autores, em diversas entrevistas e relatos, deixem claro que não faziam parte desse “movimento”, não tinham e nem imaginavam as repercussões e desdobramentos da sua obra, esta, curiosamente aceita de forma reticente no meio. É notória a sua marca e sua influência para outros autores contemporâneos, como Rem Koolhaas e Bjarke Ingels, obras como “Nova York Delirante” e “Yes is More” talvez não teriam sido produzidas se “Aprendendo com Las Vegas não existisse. O conceito de bigness já estava lá, e a cidade incremental instituiu a metáfora da organicidade no desenvolvimento das arquiteturas e do urbano, assim como a importância do ordinário para compreensão da verdadeira totalidade urbana.
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Texto por Adilson Amaral e Raphael Rodrigues