Em celebração ao aniversário de 467 anos de São Paulo, a artista urbana Criola presenteou o bairro da Liberdade com um enorme mural. Produzida com a participação do Instagrafite, a obra contou com financiamento da edição especial do Museu de Arte de Rua (MAR) e sugere uma profunda reflexão e resgate de uma longa história como um reduto de resistência preta na cidade, a começar pelo nome do bairro.
"Liberdade. Liberdade. Liberdade." Essas foram as palavras proferidas por uma multidão de pessoas pretes ao verem a corda que enforcava o soldado negro Chaguinhas misteriosamente arrebentar três vezes no seu pescoço. Além de abrigar a forca nos séculos XVIII e XIX, o bairro que hoje tem o status de maior reduto nipônico do mundo fora do Japão era o local onde ficava o Pelourinho, tronco em que os negros escravizados eram castigados. Esse bairro também recebeu as primeiras casas de pessoas pretas alforriadas.
A memória negra das cidades sofreu e sofre um apagamento. Debaixo dos asfaltos das ruas onde corremos distraídos, preocupados com o compromisso de cada dia, existem histórias que precisam ser resgatas e contadas. Memórias apagadas ainda hoje por um sistema notadamente colonialista e que precisam ressurgir nas cidades para que aprofundemos a reflexão de que não existirá futuro enquanto não adentrarmos de maneira crítica na discussão sobre a história do nosso país. Esse também é o papel da arte e o meu enquanto artivista. Vivemos uma disputa de narrativas e obviamente a memória daqueles povos que exercem mais poder econômico e político é mais valorizada. Dito isso afirmo mais uma vez: não existirá futuro enquanto não honrarmos quem construiu o chão que hoje pisamos, distraídos correndo de casa pro trabalho num looping eterno. – Criola.
“Precisamos ir além do pensamento da arte urbana apenas como embelezamento das cidades. Ela é sim uma ferramenta poderosa de revitalização dos espaços, mas o aprofundamento das temáticas pode ser tão poderoso quanto. O papel da nossa curadoria, na arte pública, é justamente cruzar o talento dos artistas com localizações que potencializem suas narrativas, contribuindo na reparação de histórias apagadas e no diálogo entre mural e público. O artista é um mensageiro, um canal, e sua arte um portal para novas visões de mundo”, divide Marina Bortoluzzi, curadora e cofundadora do Instagrafite.
A empena fica localizada na Rua Vergueiro, 54, no bairro Liberdade, com pintura da artista Criola e produção e gerenciamento de projeto de Instagrafite. A equipe foi composta por Marcelo Pimentel, Marina Bortoluzzi, Brenda Silva Ramos, Fernanda Sampaio, Fernanda Venturini. Contribuíram com a pintura Marcelo Salatiel, Yuri de Lima Rossi (Oxil), Felipe Borges e Caio Felipe de Andrade.