O mais recente episódio do Arquicast traz como convidada Gabriela de Matos, eleita em 2020 “Arquiteta do Ano” pelo Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento do Rio de Janeiro, e é uma das palestrantes convidadas para o 27 Congresso Mundial de Arquitetos, promovido pela UIA2021 RIO.
Formada em Arquitetura e Urbanismo pela PUC-MG, especialista em Sustentabilidade e Gestão do Ambiente Construído pela UFMG e cursando o mestrado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas na USP, a jovem arquiteta se destacou pelo importante trabalho à frente do projeto Arquitetas Negras, que desde 2018 mapeia a produção arquitetônica de mulheres negras no Brasil. Reforçando sua dedicação ao tema da igualdade racial e de gênero, ela ainda assina o editorial do livro Arquitetas Negras vol.1, vencedor do prêmio IAB-SP na categoria Publicações de Arquitetura, em 2019. Como se não bastasse, a arquiteta acumula o cargo de vice-presidente do IAB-SP na atual gestão e é sócia-fundadora do escritório Brandão de Matos, desenvolvendo projetos e consultorias desde 2014.
A busca por uma formação mais humanista e inclusiva tornou-se um objetivo mais claro para a arquiteta após a conclusão de sua graduação, na prestigiada faculdade particular da capital mineira. Foi o exemplo de pessoas que passou a conviver nos anos iniciais como recém-formada, em grupos voltados a valorização da cultura negra, que, talvez indiretamente, tenha assimilado a necessidade de assumir a luta por igualdade racial como um propósito também profissional. Não que já não fosse consciente do racismo. Como ela mesma aponta, todo negro nasce sabendo o que é ser discriminado. Mas nesses grupos e em sua produção cultural encontrou uma oportunidade de exercitar a voz que não teve na graduação.
Foi quando percebeu o ambiente “embranquecido”, em suas palavras, em que estudava, ainda que não tivesse sofrido diretamente nenhum tipo de preconceito por parte dos colegas estudantes e dos professores. Esta parece ser uma questão fundamental nessa discussão: ao nos acostumarmos à ausência de diversidade social, passamos a não enxergar os mecanismos de exclusão que sustentam, algumas vezes não intencionalmente, os ambientes que frequentamos e a toda nossa formação.
A arquitetura, neste sentido, é considerada um campo profissional elitista e reprodutor de uma cultura de distinção, como se determinados perfis fossem mais habilitados a exercer a atividade do que outros. Tanto que Arquitetura e Urbanismo é um dos cursos com menor presença de negros, perdendo apenas para Medicina.
O que ocorre é que essa habilidade “natural” provém da valorização de um conhecimento intelectual pouco acessível a camadas sociais mais pobres ou culturalmente distantes das referências teóricas e projetuais que autorizam esse saber. Ou seja, a manutenção da cultura dominante sobre o fazer arquitetônico exclui, de partida, a contribuição e a produção plural de grupos sociais vulneráveis dentro da atual realidade urbana brasileira, o que significa menos espaços para negros, mulheres e classes sociais mais baixas.
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Texto por Aline Cruz.