Resgatar o invisível, mergulhar em uma memória apagada da cidade e caminhar sobre as águas. Por mais surpreendente que seja, o mundo ainda não acabou. Mas quem transita por Belo Horizonte, passando pelo movimentado cruzamento da Avenida Afonso Pena com a Avenida Brasil, poderá precisar o local onde ele acaba. O “Acaba-Mundo” é um córrego que cruzava o arraial do Curral del Rei, este sítio para onde, em 1897, transferiu-se a capital de Minas Gerais.
Onde antes corria apenas água, hoje correm ônibus lotados, carros e motoqueiros apressados. Quem sabe uma pessoa empurrando um carrinho de bebê, quem sabe um pedestre ou uma criança aprendendo a ler, desvie seu olhar do Tiradentes em bronze que dá nome àquela praça e se atente a uma placa. O “Acaba-Mundo” corria sobre o Curral del Rei e ainda corre, hoje, abaixo do asfalto, dos veículos e dos pés que caminham pelo centro de Belo Horizonte. Diferente da estátua do mártir da Inconfidência, “Sobre o Rio” é um outro tipo de monumento a esta cidade.
Sobre o Rio
A obra Sobre o Rio compõe a trajetória de Isabela Prado que, desde 2006, desenvolve diferentes proposições artísticas sobre a presença hidrográfica na cidade. O conjunto destes trabalhos compõe uma pesquisa mais ampla chamada Entre rios e ruas, que nos convida a refletir criticamente, a partir de um olhar sensível, para a dinâmica hídrica e hidrográfica na cidade. A produção de Isabela aponta para os desdobramentos afetivos e históricos das relações estabelecidas entre ambiente e habitantes do espaço urbano.
Por meio de um projeto aprovado na Lei Municipal de Incentivo à Cultura em 2018, foram instaladas 230 placas de esquina no perímetro da Avenida do Contorno (núcleo do traçado original de Belo Horizonte), que indicam a presença, ainda que invisibilizada, de córregos canalizados que percorrem a cidade e que compõem a Bacia do Ribeirão Arrudas: Leitão, Serra, Acaba-Mundo, Mendonça, Zoológico, Barro Preto e Afluente Serra.
“Sobre o Rio tem um caráter público, pois é executado nas ruas. Dá visibilidade a algo que está invisível e reinsere os córregos como elemento da paisagem da cidade. A partir do momento em que a presença dos córregos é identificada, relembrada, por meio das placas de sinalização, sua existência passa a ser algo natural, reconhecida pelos cidadãos que transitam em Belo Horizonte. O trabalho promove, assim, uma nova relação entre a cidade e seus habitantes, engajando toda a sociedade no (re)conhecimento deste corpo d’água que habita a cidade.” (Isabela Prado)
A campanha
Desde o dia 16 de novembro, está no ar uma campanha de financiamento coletivo que visa a produção de uma publicação impressa, bilíngue (português e inglês), de formato robusto, que apresentará os processos de criação, reflexão e diferentes registros da obra “Sobre o Rio”, além de reunir contribuições de autores especializados em áreas vinculadas ao projeto.
A meta da campanha é buscar apoiadores para a viabilizar a produção gráfica e impressão de uma tiragem de 1.000 exemplares do livro com um bom acabamento e que apresente de forma generosa os processos e reflexões disparados por “Sobre o Rio”. Além do próprio livro, as recompensas da campanha incluem outras obras de Isabela, como serigrafias, o livro “Lição: se esta rua fosse um rio” e, até mesmo, um modelo original em aço da placa do córrego “Acaba-Mundo”.
O processo de montagem editorial da publicação, etapa que está sendo conduzida pela artista gráfica e editora Clarice G Lacerda, irá conjugar o conteúdo textual com recortes da trajetória artística de Isabela Prado que deságua em “Sobre o Rio”, seu trabalho mais recente. Além de registros do processo, serão publicados textos inéditos de Michele Arroyo, Alessandro Borsagli, Josué Mattos, Roberto Luís Monte-Mór e Guilherme Wisnik, além de uma entrevista realizada pelos curadores Clarissa Diniz e Josué Mattos com a artista Isabela Prado.
Sobre a artista
Isabela Prado (Belo Horizonte, 1973) é artista visual e professora da Escola de Belas Artes da UFMG. Graduada em Artes pela UFMG e Mestre em Artes pela Indiana University, EUA, participou de vários programas de residência artística em diversos países (Argentina, Brasil, EUA, Jordânia, Palestina) e de exposições individuais e coletivas no Brasil e no exterior. Em 2011, foi contemplada com o Prêmio Funarte de Arte Contemporânea, com o projeto Entre Rios e Ruas, que deu origem ao livro Lição: se essa rua fosse um rio (2016). Artista finalista do Prêmio Marcantonio Vilaça para as Artes Plásticas 2019.
Saibra mais sobre o projeto nas redes sociais:
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