Com objetivo de conhecer os arquitetos, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa de referência, Sara Nunes, da produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, lançou o podcast No País dos Arquitectos, em que conversa com importantes nomes da arquitetura portuguesa contemporânea. No primeiro episódio da quarta temporada, Sara conversa com o arquiteto Álvaro Siza Vieira, sobre o projeto de ampliação do Museu de Arte Contemporânea de Serralves.
Ouça a entrevista completa e leia parte da transcrição da conversa, a seguir.
Sara Nunes - Estamos muito entusiasmados com esta conversa porque o Álvaro Siza é um óptimo conversador, muito generoso na partilha das suas histórias e com óptimo sentido de humor! E apesar de já ter dado inúmeras entrevistas, a cada entrevista ou conversa aprende-se sempre algo novo. É quase um pouco como as suas obras, em que apesar de terem sempre a sua identidade, o arquitecto, a cada obra, parece que se reinventa. Perguntava-lhe se isso é uma das coisas que está na sua cabeça quando projecta - essa vontade de se superar a cada projecto, vontade de fazer melhor e de se reinventar.
Álvaro Siza Vieira - Não. Isso está no programa em causa e no sítio onde é construído. A diferença... essa diferença não é um exercício interior, uma vontade, mas é uma resposta aos problemas que são postos e onde.
SN - Exacto! Tem sempre essa preocupação com o lugar, não é? E sempre a preocupação em falar com as pessoas... mais do que esta ideia de se reinventar. Ou seja, o lugar é que lhe dá as respostas quando faz o projecto, é isso?
ASV - Sim, necessariamente, por muitas razões: pelo que ele é, como é que ele aparece na cidade ou na paisagem e pelo sítio onde é, incluindo condicionamentos que existem, planos, apreciação por parte de uma Câmara Municipal. Aliás, de uma Câmara Municipal e não só... de muitos organismos...
SN - De várias condicionantes, não é?
ASV - Exacto.
SN - O projecto sobre o qual vamos falar hoje é a ampliação do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, que está neste momento em construção... e o arquitecto Álvaro Siza já tem uma longa história com Serralves! Realizou o Museu de Arte Contemporânea, que agora vai ampliar, reabilitou a Casa de Serralves, fez a Casa do Cinema Manoel de Oliveira. E pergunto-lhe se depois da inauguração do Museu de Arte Contemporânea – que já foi há 23 anos... e depois de tantas idas a Serralves que seguramente que fez até por causa destas obras todas que foi realizando ao longo do tempo – houve alguma exposição que o marcou.
ASV - Várias. Serralves fez exposições muito boas. Estou-me a lembrar do Andy Warhol, do Rauschenberg. Fez grandes exposições! E depois de outros... da Paula Rego, entre os portugueses, mas muitos outros. Agora de repente...
SN - Lembra-se desses, não é?
ASV - Não me lembro dos nomes porque são muitos.
SN - E estava-me a lembrar que não só teve oportunidade de ver essas exposições, mas se calhar esta ligação ao museu permitiu-lhe ter uma proximidade com esses artistas mais de perto.
ASV - Sim, sim. Conheci o Kapoor, por exemplo.
SN - Ah, o Kapoor! Sim, o Anish Kapoor!
ASV - É um grande escultor... Bem... e muitos outros! Não quero dizer mais nomes senão vou ser injusto, esquecendo grandes nomes que passaram por Serralves.
SN - Outra oportunidade que teve provavelmente de estar muito de perto foi do Manoel de Oliveira, não é? Que memórias é que guarda do realizador?
ASV - Óptima memória e longa memória! Com mais de cem anos – não sei exactamente com que idade – fez um filme aqui no Porto, mas estava com alguma dificuldade motora... de maneira que dirigiu o filme no jardim, em frente à casa... numa cadeira de rodas, mas com todo o entusiasmo... estava com receio que o entusiasmo era tal que a cadeira de rodas começasse a voar!
SN - (risos)
ASV - Mas dessa vez não voou! Era uma pessoa com uma vitalidade e um amor à vida à prova de bala!
SN - E contagiava muitas pessoas, não é? Essa energia que ele tinha...
ASV - Sim, sim!
SN - Por isso é que ele fez tantos filmes e até tão tarde, não é?
ASV - Embora tivesse começado... não começou tarde, mas a grande produção é tardia!
SN - Por acaso uma coisa que eu acho curiosa no Museu de Arte Contemporânea é que é muito cinematográfico. Entra-se no edifício como se houvesse quase um longo travelling, desde a entrada até à zona da bilheteira. Depois na zona da bilheteira parece que há uma paragem e quase que ali fazíamos um – se fosse na linguagem do cinema – plano fixo. Aí já teríamos oportunidade para, eventualmente, até fazer um diálogo entre as personagens e depois na exposição passamos para um segundo acto. E perguntava-lhe se esta ideia de... não só cinematográfica, mas esta ideia de movimento que os seus edifícios têm muito... parece que o arquitecto pensa no movimento que as pessoas vão ter no edifício.
ASV - Claro! O percurso é um dos meios de concretizar o projecto. E tem muito a ver... e é uma prova da grande afinidade que há entre as diferentes artes, neste caso com o cinema. Repare que o cineasta pega na câmara, faz um grande plano, a seguir passa um longo travelling, depois há uma pausa, depois começa noutro ritmo e tal... isso tem a ver ou é semelhante ao que acontece na arquitectura.
Ouça a entrevista completa aqui e reveja, também, a terceira temporada do podcast No País dos Arquitectos:
- João Maria Trindade
- António Cerejeira Fontes
- Studio MK27
- AND-RÉ
- Adriana Floret
- Pedra Líquida
- spaceworkers
- atelier extrastudio
- Sofia Couto e Sérgio Antunes
- Gonçalo Byrne
Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e Melanie Alves e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.