Rafael Altamirano

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O cinema, como expressão artística, tem sido sempre uma tela em branco onde ficam registrados imaginários de uma grande criatividade assim como as visões particulares de grandes diretores. Tem sido também, de maneira indireta, uma testemunha dos sentimentos da sociedade dentro de uma determinada época. 

Para a arquitetura, a década de 70 supos a morte do movimento moderno, um ponto de ruptura que permitiu a uma nova geração de arquitetos desenvolver suas próprias linguagens, as quais começaram a dominar a cena mundial na década seguinte. Para a sociedade do seu tempo este feito teve uma aceitação ambivalente pois, para alguns significava uma lufada de ar fresco, enquanto para outros uma perda dos valores tradicionais, trocando-os por novos que somente poucos entendiam a profundidade. 

Cinema e Arquitetura: "O Destino de Júpiter"

"O Destino de Júpiter" representa para a carreira dos seus diretores, os irmãos Wachowski, um momento chave na sua cinematografia. Por um lado é o seu momento mais importante quanto a fotografia: a consagração do imaginário de ficção científica dos comics books que sempre sonharam. Ninguém questiona a espetacularidade dos seus cenários ou a criatividade das suas invenções. Mas também, por outro lado, é o seu ponto mais baixo como narradores de histórias. Seus discursos não convencem, seus personagens não são apaixonantes. A crítica e o público os detestam, pois se sentem enganados por um produto que somente causa decepção.

Cinema e Arquitetura: "John Carter: Entre dois mundos" (2012)

A história de "John Carter" remonta ao tempo dos livros Pulp. Suas aventuras foram publicadas pela primeira vez na forma de capítulos separados durante o ano de 1911 e mais tarde, como um livro independente do qual surgiriam uma série de sequências. Apesar do seu caráter claramente juvenil, sua imaginativa inspiraria um grande número de figuras destacáveis do século XX, como Carl Sagan e Ray Bradbury, assim como uma referência clara a personagens como Buck Rogers, Flahs Gordon, Superman e o universo de Star Wars.

Levá-lo à tela do cinema 100 anos depois da sua primeira aparição foi um grande ato de fé. Como personagem, suas bases já haviam sido exploradas inúmeras vezes e por outro lado, seus elementos fantasiosos eram claramente anacrônicos dentro de uma época contemporânea, onde os avanços tecnológicos acontecem a passos de gigante.

Cinema e Arquitetura: "Avatar"

Tudo que sobe tem que descer. Para aquelas obras que foram muito alto, tornando-se um fenômeno na história do cinema, parece sempre que ao redor do seu êxito existe uma corrente negativa cujo único propósito é desprestigiar todas suas qualidades. O diretor James Cameron já passou por isso com várias de suas obras, com 'Titanic' (1997), experimentou um forte repúdio por parte do público e inclusive por parte de outros diretores do seu meio, onde - de igual maneira - apelava-se a uma história muito simplista adornada por um requinte técnico nunca antes visto.

Com “Avatar” a história se repete. Cameron é criticado como um diretor teatral, um vendedor de fumaça que por trás da vanguarda tecnológica não tem nada original para comunicar. Como apologia, é necessário compreender que seu cinema proveniente de uma carreira humilde, de um homem que se formou sozinho dentro da indústria dos efeitos especiais e cuja mentalidade sempre busca a forma mais simples de fazer com que as coisas funcionem. Cameron maquina suas histórias desde uma visão técnica, premiando o simples sobre o rebuscado, o funcional sobre o ineficaz. 

Cinema e Arquitetura: "A Viagem"

O filme "A Viagem" (Cloud Atlas) ostenta não somente ser um dos longas independentes mais caros na história do cinema, mas também em criar um número semelhante entre seguidores e difamadores, os quais raras vezes encontram um consenso nas discussões e tacham o filme como uma obra prima ou um total desastre. As seis histórias narradas durante sua longa duração atropelam-se numa montagem frenética, oferecendo-nos cenas pausadas de grande drama que permanecem na retina, assim como cortes indiscriminados que na velocidade de um trem bala não oferecem nada mais que um lembrete forçado de que todas as histórias estão interconectadas entre si.

Cinema e Arquitetura: "O Doador de Memórias"

Muito antes da literatura juvenil se tornar uma tendência cinematográfica e estabelecer uma nova onda dentro dos mundos distópicos da ficção científica, Lois Lowry publicava seu livro The Giver”, em 1993. Sua história, como muitas outras, começava com o devaneio de um mundo perfeito onde a guerra e a dor haviam sido erradicadas para, de forma gradual descobrir que aquela realidade é somente um processo mecânico, um sistema quebrado onde a humanidade está inserida. O livro recebeu uma grande quantidade de prêmios e críticas positivas, adaptando-se ao teatro e tornando-se uma leitura obrigatória para crianças. O ator Bill cosby tratou de levá-lo aos cinemas em 1994, mas finalmente seria Jeff Bridges após vários de negociações que não somente concretizara o projeto, mas que também o protagonizara.

Com uma estética polida, o filme nos transporta até uma comunidade modelo, onde todos os aspectos da vida são positivos e onde todos os personagens convivem em harmonia. De imediato, salta aos olhos a falta de cor das imagens, um mundo preto e branco mas com uma estética muito moderna e tecnológica. Esta falta de pigmento, entretanto, não interfere nos seus protagonistas, e basta uma pincelada de cor para aclarar ao espectador que o que se vê é o reflexo do que na verdade percebem os protagonistas. 

Cinema e Arquitetura: "O Predestinado"

O cinema de ficção científica caracterizou-se por regozijar a vista do espectador com ambientações deslumbrantes que vão além da simples contemplação. Filmes que envolvem viagens no tempo são especialmente complicados de se estruturar diante do espectador devido a dificuldade de criar estéticas diferentes para tempos distintos e que ao mesmo tempo mantenham uma coerência visual entre si. "O Predestinado", não somente conseguiu criar esta atmosfera como também nos oferece um passado alternativo, onde reconhecemos uma multidão de detalhes históricos mas ao mesmo tempo somos testemunhas de tecnologias e situações sociais que nunca aconteceram, mas que podem existir. 

Cinema e Arquitetura: "Ultravioleta"

Se com seu filme anterior, "Equilibrium", em 2002, o diretor Kurt Wimmer conseguiu criar - com recursos limitados - uma história coerente com uma bela estética (hoje é considerado um filme cult); sua próxima obra seria exatamente o contrário. "Ultravioleta", não somente é considerado um despropósito visual de efeitos especiais rebuscados com uma história que não causa empatia ao espectador, mas também é visto como um dos piores filmes da década, tanto para o público como para a crítica. Tão grande se tornou seu fracasso que acabou com as aspirações do seu diretor em voltar a dirigir um filme.

Cinematograficamente, o filme peca pelo já clássico "estilo sobre substância", criando cenários impactantes, ricos em detalhes futuristas e com iluminações bem posicionadas, mas que resultam em recipientes muito bonitos para uma história frenética e quase desconexa. Neste sentido, as cenas de luta, detalhadamente coreografadas, possuem o estilo narrativo próprio de um musical onde a ação segue a música mas não o desenvolvimento de um filme completo. 

Cinema e Arquitetura: "O Jogo do Exterminador"

O cinema de ficção científica contemporâneo está cheio de realidades distópicas, de diferentes visões onde a humanidade mostra seu lado mais escuro, sempre através de consequências nefastas. Esta exploração por gênero deixou de lado outros tipos de propostas mais novas e diferentes, em troca de um cinema de fórmula e repetição onde rara vez um produto se destaca por sua qualidade argumentativa e gráfica.                                         

“O Jogo do Exterminador” é um filme que não precisa de um futuro envolto dentro de uma crise para possibilitar uma reflexão e crítica dos nossos instintos mais básicos como espécie; totalmente o contrário, nos mostra que o verdadeiro inimigo da paz é a nossa obsessão visceral por ser a espécie dominante, obsessão que pode nos levar a solucionar nossos problemas de sustentabilidade, mas também a uma guerra interplanetária. 

Cinema e Arquitetura: "Sleeper" (1973)

Após a estreia de "2001: Uma Odisseia no Espaço" em 1968, o cinema de ficção científica mudou de fantasias clássicas a representações mais maduras, palpáveis e cuja temática se centraria em futuros distópicos e pessimistas, nas quais o rumo da humanidade se tornaria duvidoso. A década de 70 se caracterizou pela consolidação desta tendência, encontrando nela um meio atrativo para denunciar os males da própria sociedade moderna. Através do exagero, o cinema tornaria-se uma advertência, um chamado de atenção diante de uma sociedade apática em busca de uma alternativa no modo de vida.

Ao mesmo tempo, dentro do campo da arquitetura e do urbanismo, vivia-se um momento decisivo a respeito do movimento moderno. Atormentada por dogmas, uma nova geração de arquitetos procurava opor-se a suas regras que impunham uma retangularidade agoniante e uma limitante nos métodos de desenho que a tornavam repetitivo, chato e carente de personalidade. Esta busca formal desembocava na arquitetura pós-moderna, cujo caráter vanguardista seria representado dentro do cinema para retratar mundos futuros.

Cinema e Arquitetura: "Flash Gordon" (1980)

Os comics e o mundo do cinema, como meios gráficos, têm alimentado um ao outro ao longo do tempo, até mesmo antes da obsessão contemporânea pelo cinema de super-heróis. Um dos mais antigos é Flash Gordon, desenho animado entregue todo o domingo criado por Alex Raymond na década de 30. Influência direta dos relatos de Julio Verne e o personagem John Cartes do escritor Edgar Rice Burroughs, desenvolve dentro das suas vinhetas mundos fantásticos infestados por arquiteturas impossíveis, que nas décadas futuras se tornariam referencias claras na idade de ouro da ficção científica dentro do cinema.

As ambientações dentro do desenho animado seguiam duas claras vertentes: por um lado transportar o leitor até uma aventura claramente espacial, com tecnologias e invenções impossíveis, e por outro, evocar estruturas e paisagens terrestres históricas familiares. Com o objetivo de criar cenários exóticos e misteriosos, Alex Raymond combinou as culturas asiáticas (até então pouco conhecidas pelo mundo ocidental) com a arquitetura de vanguarda, tendo como resultado um estilo barroco porém eclético. 

Cinema e Arquitetura: "Inteligência Artificial" (2001)

A arte transcende a morte. E essa essência está muito presente dentro daquela que pode ser considerada como obra póstuma do aclamado diretor Stanley Kubrick. Mesmo considerando que seu desenvolvimento foi levado à cabo por outra figura emblemática como é Steven Spielberg, o filme possui esse ar fantasmagórico e perfeccionista tão típico do primeiro. Quimera de duas visões díspares, o filme é um produto que procura perturbar e não deixar indiferente a quem o assiste. Oferece um plano de fundo antagônico, uma vórtice destrutiva que silenciosamente ameaça e anuncia um final trágico para todos os protagonistas.

O filme está estruturado no mais puro estilo de Kubrick, com atos bem diferenciados entre si e possuindo uma estética independente em cada um deles. A arquitetura converte-se em uma ferramenta a mais na narrativa, em um elemento tão indispensável quanto a interpretação dos seus atores. Ela é, dentro de uma análise mais profunda, um reflexo da condição mental e sentimental do seu protagonista artificial, que passa de um ser inocente a um que perde o significado da sua vida e abandona-se na nostalgia. 

Cinema e Arquitetura: "Maze Runner - Correr ou Morrer"

Não surpreende o fato de que até hoje a indústria do cinema recorre continuamente a adaptação de livros juvenis. Tal tendência criou trabalhos muito díspares quanto a qualidade, que acabou por gerar algum ceticismo na maior parte do público e da crítica. "Maze Runner - Correr ou Morrer", seguindo as pautas desta tendência se sobressai por nos mostrar uma história, que mesmo simples, está atormentada por nuances torcidas, analogias poderosas da nossa própria realidade e ambientadas dentro de uma arquitetura opressiva e asfixiante. 

O filme tem como protagonistas, além dos personagens humanos, a figura do labirinto, que desde a antiguidade foi dotado de muitos significados. Simboliza confusão, desesperança, mistério e, da mesma maneira que intimida e afasta a todos que o contemplam, é também um elemento de grande atração que convida a exploração, a perder-se entre seus mais profundos recantos. 

Cinema e Arquitetura: "Oblivion"

O papel da arquitetura e em especial do design dentro das nossas vidas, embora pareça um fenômeno muito moderno é, de fato, um elemento que tem acompanhado nosso desenvolvimento como seres humanos deste os tempos ancestrais. Os objetos, construções e espaços que nos rodeiam não somente desempenharam um papel fundamental para nossa sobrevivência e desenvolvimento como sociedade, mas também nele depositamos nossa memória coletiva, pessoal e íntima. Ao tocar um velho toca-discos ou caminhar por uma antiga rua da nossa cidade, a memória de um tempo passado vem à nossa mente e o que uma vez definimos como lar, agora define a nós mesmos. 

O próprio título do filme “Oblivion” (esquecimento) já antecede a situação dos seus protagonistas. Vivendo em um futuro devastado por uma grande guerra a nível planetário e após uma série de catástrofes naturais a humanidade se refugia no espaço diante da impossibilidade de reconstruir a civilização. Sua única esperança é reunir o que lhe resta de recursos naturais para empreender uma viagem a outro mundo. Para isso, dois dos seus cidadãos elite formam uma dupla e em total solidão, dedicam seu tempo a supervisão e manutenção de maquinários de tecnologia indecifrável.

Cinema e Arquitetura: "Tropas Estelares" (1997)

O diretor Paul Verhoeven, na segunda metade da década de 90, já contava com a fama de criticar a sociedade moderna e sobretudo de ridicularizar o "american way of life" dentro dos seus filmes, mas foi com "Tropas Estelares" que o diretor mostrou o seu lado mais ácido e paródico. Este caráter do filme lhe faria merecedor da rejeição de uma grande parte do público estadunidense que, por um lado, não aceitava a sátira e por outro, via na obra uma grande apologia ao militarismo e ao governo fascista da metade do século.

A brincadeira acabaria por fechar-lhe as portas dos grandes estúdios americanos assim como a grande liberdade com que rodava seus filmes. Somente o tempo e os acontecimentos depois do 11 de setembro nos Estados Unidos, demostraram que sua crítica não era exagerada e que o imperialismo hoje em dia está mais vivo que nunca na sociedade. Ou seja, o filme não é outra coisa senão a desconstrução da sociedade contemporânea, uma dissecação em vida de um mundo que, globalizado, apresenta uma propensão a violência. 

Cinema e Arquitetura: "Expresso do Amanhã"

O  trem é o mundo. Nós, a humanidade. Frase que, citada dentro do filme, poderia resumir a mensagem que o mesmo procura transmitir ao público. Metáfora da própria sociedade, "Expresso do Amanhã" segue os passos da ficção científica distópica mais clássica, mas não por isso se torna repetitivo ou carente de impacto. Todo o contrário, transmite inovação em relação ao gênero, uma ambientação sombria e um sentimento de pessimismo que pretende conscientizar o espectador e não mantê-lo indiferente diante do apresentado.

Cinema e Arquitetura: "Fuga de Nova Iorque"

A decisão de estruturar um filme dentro de uma marcação temporal específica provou geralmente subtrair uma certa seriedade e credibilidade diante do público das gerações futuras, sobretudo dentro do cinema de ficção científica e de futuros catastróficos. Ainda que "Fuga de Nova Iorque" não seja a exceção a regra, sua referência temporal  expirada ganha um novo valor, pois nos permite examinar o contexto histórico em que foi produzida e os fantasmas sociais onde encontrou a base para seu argumento.

O filme adota um futurismo negro, similar a distopia (término muitas vezes utilizado como sinônimo), refere-se a um futuro hipotético onde a humanidade atravessa uma realidade mais escura do que brilhante. Enquanto a distopia opta por um claro enfoque onde a maior parte dos elementos que compõem a sociedade estão em desequilíbrio, o futurismo negro é mais um sentimento generalizado de pessimismo, onde certos elementos põem em questão o desenvolvimento da humanidade.

Cinema e Arquitetura: "THX 1138"

Embora existam numerosos casos (antes e depois do THX 1138) de filmes cruciais dentro do cinema pós-moderno, este, talvez por seu momento histórico e conteúdo crítico, pode ser identificado como uma ruptura no pensamento funcionalista que dominava a arquitetura da época. Existia um grande sentimento de opressão e desencanto com o movimento moderno e apenas ano após a estreia do filme, em março de 1972, o conjunto habitacional Pruitt-Igoe foi demolido, uma obra muito premiada e baseada nas ideias de Le Corbusier, simbolizando o fim de uma era.