Pavilhão brasileiro em Veneza tem méritos, mas ignora momento histórico do país.
No momento que um muro dividindo a Esplanada dos Ministérios em Brasília se tornou o símbolo de um país segregado, o tema do pavilhão brasileiro na Bienal de Veneza de Arquitetura em 2016 dificilmente poderia ser mais paradoxal: “Juntos”.
Como parte da cobertura do ArchDaily Brasil na Bienal de Veneza deste ano, compartilhamos a seguir informações sobre o Pavilhão do Brasil, que reúne quinze projetos e iniciativas de diferentes regiões do país e que tem curadoria de Washington Fajardo.
A Casa da Flor é uma arquitetura onírica erguida a partir do sonho de Gabriel Joaquim dos Santos (1892-1985). Filho de um escravo negro com uma índia, este trabalhador das salinas próximas a São Pedro da Aldeia (140 km do Rio de Janeiro) construiu sua casa a partir da coleta de restos e resíduos, os quais ganharam um novo sentido de uso nas paredes da pequena edificação unifamiliar.
O mesmo princípio moveu a arquiteta Lina Bo Bardi (1914-1992) na Casa Valéria Cirell, em São Paulo. Primeira expressiva realização da arquiteta manifestando o que defendia ser o nacional-popular, em oposição ao modernismo hegemônico dos circuitos de debate e da produção arquitetônica na época. Bo Bardi vai se interessar pelo homem simples e popular, identificando signos da cultura negra e sentidos lentamente burilados por fricção e amálgama, por desejo de converter-se em outra coisa: no brasileiro.
Idealizada por Gabriel Joaquim dos Santos após um sonho que teve em 1912, a Casa da Flor é uma obra única do esforço e determinação do ser humano. Construída a partir de restos de construções, cacos de vidro, pedaços de cerâmica e todo o tipo de material encontrado no caminho, a casa levou nada menos que 62 anos para ser concluída -- fruto do trabalho árduo de um só homem que, seguindo um desejo quase onírico, ergueu uma obra que é hoje patrimônio cultural do estado do Rio de Janeiro e está em processo de tombamento pelo Iphan.
A casa, aberta ao público e gerida pelo Instituto Cultural Casa da Flor, fará parte da mostra brasileira JUNTOS na Bienal de Arquitetura de Veneza deste ano. Segundo Washington Fajardo, curador da participação do Brasil, incorporar a casa à exposição é "falar da necessidade espiritual por arquitetura, da arquitetura vagarosa. É um contraponto àquela feita de maneira industrial, para resolver nossos problemas".