Dentro do amplo debate sobre o projeto de Feilden Clegg Bradley para redesenhar o Southbank Centre em Londres, uma questão que por vezes tem sido ignorada pela mídia de arquitetura é a proposta de relocar a pista de skate da galeria subterrânea do Queen Elizabeth Hall em um espaço nas proximidades da ponte Hungerford.
Como era de se esperar, essa decisão provocou uma petição que acabou coletando cerca de 40.000 assinaturas para salvar um dos pontos de skate mais famosos do Reino Unido. Nós já falamos sobre como skatistas podem ensinar arquitetos sobre a compreensão do espaço; entretanto, neste caso, eu gostaria de examinar como skatistas, enquanto uma entidade (sub)cultural, interagem com a cidade, e como a cidade pode atender suas necessidades. Apesar de muitos arquitetos já serem a favor da aceitação dos skatistas nos espaços públicos, espero explorar por que a comunidade em geral tende a vê-los como um problema a ser resolvido, e o que isso pode revelar sobre a proposta para o Southbank Centre.
Continue lendo para saber mais sobre a maneira peculiar como os skatistas experienciam a cidade.
99% Invisible, um programa de rádio apresentado por Roman Mars, abordou muitas dessas questões em um episódio no começo deste ano. O programa usou o exemplo da Philadelphia's JFK Plaza (conhecida como Love Plaza) como um caso concreto para ilustrar como skatistas adotam um espaço, se apropriam dele para seu uso e em seguida lutam contra as autoridades que tentam expulsá-los de lá.
Andrew Norton, o guia neste episódio em particular, descreve como eles usam elementos dos projetos dos espaços públicos de forma criativa, não necessariamente pensados para eles: na Love Plaza, os bancos de concreto servem perfeitamente para manobras e lajes se tornaram rampas improvisadas.
Devido ao fato de atraírem atenção, a adoção de um espaço por skatistas é geralmente bem óbvia, mas 99% Invisible esclarece como as autoridades usam meios dissimulados para expulsá-los de seus lugares favoritos. "Skate stoppers" são quaisquer acréscimos ao ambiente construído que impeçam os skatistas de utilizá-los - o mais comum são pequenos anexos de metal em bancos de concreto que quebram a continuidade da sua superfície. Norton explica como "a maioria das pessoas não sabem a razão pela qual eles estejam lá", e que, no caso de Love Plaza, os skatistas foram finalmente expulsos em 2002, quando parte do pavimento foi substituído por grama e os bancos de concreto por bancos de madeira, comumente usados em parques. Para um observador casual, essas mudanças podem parecer inocentes (ainda que mal aconselhadas), modificações estéticas, mas a real motivação foi explicitamente afastar os skatistas.
Por que autoridades chegam a esse nível para afastá-los? Um artigo recente do arquiteto britânico Henry Goss discute a possibilidade da expulsão incentivar outros (socialmente aprovados) tipos de uso, e lamenta: "Por que devemos escolher? Por que não podemos ter ambos? A riqueza e variedade da selva cultural humana não deve ser representada na selva urbana humana?"
Entretanto, penso que essa exclusão seja motivada por equívocos muito maiores sobre a cultura do skate. Skatistas são geralmente retratados como vândalos, provavelmente pelos danos mínimos que possam causar ao ambiente construído e por sua afinidade natural com artistas do graffiti. Procuram pontos propícios para o skate em todos os lugares, e frequentemente os encontram sob pontes e em edifícios abandonados, o que significa que, algumas vezes, estejam infelizmente ligados ao mundo das drogas e outras atividades igualmente desagradáveis. Resumindo, são geralmente rotulados como "antissociais", quando na realidade só querem praticar seu esporte, e estão geralmente dispostos a fazer concessões para serem aceitos pelo público em geral. Não são mais antissociais do que qualquer outro grupo formado por adolescentes.
Longe de se basear em comportamento antissocial, o skate tem uma rica história cultural que tem grande importância para muitos que adotam seu estilo de vida; os principais componentes desta história não são apenas os indivíduos pioneiros, mas também os locais lendários que abrigaram a cultura. Como no basquete, com o grandioso Madison Square Garden e o austero Rucker Park sendo respeitados de forma equivalente mas oposta, estes marcos culturais podem ser a localização de eventos inovadores ou simplesmente um local que tem promovido o desenvolvimento de várias pessoas. Os melhores eventualmente alcançam tanta importância que desempenham os dois papeis.
O fato de que esses locais sejam frequentemente descritos em termos religiosos não é coincidência: a pista de skate de Southbank pode não ter a mesma importância cultural que a verdadeira Meca, mas esta comparação indica como skatistas se sentem sobre ela. Os comentários feitos por aqueles que assinaram a petição estão repletos de referências a Southbank como um "templo" ou um "santuário para o skate no Reino Unido", assim como de histórias de verdadeiras peregrinações de todo o mundo para experimentar a aura da galeria subterrânea.
A característica mais usual dos "templos" do skate, entretanto, é que frequentemente começam a vida como espaços urbanos residuais. Skate é apenas uma de várias culturas que formam ligações tão fortes, quase religiosas, a lugares encontrados ao invés de construídos para esse fim. Grande parte da cultura do skate é esta característica da adaptação criativa: skatistas precisam adaptar suas "manobras" ao espaço. Se, pelo contrário, o espaço é projetado para se adequar a certas manobras, pode às vezes parecer que falta o desafio. Isso é apoiado pelo depoimento de Andrew Norton no programa 99% Invisible quando diz que "parte de mim pensa que esses espaços destinados ao skate meio que perdem o sentido. É como correr uma maratona em uma escada rolante."
Claramente este não é apenas um caso de relocar os skatistas da orla do Tâmisa. Para eles, a galeria subterrânea do Queen Elizabeth Hall levaria muitos anos para ser substituída, além de correrem o risco do novo local não ser tão bem sucedido quanto o atual.
A seu crédito, as pessoas por trás no novo Southbank Centre não são "ogros" que desejam se livrar dos skatistas. Eles ofereceram um espaço tão perto quanto possível, e de uma forma estranha parecem ter algum entendimento do que faz a galeria especial: uma declaração elogia o fato da nova localização ser "um espaço urbano encontrado, não construído para este fim" (se um 'espaço encontrado oficialmente aprovado' é satisfatório às necessidades do skatistas é, até onde sei, uma questão sem precedentes). Mas isso não significa que sejam capazes de satisfazer todas as necessidades desta comunidade.
Para alcançar o objetivo tanto de reconstruir o Southbank Centre quanto de proteger os direitos dos skatistas, a solução não pode ser fazer com que mudem de lugar. Antes, o plano precisa ser modificado para que a galeria não seja mais "crucial" para o sucesso do projeto. Afinal, é mais fácil alterar um projeto ainda não realizado ou manipular décadas de história social e cultural?