Muitos poderiam considerar Greg Lynn o líder do projeto baseado em meios digitais na arquitetura - mas o próprio Lynn pede que não o considerem. Ele e o Centro Canadense de Arquitetura (CCA) recentemente colaboraram em "Arqueologia do Digital", a primeira de uma série de exposições que irão exibir o trabalho dos pioneiros no uso de computadores como ferramentas de auxílio em projetos de arquitetura - incluindo alguns dos mentores do próprio Lynn. Nesta entrevista, originalmente publicada na revista Metropolis Magazine como "Computer Control," Avinash Rajagopal conversa com Greg Lynn sobre alguns dos projetos e a inspiração por trás da exposição em si.
Por que nós precisamos de uma arqueologia do digital?
Há aproximadamente uma década, o CCA adquiriu a Casa Embriológica, o primeiro de meus projetos concebido digitalmente. Levaram mais de 500 maquetes e desenhos, e eu disse, muito inocente, "Você gostaria de algo do material digital?" Eles responderam que sim. Mas foi feito em máquinas gráficas antigas de silicone e não se pode abrir os arquivos sem elas. E os softwares, Alias e Wavefront, tinham se transformado no Maya. Os arquivos poderiam ser abertos, mas muitas coisas se perderiam na migração de plataforma. Então o CCA terminou fazendo um estudo de dois anos com a Fundação Langlois em Montreal e a Biblioteca do Congresso, se perguntando "Qual a responsabilidade de uma instituição em relação ao material digital?" Pensei que era possível identificar 25 projetos arquitetônicos específicos para serem coletados, todos realizados antes da virada do século. E foi de onde começamos - tentando obter o máximo de coisas que podíamos, mesmo sem saber o que fazer com elas ainda, porque elas iriam desaparecer.
Como vocês decidiram sobre os quatro profissionais da exposição?
Esses quatro arquitetos foram os primeiros a utilizar essas ferramentas digitais. Embora essas ferramentas sejam de antes dos anos 80, nós tentamos encontrar projetos que não teriam sido possíveis de outra forma que não fosse digitalmente, e que fossem uma extensão da visão do arquiteto. Esses quatro projetos eram também uma visão bastante individual de como o digital poderia funcionar. Então ao invés de pegar pessoas da minha idade, que é onde muita gente pensa que a tecnologia digital realmente começou, nós decidimos procurar pessoas que estavam em torno dos 50, 60 anos quando eles começaram a utilizar a tecnologia. Foi importante eles já estarem maduros o suficiente na época, para ter uma agenda, uma visão do que fazer com aquilo.
Existe uma noção destes arquitetos terem realmente travado batalhas com os computadores. Este cenário mudou hoje em dia?
Eu trabalhei para o Peter Eisenman no projeto do Biozentrum e um dos meus trabalhos era desenhar - à mão - a base destes desenhos que o computador ia interagindo simultaneamente. Eu lembro vividamente esta música sobre John Henry, um trabalhador ferroviário que era o mais rápido em conduzir dormentes e trilhos. Quando alguém vem com uma máquina para fazer este trabalho, John Henry desafia a máquina, a derrota, mas morre no final da linha férrea. Eu ficava cantarolando isso para mim, porque eu também senti como se estivesse competindo com o computador. Quando falamos com o Frank Gehry e as pessoas que trabalharam pra ele, nós descobrimos que CATIA estava trabalhando na mesma velocidade de produção que as pessoas trabalhando no escritório. A impressora LOM 3-D trabalhava na mesma velocidade que alguém construindo uma maquete. Os recursos digitais foram quase perfeitamente alinhados com a elaboração e construção de maquetes. E isso permitiu todo um processo de idas e vindas que você simplesmente não vê agora.
Mas se esse foi o caso, o que manteve essas pessoas comprometidas com seus computadores?
Cada um deles viu algo diferente. Mas eu acho que todo mundo percebeu que a tecnologia digital não é apenas uma ferramenta sem consequências, era realmente um conceito novo.
Também é necessário um conjunto de capacidades diferentes. Como você acha que isso afetou as práticas arquitetônicas?
Nós ouvíamos isso muitas vezes, que houve uma perda de autoria e controle para os consultores. Começou-se a pegar essas segregações de habilidades, onde algumas pessoas se tornaram especialistas digitais e os arquitetos se tornaram os generalistas. Os arquitetos estavam lutando para não ter que existir esta segregação. Chuck [Hoberman] foi o mais extremo. Ele se recusou a ter algum especialista em fazer essas coisas, ele simplesmente aprendeu a programar sozinho.
Quais foram as diferentes atitudes em relação ao computador?
Eles realmente encaravam o computador como um membro da equipe de projeto. Não era uma ferramenta, não era uma coisa que tinha um papel neutro, não criativo nos projetos. Peter Eisenman tratava os computadores da mesma maneira que ele me tratava. Ele nos dava as mesmas instruções. Mas é interessante ver , três ou cinco anos depois, uma geração que tinha visto esse trabalho inicial acontecendo em relação ao computador. Os estúdios da Columbia University, por exemplo, encararam o computador como uma ferramenta de mídia e tentaram entender como ele poderia ser utilizado na arquitetura. Ouve-se uma palavra repetidas vezes - experimento. Mas eles não queriam dizer experimento científico, onde se testa uma hipótese, eles queriam dizer um projeto artístico: Você tem uma máquina de escrever e macacos, e espera que alguma coisa saia disso tudo. Mas aqui está um bando de caras mais velhos que integraram o computador com o que eles estavam fazendo, ao invés de tratá-la como uma coisa de outro planeta.
Esta exposição é a primeira de uma série, existe algum tema específico que você gostaria de explorar em futuras edições?
Na próxima exposição, nós teremos de seis a dez projetos que impuseram os maiores problemas para o CCA - todos têm componentes mecânicos e lidam com scripts, animações e ferramentas de expressão, que são as coisas mais difíceis para arquivar. A última exposição terá dez ou doze edifícios de larga escala. E será de pessoas que você associa com a tecnologia digital mas que na verdade não a utilizaram de verdade até os anos 90, como Zaha Hadid e Morphosis.
Parece que a tecnologia mudou tão rapidamente que nós temos que trabalhar com a mesma velocidade para escrever sua história.
Os historiadores que foram prestigiar a exposição foram educados, mas foram ágeis em me dizer que eu não deveria estar envolvido. Eu continuei dizendo que trata-se, na realidade, de coletar as coisas antes que elas se percam. Porque não há outro modo, assim como o Pavilhão de Água do Lars Spuybroek, de entender o processo criativo se você não tem todos os vídeos, a tecnologia interativa e as maquetes digitais. Nenhum historiador poderia fazer seu trabalho sem aquele material, e está tudo no porão da casa da irmã de Lars agora. Sabe lá Deus, mais um movimento de sua irmã e tudo poderia se perder. Então, nós estamos apenas tentando obter o máximo disto para o museu.
Para mais informações sobre esta exposição que acontece no Centro Canadense para Arquitetura, confira essa série de vídeos em que Greg Lynn entrevista os arquitetos da "Arqueologia do Digital".