Já apresentamos o Edifício Comercial Tamedia, desenhado por Shigeru Ban Architects. A obra, composta totalmente com base nas secções pré-fabricadas de madeira, propõe um complexo e arriscado sistema de uniões com base em cortes e montagens prolixamente executados. Com o fim de se aprofundar um pouco mais nesta característica e abordar seus componentes estruturais, revisamos detalhadamente o processo de projeto e construção de uma estrutura portante que é capaz de prescindir de pregos, parafusos e qualquer outro tipo de união.
Princípios de Desenho
Um dos objetivos principais fundamentais de Shigeru Ban para esta obra foi construir a totalidade da estrutura em madeira de maneira similar aos edifícios tradicionais japoneses. Não somente os elementos estruturais, mas também o sistema de uniões entre eles, o qual também é composto predominantemente de madeira: ao invés de utilizar pregos, parafusos ou conexões de aço, foram utilizados pinos especiais, fabricados com madeira de Haya (Fagus Sylvatica) que servem tanto para a transmissão de cargas, como de reforço para outros elementos estruturais. A estrutura portante composta por pilares e vigas gêmeas de secção transversal ovalada, foi desenhada através de um processo de fresagem a partir do Controle Numérico Computadorizado (CNC) e foi pensada para ser montada em obra, de maneira similar a um "quebra-cabeça" tridimensional.
Assim como em outros projetos, Shigeru Ban trabalhou em parceria com Hermann Blumer e a empresa Blumer-Lehmann, que foram os encarregados de desenvolver o conceito da estrutura. O objetivo da equipe constava de que as peças de madeira ficassem totalmente expostas e ao mesmo tempo fossem capazes de manter sua expressão natural, sem nenhum tratamento adicional. Para isto, foram realizados ensaios com maquetes na escala 1:1.
As uniões de madeira
O edifício possui um comprimento de 38,15 m e é estruturado a partir de oito quadros estruturais de madeira dispostos a cada 5,45 m. Os quadros são compostos por quatro colunas conectadas a um sistema de vigas pares em cada pavimento. As colunas chegam à altura do beiral e estão feitas para serem montadas como uma única peça. As colunas de madeira laminada medem 21 metros de altura, com uma secção transversal de 440 por 440 mm e um peso de 2,5 toneladas. Os pares de vigas salvam uma luz de 11 metros de comprimento e possuem uma curvatura de 25 mm. Este sistema de colunas e vigas gêmeas unem-se mediante articulações que apresentam conectores especialmente desenhados, levando em conta a madeira de Haya.
O sistema de vigas pares possui uma largura total de 240 m - feitas a partir de duas peças de 120 mm de largura - e são complementadas por peças de madeira de Haya ovalada de 40 mm de espessura como reforço. Estas vigas são conectadas através de um poderoso taco de madeira que se insere num entalhe oval, minuciosamente cortado, nas colunas que os recebem. Mesmo assim, este sistema de uniões foi pensado de modo que as conexões entre as peças ficassem ocultas, ou seja, somente o encontro entre os elementos é visível, sem que o sistema de união seja revelado.
Todas as cargas dos pavimentos superiores são transmitidas para as colunas das extremidades através das articulações e esteios diagonais. Tacos de madeira de Haya laminada foram especialmente desenvolvidos para articulação entre a estrutura principal e a estrutura da cobertura que consiste num quadro rígido da mesma madeira e salva uma luz de 18,38 m.
A forma e a geometria possuem um papel central no planejamento e produção da estrutura. Aproximadamente 80% dos componentes, além da madeira e da fachada de vidro, escadas e vidros interiores, são pré-fabricados para permitir alta qualidade e curto tempo de montagem. Isto requer um alto grau de planejamento prévio, decisões e ajustes precisos nas operações relativas ao precedimentos de instalação.
Dado que as cargas são transmitidas através do contato entre os elementos, o ajuste exato de cada peça é o objetivo fundamental a qual a obra se propõe, não apenas para fins de projeto, mas também em termos de planejamento, fabricação e montagem de cada uma das secções.
Processo de construção e montagem
O processo de montagem começou ao longo do perímetro sul do edifício existente. Os oito quadros estruturais de madeira foram pré-montados e levantados sucessivamente onde cada quadro que se instalava servia como precedente ou gabarito para a instalação do quadro consecutivo.
Em primeiro lugar, a metade dos pares de vigas foram fixados na empena do edifício existente. Depois, as quatro colunas com os pinos de madeira de Haya pré-montados foram conectadas e empurradas para os cinco pares de vigas fixadas ao longo do muro. Na continuação, a segunda fila de pares de viga foi montada, e assim sucessivamente até completar a totalidade dos quadros estruturais.
No entanto, durante o processo de montagem, cada quadro foi instalado na posição vertical, mas ligeiramente inclinado, de modo que as barras de reforços de secção transversal ovalada, pudessem ser conectadas, pavimento por pavimento, de baixo para cima. Durante o processo, o quadro foi movido progressivamente para sua posição vertical final.
A qualidade estrutural da obra de Shigeru Ban radica fundamentalmente na maneira em como o uso da medeira é concebido num contexto urbano. Todavia, mais que a qualidade estrutural e a resolução das junções entre os elementos estruturais e suas qualidades construtivas, são as propriedades atmosféricas da madeira como material que tornam a obra um lugar com identidade e sentido.