Não é exagero dizer que Renzo Piano é um dos arquitetos mais unânimes que existem no mundo da arquitetura. Com uma obra que mescla respeito ao contexto, leveza e tecnologia para criar estruturas ambientalmente conscientes e esteticamente agradáveis, sua abordagem combina materiais avançados com técnicas tradicionais. Em projetos de diversas escalas, o arquiteto genovês mantém um fio condutor essencial: a implementação de estratégias arquitetônicas passivas, destacando a importância desses métodos para a sustentabilidade e a eficiência energética. Isso é frequentemente explicitado em seus croquis, como uma preocupação inicial, e se concretiza claramente nas obras finalizadas. Veja, a seguir, alguns exemplos em projetos icônicos desenvolvidos pelo seu escritório nas últimas décadas.
The Shard, Londres
Um dos projetos mais famosos de Piano, este arranha-céu incorpora alguns elementos de design passivos, juntamente a diversas façanhas da engenharia. O edifício apresenta fachada dupla, o que melhora a ventilação natural e reduz a necessidade de resfriamento artificial. Esta camada externa de vidro permite um controle do ganho solar, enquanto a camada interna fornece isolamento térmico, reduzindo significativamente o consumo energético do edifício. Ainda em relação à fachada, o projeto conta com um sistema inteligente de controle de persianas que se ajusta dinamicamente ao longo do dia, garantindo que só sejam utilizadas quando e onde necessário, otimizando o equilíbrio entre a luz natural e o conforto térmico. Isso maximiza a entrada de luz natural, reduzindo a dependência da iluminação artificial e melhorando o conforto dos ocupantes.
Um aspecto único do design do The Shard é que os paineis externos de vidro não se encontram, criando fraturas entre eles. Estas lacunas facilitam o fluxo de ar constante ao redor do edifício, regulando naturalmente a temperatura interna sem a necessidade de extensos sistemas de ventilação mecânica. Em alguns andares também são incorporados jardins de inverno, que são ventilados naturalmente através de aberturas estrategicamente posicionadas. Estes funcionam como amortecedores térmicos, melhorando o isolamento do edifício e proporcionando espaços agradáveis e com iluminação natural para os ocupantes. A ventilação natural nestas áreas reduz a necessidade de refrigeração mecânica, contribuindo para a sustentabilidade global do edifício.
O projeto também utiliza uma abordagem inovadora para gerenciamento de calor. O excesso de calor gerado pelos espaços de escritórios é reaproveitado para aquecer os espaços dos hoteis e apartamentos dentro do edifício, minimizando o desperdício de energia. Qualquer excesso de calor que não possa ser aproveitado é naturalmente dissipado através de um radiador situado no topo do edifício, evitando o sobreaquecimento e mantendo um clima interno equilibrado.
Academia de Ciências da Califórnia, São Francisco
O projeto para a Academia de Ciências da Califórnia, em São Francisco, é outro exemplo do uso inovador de estratégias de design passivas e sistemas de eficiência energética. Grandes janelas de vidro e claraboias estrategicamente posicionadas em todo o edifício maximizam a iluminação natural e melhoram a ventilação cruzada, sem permitir que o sol entre nos meses mais quentes do ano. No geral, 90% dos espaços ocupados têm acesso à luz natural e a vistas externas. Outro elemento é a icônica laje ajardinada, coberta com plantas nativas, que oferece isolamento natural e reduz o efeito de ilha de calor urbano. Ela também facilita a captação de águas pluviais, promove a biodiversidade e evita que o escoamento de águas pluviais carregue poluentes para o ecossistema.
Outro componente importante é a ventilação. A praça central do museu fica sob um enorme teto de vidro que se abre à noite para permitir a entrada de ar fresco no edifício. No piso público principal, um sistema de ventilação automatizado aproveita as correntes naturais de ar do Golden Gate Park para regular as temperaturas internas através de venezianas nos quatro lados do edifício que abrem e fecham durante o dia e a noite, proporcionando ar fresco e resfriando o edifício. O museu utiliza aquecimento por piso radiante, um componente chave da sua eficiência energética. Tubos embutidos nos pisos de concreto transportam água quente, aquecendo os espaços por onde as pessoas se movimentam. Este sistema reduz as necessidades energéticas do edifício em cerca de 10 por cento anualmente.
Centro Cultural Tjibaou, Nova Caledônia
O Centro Cultural Tjibaou é um modelo exemplar de design passivo adaptado ao clima local, neste caso, de uma ilha no Oceano Pacífico. Inspirado nas tradicionais cabanas Kanak, o projeto utiliza ventilação natural através de aberturas estrategicamente posicionadas que promovem o fluxo de ar. A orientação dos edifícios e a utilização de materiais locais melhoram ainda mais a sua harmonia ambiental e eficiência energética. O projeto fica em uma península estreita perto de Noumea, onde do lado da baía estão os dez volumes de madeira do museu, com suas fachadas curvas voltadas para os ventos predominantes do mar. Noumea tem um clima considerado “tropical oceânico”, quente e úmido, em que a incorporação de sistemas de refrigeração passivos eficientes pode ser conseguida através de ventilação, microclimas e dispositivos de sombreamento.
O projeto está localizado no topo de uma colina para maximizar a ventilação natural, orientado para o vento predominante do sul. A falta de árvores deste lado da ilha facilita a entrada do vento, enquanto árvores altas nos lados leste e oeste canalizam o vento para o projeto. A ventilação funciona como resfriamento passivo, complementada pelo ar fresco gerado pela diferença de temperatura entre a terra e a água ao redor. Além disos, utiliza-se dois princípios para ventilação natural: efeito chaminé e forças do vento. O ar circula entre as peças de madeira, com um sistema de painel duplo que traz brisas ou guia correntes de convecção. A casca externa direciona essas correntes com seu design, enquanto a pele interna possui persianas horizontais na base e abaixo do telhado. As persianas superiores são fixas para equilibrar a pressão, evitando danos ao telhado, e as inferiores são ajustáveis conforme a direção e intensidade do vento, também funcionando como sombreamento para controle solar.
The Whitney Museum of American Art at Gansevoort, Nova York
O Whitney Museum of American Art, localizado no Meatpacking District de Nova York, incorpora estratégias que melhoram o seu desempenho ambiental e sustentabilidade, ao mesmo tempo que proporcionam um espaço confortável e dinâmico para exposições de arte e visitantes. Em relação à ventilação natural, o edifício possui diversas janelas operáveis, que permitem a circulação de ar fresco pelos espaços, reduzindo a necessidade de sistemas de refrigeração mecânica. O museu também foi projetado para maximizar o uso da luz natural, e grandes janelas e claraboias estrategicamente posicionadas permitem que a luz do dia penetre profundamente nos espaços interiores. Isso reduz a necessidade de iluminação artificial durante o dia, diminuindo o consumo de energia e proporcionando um ambiente mais agradável e com iluminação natural para a visualização de arte. O design das janelas também inclui dispositivos de sombreamento externo que evitam o ganho excessivo de calor, minimizando a carga de refrigeração.
O museu também apresenta vários terraços exteriores concebidos não só para fins estéticos e funcionais, mas também para contribuir para o desempenho ambiental do edifício. Estes incluem elementos de cobertura verde que proporcionam isolamento natural, reduzindo o ganho de calor no verão e a perda de calor no inverno. A envolvente do edifício foi concebida com vidros de alto desempenho e materiais de isolamento para minimizar a transferência de calor. O envidraçamento reduz o ganho de calor ao mesmo tempo que permite a entrada de luz natural, e o isolamento ajuda a manter temperaturas interiores consistentes, melhorando a eficiência energética.
Padre Pio Pilgrimage Church, Itália
A Igreja de Peregrinação Padre Pio, localizada em San Giovanni Rotondo, Itália, é reconhecida pelo seu design orgânico e inovador, incorporando diversas estratégias passivas que melhoram o seu desempenho ambiental e criam uma atmosfera serena e contemplativa para os visitantes. Primeiramente, a igreja faz uso extensivo de massa térmica para estabilizar as temperaturas internas. As grossas paredes de pedra absorvem o calor durante o dia e o liberam lentamente à noite, mantendo um clima interno consistente e confortável. Esta regulação térmica passiva reduz a necessidade de sistemas ativos de aquecimento e arrefecimento, diminuindo assim o consumo de energia.
O projeto de Renzo Piano incorpora estrategicamente a luz natural para aprimorar a experiência espiritual e reduzir a dependência de iluminação artificial. Apresenta claraboias e aberturas cuidadosamente posicionadas que permitem que a luz natural penetre profundamente nos espaços interiores, que também criam um jogo dinâmico de luz e sombra, realçando o ambiente estético e espiritual. Os poços de luz são usados para direcionar a luz solar para áreas específicas, criando pontos focais de luz que destacam os principais elementos arquitetônicos e religiosos da igreja. Além disso, poços de ventilação verticais são integrados ao projeto para estimular a subida e a fuga de ar quente, enquanto o ar mais frio é aspirado em níveis mais baixos, criando um ciclo de ventilação natural.
Observa-se que as obras-primas arquitetônicas de Renzo Piano demonstram como estratégias de design passivo podem ser efetivamente integradas em projetos de grande escala para aumentar a sustentabilidade e a eficiência energética. Ao empregá-las, não só reduz-se a pegada ecológica dos seus edifícios, mas são criados espaços funcionais e inspiradores, que servem como modelos exemplares para empreendimentos arquitetônicos futuros, mostrando o profundo impacto de um design inteligente e sustentável.
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