Você prepara seu trabalho final de graduação por um longo tempo. Sonha muito com a apresentação, com a banca, com o projeto, com sua maquete, com o memorial, com as suas palavras. Avança, mas crê que será péssimo. Logo sente que não, que será um êxito e que tudo terá valido a pena. E logo tudo se repete e tens vontade de suicidar-se. Que isso é uma montanha russa e não sabes quando tudo acabará.
Até que chega o dia. Você apresentar seu projeto. Explica suas ideias. A banca faz perguntas. Você responde. Você percebe que sabe mais do que pensava e que nenhum de seus sonhos constantes durante o ano não estiveram perto do que realmente aconteceu no exame. A banca murmura. Acaba a apresentação e te pedem que saia por um tempo. Ali você espera uma eternidade, minutos que rastejam lentamente. Passa, por favor. A comissão recita uma breve introdução e você não pode deduzir se foi bem ou mal. A comissão vai direto ao ponto. Você passou! Parabéns, você é um novo colega e todos te felicitam pela sua realização. A alegria invade você, apesar do cansaço que vêm arrastando. A adrenalina baixa. Passam-se semanas ou meses para ter um descanso merecido. E você começa a se perguntar: e agora?
A universidade -essa instituição que te forma como profissional- te entrega o diploma e agora você enfrentará o mercado de trabalho pela primeira vez (se é que nunca trabalhou antes). Antes de sair e definir suas próprias métricas de êxito pessoal (o êxito já não é medido em avaliações acadêmicas), compartilhamos com você 9 lições para enfrentar o mundo, agora que você é uma arquiteta ou um arquiteto.
1. A universidade forma competências, não um emprego
Começando pela primeira lição: a universidade segue sendo um símbolo de ascensão social. Muitos somos os primeiros arquitetos, ou até mesmo, os primeiros universitários de nossas famílias e ser formado é uma receita segura, segundo o que estudes, para conseguir um bom emprego, estabilidade econômica e tudo isso. Se estudar arquitetura não nasceu como um ardor no peito ou uma missão na sua vida, é provável que essa variável tenha sido mais relevante, uma ideia reforçada pelos meios de imprensa, ao publicar constantemente rankings sobre as carreiras mais bem pagas.
No entanto, é um erro crer que estudar arquitetura te entrega um emprego. Um erro que não é percebido quando se vai ao mercado de trabalho e, quando você se dá conta que os primeiros trabalhos não são como esperava na universidade, ou o que a sociedade crê sobre o que faz o arquiteto.
Mas se entendemos que a universidade forma competências (revise o perfil de egressos de sua universidade), poderás visualizar quais são seus benefícios, e como aplicá-las no que você exerce. Uma lição que caminha lado a lado com o ponto seguinte.
2. Nem todos vão projetar
Durante o curso, todas as cadeiras orbitam em torno do ateliê. Por defeito, nosso valor como arquitetos está na medida que projetamos objetos. De fato, as primeiras cinquenta referências de arquitetos que nos vem na cabeça realizam projetos. A suposta pluralidade da formação é falsa: todos podem dedicar-se ao que quiserem, sempre e quando seja o mesmo. A etapa final do curso é um funil: não importa o que você fez durante ele, queremos que você seja capaz de projetar alguma coisa, ainda que seja uma caixa.
Este momento é particularmente complexo para aqueles interessados em paisagismo (na Espanha os arquitetos paisagistas nem sequer podem assinar seus próprios projetos), em urbanismo, teoria, construção, gestão de obras, ensino, e tudo mais que não seja puro projeto.
Tenho amigos com grande interesse e conhecimento no urbanismo que chocaram contra o projeto final. Pediam-lhes projeto para o diploma. A banca não valorizava esses "planos de coress". Meus amigos acreditavam que jamais sairiam, mas uma vez que passaram a barreira do projeto final, sua vontade e perseverança (e, claro, o mercado de trabalho) disseram outra coisa.
3. Aprender a discutir, trocar ideias e negociar
Mark Wigley, ex-reitor da GASPP, disse que a arquitetura é "99% esconder e 1% mostrar". Se estas palavras não fazem sentido, vamos voltar ao projeto de ateliê: cada projeto de arquitetura começa com infinitas potenciais camadas de informações e variáveis que dependerão de você ocultá-las ou exibi-las: regulamentos, especialidades técnicas, orçamentos, prazos, sustentabilidade, gestão, construção, e o mais importante: um cliente. Sim, alguém que paga e que, com razão, também opine. Porque ele vai. Considere isso.
O exercício universitário põe ênfase no projeto, pois te ajuda a desenvolver as capacidades técnicas que mencionamos no começo. No entanto, no mundo real também devemos discutir, trocar ideias e negociar com a outra parte. Não existe o professor, mas alguém que manda, especialistas e empreiteiros. Não espere que todo o mundo te trate como uma luminária, pois o resto dos participantes sentem-se tão importantes e com algo relevante a dizer e defender.
4. Aprender a trabalhar em equipe
Sim, você aprendeu a trabalhar em equipe na universidade, ainda que muitas vezes sua equipe dividiu o trabalho como se tratasse da montagem de um automóvel em uma planta industrial. Quando chegava o dia da entrega, juntavam-se antes e tentavam montar mecanicamente.
Não, o trabalho em equipe é mais que isso e como o ponto anterior, implica aprender a discutir. Além disso, no mercado de trabalho há hierarquias corporativas e especialidades. A opinião de alguns pesará mais que outros (claro, é teu chefe), mas não tenha medo de expôr tua postura, defendê-la e escutar a do restante.
5. Falar claramente. Sem poesias, por favor.
A linguagem arquitetônica é especial. Não é especial unicamente pelos conceitos técnicos que adota, mas também pelos advérbios, substantivos e verbos aparentemente profundos e comoventes, mas carentes de significado. Por que os usamos? Porque foram validados por seus professores e nos memoriais de arquitetura. No entanto, aos olhos da sociedade é uma das razões por que não levam a sério a nossa profissão. Falamos difícil.
Uma coisa é falar difícil. Outra coisa é contar com uma linguagem rica, ampla e complexa. E outra muito distinta, é dizer nada. Exemplos? Atribuir propriedades antropomórficas a seu projeto, como se tratasse de um pokémon, é totalmente excêntrico. Sim, é uma leitura subjetiva e pessoal sobre seu projeto, mas não é clara, nem direta ou convincente. Podes dizer de outras formas.
Não espere que alguém entenda que uma obra "quis pousar sobre a colina para contemplar a sociedade", ou que seu conceito é "um dinamismo circunstancial da retração urbana". Não diz nada. Disso já falamos há um tempo e apresentamos uma seleção de 70 palavras estranhas que apenas os arquitetos usam. Conselho? Guardar a lista em algum lugar e esforçar-se para eliminá-las ou substitui-las.
6. Não, a tabela oficial de honorários não serve
Não fique frustrado ao ver que a tabela oficial de honorários para arquitetos não se encaixa em sua própria experiência. Mas não atire contra o Conselho de Arquitetura e Urbanismo ou os clientes. Há duas respostas, uma curta e outra longa.
Vamos com a resposta curta: isso escapa à arquitetura, pois é um mercado de oferta e demanda, a sobre oferta de arquitetos torna mais barata a mão de obra.
7. Autopromover-se. Não basta ter as ideias.
Já foram Le Corbusier e Mies van der Rohe. Agora é Bjarke Ingels. Independentemente de saber se gostamos ou não, os arquitetos mais renomados são também aqueles que mais se auto promovem. Em vez de esperar clientes, eles oferecem propostas. Eles estabeleceram pontes com outras disciplinas. Rejeitaram o status quo da disciplina e repensaram. Eles fizeram o seu caminho. Publicaram, expuseram e discutiram. Estavam convencidos de seus princípios e se esforçaram para materializá-los.
Conselho: não basta ter as melhores ideias se não é capaz de transmiti-las. Se nossa disciplina é um aporte à sociedade e nós estamos convencidos de que podemos contribuir, então devemos ser capaz de comunicá-las. Não espere que, depois de um silencioso trabalho durante décadas, cheguem na tua porta e te entreguem o Pritzker (ou o prêmio que você mais valoriza).
As melhores ideias (e as mais fortes) se contagiam, se difundem, se discutem, se reformulam, se expandem e se contrapõem.
8. A história da arquitetura é uma construção social (ou "Por que não conhecemos tantas arquitetas de destaque?")
Compartilho da ideia de que a história é uma construção social. Sua construção é o relato de pessoas que a escrevem, escolas que a influenciam e instituições que a validam. No caso da arquitetura, é bastante evidente: não parece estranho o escasso reconhecimento das mulheres em nossa profissão? Os casos de injustiças são numerosos e progressivamente, por sorte, está sendo evidenciado esse machismo da profissão no século XX. Essa visão da arquitetura que foi transmitida a gerações de estudantes. Assim mesmo, a pergunta também fala de minorias étnicas. E somente estamos falando da história, pois a diferença salarial segue sendo escandalosa.
A exclusão de Scott Brown na concessão do Pritzker de 1991 a seu marido, Robert Venturi. Ou a perseguição constante a Zaha Hadid, inclusive quando já estava junto aos starchitects. E no dia a dia de milhares de arquitetas, a injustiça não conhece as barreiras culturais e econômicas, como os 19 casos resgatados pelo New York Times sobre desigualdade cotidiana.
Quantas mulheres ganharam o Pritzker individualmente? Uma, Zaha. Quantos latinos? Quantro. E africanos? Zero. Não existem arquitetos de tal envergadura ou são invisíveis? Por fim, a arquitetura (e suas histórias) é uma leitura, uma construção assumida como a versão oficial e que nos ensinaram. Evitemos repetir. É hora de confrontar, expandir, complexificar e diversificar.
9. Não sabes nada, mas tudo é aprendido no caminho.
Saímos da universidade achando que não sabemos nada. Escolhemos estudar um pouco de tudo, mas ao final não estamos satisfeitos. Esta é uma das maiores frustrações no momento da formação e nos inibe de aplicar para novos postos de trabalho e cargos, ou tentar novos caminhos.
Não se preocupe, pois tudo se aprende no caminho. Não consegue entender as legislações municipais? Com certeza tens um professor ou amigo que sabe. Não sabe como é feita a fundação em um terreno úmido? Pesquise, consulte alguém, revise projetos antigos, pergunte a alguém que já trabalhe há tempos. Sempre há alguém que já fez. Não é o fim do mundo.
É importante tentar, errar, provar e ver o resultado.