Combinando habitação social e turismo para resolver a crise habitacional em Havana

A maior das ilhas do Caribe, Cuba é um crisol cultural de mais de 11 milhões de pessoas, combinando nativos Taíno e Ciboney com descendentes de colonos espanhóis e escravos africanos. Desde a revolução de 1959 liderada por Fidel Castro, o país foi o único regime comunista estável no hemisfério ocidental, com estreitos laços com a União Soviética durante a Guerra Fria e relações hostis com seu vizinho vizinho, os Estados Unidos, que há pouco tempo deu início à retomada das relações internacionais entre os dois países. Enquanto a arquitetura na capital Havana reflete a história dinâmica e rica da área, após a revolução a cidade deixou de ser prioridade e o foco do governo passou para as áreas rurais, como consequência, os edifícios da capital foram deixados a ruína desde então. Iwo Borkowicz, um dos três vencedores do Prêmio de Arquitetura de Jovens Talentos de 2016, desenvolveu um plano que poderia trazer alguma vitalidade e, mais importante, alguma sustentabilidade, de volta ao núcleo histórico da cidade.

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Courtesy of Iwo Borkowicz

Após meio século de ausência de manutenção dentro de Havana Vieja, as estatísticas apontam que dois edifícios entram em colapso total ou parcial a cada três dias devido a inundações, corrosão da água salgada e sobrecarga. Apesar de uma lei cubana impedir que as pessoas migrem para a capital, Havana ainda está lutando com uma grande crise imobiliária. De acordo com um estudo de 2010, o país carecia de cerca de 500 mil unidades de habitação para satisfazer adequadamente as necessidades da população, mas devido ao colapso dos edifícios, este número é estimado entre 600.000 e 1 milhão. Só Havana tem mais de 100.000 pessoas sem um apartamento para morar. Em outras palavras, habitação adequada está no alto da lista das necessidades do povo cubano.

Courtesy of Iwo Borkowicz

Paralelamente à crise da habitação, o país conta com uma indústria do turismo em rápido crescimento. Devido ao regime comunista, as empresas privadas, como os hotéis, praticamente inexistem, apesar dos quase 3,5 milhões de turistas que deverão visitar o país em 2017 - com 90% deles, de acordo com Borkowicz, que visitando Havana. No entanto, o governo permite que a população alugue quartos de suas próprias casas desde 1997, comumente conhecidos em Cuba como "casas particulares", respondendo à demanda turística sem ter que construir grandes hotéis alheios à paisagem de Havana. Este aspecto, bem como a necessidade desesperada de habitação e possíveis ganhos econômicos, inspirou Borkowicz a desenvolver uma proposta que combina habitação social com turismo em Havana Vieja.

Diagram showing infill plans. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

A ideia é unir os dois, renovando edifícios existentes parcialmente em ruínas em torno de Havana Vieja e acrescentando anexos verticais para atender o plano de Borkowicz de construir com uma média de 4 pavimentos. Ocasionalmente, estruturas são projetadas a partir do zero quando o edifício existente não pode mais ser recuperado. Como Borkowicz prevê o uso do espaço em uma proporção de 3 residentes permanente para cada turista, estes edifícios não apenas atenderão a demanda por habitações Havana Vieja, como a ultrapassarão. Atualmente, a escassez de habitações requer 9.200 novas unidades de habitação, com uma superfície de 70 metros quadrados por unidade. Borkowicz analisou 12 quadras habitacionais já existentes em Havana Vieja, usando seus volumes como referência para cálculos sobre sua proposta de uma média de 4 andares por edifício e concluiu que o total gerado espaço de seu projeto poderia chegar a 105.812 metros quadrados - três vezes a área necessária.

Section of Prototype 1. Image Courtesy of Iwo Borkowicz
Spatial diagram of Prototype 1. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Esta proposta não apenas proporcionará mais moradias para a população cubana, mas também servirá como fonte de renda para os habitantes, pois estes poderão alugar mais quartos para os turistas. Uma das principais razões para a crise de habitação em Cuba é a falta de apoio financeiro, no entanto, Borkowicz propõe que os residentes possam pagar os empréstimos durante um período estimado de 10 anos, mantendo cerca de 10% da receita para uso pessoal (estimado em cerca de quatro vezes o salário médio em Cuba).

Diagram showing relative locations of the 6 prototypes. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Como parte de seu projeto de pesquisa, Borkowicz estabeleceu seis protótipos, cada um respondendo às situações específicas: os protótipos 1 e 3 foram concebidos para terrenos existentes que alojam edifícios de um andar em condições muito ruins que serão completamente substituídos; o protótipo 2 aborda uma condição pré-existente semelhante, mas com um edifício ainda em bom estado que pode receber um anexo vertical; o protótipo 4 ocupa lotes de esquina vazios, com apenas partes do edifício anterior, o que torna necessário projetar o edifício a partir do zero; o protótipo 5 conecta duas ruas paralelas juntando dois prédios existentes um ao outro, um em cada rua. Finalmente, o protótipo 6 não é um projeto de habitação social, mas ocupa lotes de esquina e oferece espaços de trabalho para pequenos negócios e empresas locais.

Section of Prototype 4. Image Courtesy of Iwo Borkowicz
Spatial diagram of Prototype 4. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Estas casas são concebidas de tal forma que o apoio estrutural, bem como a infra-estrutura de esgoto e gás, pode permanecer inteiramente inalterada. Em vez disso, a transformação do espaço ocorre através da reorganização de paredes não estruturais, permitindo, sempre que possível, pavimentos flexíveis para que os moradores possam organizar diferentes combinações de quartos de hotel, ou, alternativamente, expandir seu próprio apartamento.

Possible plans of Prototype 5. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

"Casa particulares não são hotéis nem um quarto de hóspedes na casa de alguém, mas algo intermediário. Isso altera significativamente a forma como os hóspedes e os anfitriões se relacionam", explica Borkowicz na pesquisa. "Os turistas podem experimentar uma cultura cubana mais profunda e os cubanos não se sentirão como simples funcionários, mas parceiros em troca de serviços e dinheiro - e também de histórias, rotina diária e experiências. Ambas as partes terão a chance de aprender uma com a outra, ao passo que terão, ao mesmo tempo, acesso a uma área totalmente privada em seus quartos ou apartamentos."

Diagram showing uses of the common space in a prototype building. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Este tipo de arquitetura requer uma série de espaços comuns dos quais tanto os habitantes permanentes como temporários podem desfrutar; muito mais do que em um apartamento cubano ou AirBnb comum. Cada um dos edifícios protótipo Borkowicz é individualmente concebido em relação à situação do tecido urbano, no entanto, todos os cinco planos residenciais incluem um espaço aberto com áreas verdes, muitas vezes na forma de grandes pátios internos. Também estão incluídos uma cozinha aberta e uma sala de estar; uma "zona coletiva" na cobertura, incluindo uma lavandaria e um espaço para o cultivo de hortas urbanas e uma área para os moradores criarem galinhas e cultivarem legumes e ervas.

Section of Prototype 5. Image Courtesy of Iwo Borkowicz
Spatial diagram of Prototype 5. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Em seus projetos, Borkowicz prioriza a ventilação natural, usando o pátio principal e pátios secundários menores para proporcionar ventilação cruzada nos quartos não diretamente ligado à rua. O espaço aberto dentro do edifício está acima da exigência do governo de 15% da área total, e as janelas e pátios estão protegidos por proteção solar permeável para permitir a passagem do vento. Além disso, o projeto especifica escadas e grades que permitam um fluxo de ar máximo, usando elementos tradicionais de ferro forjado cubano. O sistema de resfriamento passivo é realizado através de tubos subterrâneos que sugam o ar através dos pátios; nesses tubos a temperatura do ar é estabilizada pela temperatura constante do subsolo, de cerca de 15°C. 

Materiality of the housing projects. Image Courtesy of Iwo Borkowicz

Além das tradicionais grades de ferro forjado, o plano de Borkowicz apoiaria a produção de telhas cerâmicas cubanas, que seriam usadas nos telhados, refletindo a luz solar para evitar o superaquecimento. Uma das escolhas mais importantes no projeto de Borkowicz é manter as características existentes de Havana Vieja, com fachadas que refletem os edifícios clássicos, coloridos e decorados da cultura cubana, preservando o apelo turístico da área. Não é especificada nenhuma escolha de cor, deixando as cooperativas de habitação personalizarem cada casa, o que, espera o autor, faria com que as pessoas se identificassem mais fortemente com o projeto através do uso de formas, materiais e cores tão abundantes dentro da cultura cubana.

Oferecer apoio social, cultural e econômico através de um projeto arquitetônico não é uma tarefa fácil, e é isso que torna a relação simbiótica que surge deste projeto uma coisa realmente bela de testemunhar. Se o dilúvio de turistas dos EUA for encontrar muito mais do que entulho em Havana Vieja, a proposta de Borkowicz é não apenas bela, mas também muito necessária.

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Sobre este autor
Cita: Zilliacus, Ariana. "Combinando habitação social e turismo para resolver a crise habitacional em Havana" [How Combining Social Housing with Tourism Could Help Solve Havana’s Housing Crisis] 06 Jan 2017. ArchDaily Brasil. (Trad. Baratto, Romullo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/802708/combinando-habitacao-social-e-turismo-para-resolver-a-crise-habitacional-em-havana> ISSN 0719-8906

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