Sobre a (ausência de) crítica na arquitetura: ou, por que temos que ler mais que apenas o título

Nesta semana o ArchDaily Brasil está comemorando, junto com seus leitores, seis anos de existência. Diante de tantos motivos para comemorar resolvemos criar este texto para que possamos externalizar certa preocupação com a crítica - ou a falta dela - sobre diversos assuntos que publicamos. Os casos mais recentes, entre muitos outros, foram as publicações "Sedução em escala monumental: o Templo de Salomão em São Paulo" e "Por que é urgente falarmos de mobilidade e gênero".

Importante considerar que a ideia de crítica aqui está ligada ao processo cotidiano de olhar e refletir sobre os objetos da Arquitetura e do Urbanismo, tendo em vista a possibilidade de montarmos um grande repertório comum de coisas pertinentes ao nosso campo profissional e acadêmico. 

A manifestação sobre os mais variados assuntos é mais que desejada e deveria ser uma prática comum. Porém, percebemos - e não apenas nas mídias de arquitetura - que a maior parte das manifestações são mal fundamentadas - baseadas apenas nos títulos e não no teor dos artigos -, algumas desnecessariamente agressivas e, por vezes, preconceituosas e opressivas. Esta postura nos cega para estratégias de retórica interessantes à crítica, como a ironia, utilizada em diversos tratados. artigos e manifestos - e também em um dos textos citados acima. Crítica, antes de tudo, é análise.

Como profissionais formados ou estudantes de Arquitetura e Urbanismo, temos por obrigação analisar qualquer tipo de manifestação em nossas cidades e sociedade, em oposição ao "eu gosto" ou "não gosto". Caso contrário, estaremos repetindo diversos erros do passado (por vezes moderno) onde a indiferença para com as diferenças nos distanciaram do outro diferente. E talvez seja essa a maior lição que nos ensinaram Denise Scott Brown e Robert Venturi em suas observações sobre Las Vegas. 

Temos nos esforçado para dar voz aos mais diversos campos de atuação da nossa profissão, entendendo sempre a cidade (nosso objeto e campo de trabalho) como o suporte do cotidiano comum, banal, como o local das diferenças, tensões, contradições e conflitos.

Pois assim, vemos que a necessidade do olhar crítico (nem ansioso, tampouco compulsivo) em relação a todas as publicações feitas, não só por nós, mas por qualquer outro veículo de comunicação, se faz necessária. Parte dos leitores não se debruça com a devida atenção sobre as questões levantadas, tendo como perspectiva um discurso vazio e carregado de preconceitos, que confunde liberdade de expressão com opressão. Opressão essa que não incide diretamente sobre o trabalho do ArchDaily, mas algumas vezes sobre autoras e autores que publicamos e, mais problemático, sobre os setores desfavorecidos da sociedade.

“A linguagem nunca é inocente”, nos ensina Roland Barthes, escritor e sociólogo francês. A crítica é fundamental, mas devemos ficar atentos para que, com nosso discurso, não acabemos contribuindo com as grandes tensões urbanas e sociais, separando-nos cada vez mais.

Por isso, pedimos: continuem sempre a criticar, com fundamentação, todas as nossas publicações; isso nos ajuda muito a melhorar nossos critérios de trabalho. O contrário também é verdadeiro: discursos de ódio e preconceito não prejudicam apenas o trabalho editorial, mas a profissão e a sociedade como um todo.

- Equipe Editorial ArchDaily Brasil

Sobre este autor
Cita: Equipe ArchDaily Brasil. "Sobre a (ausência de) crítica na arquitetura: ou, por que temos que ler mais que apenas o título" 18 Set 2017. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/879557/sobre-a-ausencia-de-critica-na-arquitetura-ou-por-que-temos-que-ler-mais-que-apenas-o-titulo> ISSN 0719-8906

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