Uma recente pesquisa realizada por Sá & Almeida Paisagismo, no bairro de Ipanema, na zonal sul do Rio de Janeiro, revela interessantes características sobre o projeto original de sua arborização urbana.
Motivado pelo interesse na forma pela qual o bairro foi arborizada e a importância das árvores para sua qualidade ambiental e urbanística, o estudo mostrou características comuns do projeto de paisagismo em todo o bairro. De acordo com a pesquisa, cada rua longitudinal, paralela à orla da praia, foi arborizada com uma espécie de árvore, gerando uma cobertura vegetal específica, conformando de identidades visuais e espaciais diferenciadas para cada via.
Há alguns anos, uma doença atingiu as Cássias da Rua Barão da Torre, o que levou ao corte de inúmeras árvores. Sua ausência revelou uma outra paisagem, um outro lugar, que perdeu grande parte de sua qualidade e identidade. Edifícios de diferentes épocas, alturas e recuos, resultantes de legislações urbanísticas diversas, formam um perfil heterogêneo e fragmentado na espacialidade das ruas. É a sua arborização que cria um sentido de unidade espacial, perdida momentaneamente, com a retirada das árvores acima citadas.
Uma interessante característica paisagística do bairro, além da arborização intensiva, é a forma como foi concebido o plantio das árvores. Cada rua se caracteriza por uma ambientação completamente diferente da outra, colaborando para o sentido de identidade, referência e orientação para as pessoas. As espécies são bastante distintas tanto no formato de suas copas, como nos tipos de troncos, nas folhas e floração.
As ruas perpendiculares à praia, diferentemente daquelas paralelas, foram todas arborizadas com a mesma espécie: a popular amendoeira-da-praia (Terminalia catappa), também conhecida como sete-copas ou ainda chapéu-de-sol. Essas ruas canalizam o vento do mar carregados de salinidade, esta espécie é bastante resistente à esta condição. Nas duas grandes praças do bairro - Praça General Osório e Nossa Senhora da Paz - todo o perímetro foi marcado por unidades da mesma espécie, numa delas foi utilizado a Ficus religiosa e na outra as Amendoeiras, conformando assim características próprias.
Das sete espécies utilizadas, apenas duas são nativas do Brasil: os tradicionais Oitis (Licania tomentosa), espécie da Mata Atlântica, endêmica do Brasil [1] e largamente utilizada na arborização de vias de cidades do sudeste brasileiro. Esta árvore frutífera é considerada uma das mais resistentes ao plantio em meios urbanos, e por isso configuram a rua mais íntegra em relação à arborização - Rua Nascimento Silva [2], com dossel de suas copas bem demarcado. A outra espécie nativa é a monguba [3], (Pachira aquatica), espécie de origem da América do Sul amazônica, com frutos e floração de aroma marcante e utilizada aqui na Rua Visconde de Pirajá.
As outras espécies identificadas são Cássia-de-sião (Senna siamea), de origem asiática; Flamboyant (Delonix regia) tem origem na África tropical e Madagascar; e ainda as figueiras Ficus religiosa, originária do sul e sudeste asiático e a Ficus benjamina, também de origem asiática. Na época da concepção do projeto ainda não existia a atual abordagem em relação a se utilizar preferencialmente árvores nativas em projetos desta natureza; o apelo maior era para o embelezamento e o sombreamento.
Na imagem acima, é possível identificar a distribuição das espécies sobre o mapa original do loteamento do bairro, onde fica evidente a caracterização do projeto. Cabe ressaltar que duas das ruas longitudinais foram abertas posteriormente ao parcelamento original, e por isso não estão representadas no mapa da ilustração, a Rua Redentor e Rua Barão de Jaguaripe. Estas não obedecem à concepção original do projeto de arborização, e hoje em dia apresentam as mesmas amendoeiras apesar de serem ruas longitudinais.
É sabido que o projeto de urbanização é do final do séc XIX, mas não foi possível identificar a data do projeto de arborização. Possui com um forte sentido de identidade, que infelizmente foi sendo desfigurado ao longo dos anos pelo plantio de outras espécies que modificaram o projeto original e reduziram seu impacto visual.
Notas
[1] http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/FichaPublicaTaxonUC/FichaPublicaTaxonUC.do?id=FB16815
[2] Foi feita uma ampla pesquisa em diversas instituições, mas não foi possível obter ilustrações botânicas de uma das árvores mais características do Rio de Janeiro, e original da Mata Atlântica: o Oiti, Licania tomentosa. Por isso a imagem indicada é do Herbário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro: goo.gl/DCLGxB
[3] goo.gl/PPzNaE