Nascido em Artigas, no Uruguai, na segunda década do século XX, Eladio Dieste sagrou-se exímio construtor, com a maior parte de sua obra situada na capital de seu país origem, Montevidéu e em cidades adjacentes. No entanto, sua obra acabou obtendo reconhecimento mais amplo depois de sua morte, após o Massachussets Institute of Technology (MIT) reconhecê-la em 2005 por meio do trabalho teórico de Stanford Anderson. Formado em Engenharia, sua relação com o canteiro de obras e experimentações in loco permitiram-no explorar ao limite a materialidade e as possibilidades estruturais.
Com um trabalho intimamente ligado à relação entre materialidade e canteiro, desenvolveu uma rica produção arquitetônica a partir de estudos de finas cascas cerâmicas, batizadas por ele como Cerâmica Armada. Junto a esta técnica construtiva, Dieste encontrou na adoção de tijolos cerâmicos a essência à resolução estrutural requerida, dado que o material apresentava excelentes propriedades estruturais – resistente aos intrínsecos esforços de compressão; rapidez construtiva; facilidade de mão-de-obra; e que junto à inserção do aço, resistia à flexão. A partir disso, encontrou no tijolo a natureza ideal à plasticidade e desenho estrutural buscado, possibilitando vencer grandes vãos com esbeltas estruturas autoportantes, apoiadas somente nas extremidades – livres de apoios centrais, onde parede, piso e teto unificavam-se como um só corpo.
Mas por que Eladio Dieste pode ser considerado um notável construtor?
A partir do entendimento do tijolo como material síntese à solução estrutural e formal ele pôde resolver uma série de outras questões – social, ambiental e econômica, construindo igrejas, armazéns, silos, fábricas e tanques.
Crítico à difusão da Arquitetura Moderna pelos diferentes trópicos, questionava a estandartização dos sistemas construtivos inicialmente adotados e advindos da Europa nas construções latino-americanas. Diante das diferenças climáticas, as materialidades presentes e características da arquitetura brutalista, como o uso do concreto armado e enormes panos de vidro, adotados no pós-guerra, eram mais apropriados ao clima da Europa do que da América Latina, perante a predominância solar e de chuvas. Do ponto de vista social, os mesmos não pareciam adequados à cultura latino-americana.
A economia material também é dos pontos chave de suas arquiteturas. Mesmo antes do termo “sustentabilidade” ser popularizado, Dieste já indagava acerca da economia material integral, baixo custo de produção e também, economia de fôrmas, as quais eram posteriormente reutilizadas.
Desta forma, pela adoção material, o construtor conseguiu quebrar a rigidez e tradicionalismo presentes dentro dos cânones modernos, permitindo a criação de finas e fluidas estruturas de cascas cerâmicas, a partir de um desenho ideal às diferentes tipologias e territorialidade. Por apresentar facilidade e rapidez produtiva, o material possibilitou significativa economia na produção das superfícies.
Ao longo de sua carreira também enfatizou a importância do canteiro para o processo estrutural, não apenas através de representações bidimensionais, normalmente atreladas a arquitetos, mas pelas experimentações in loco. Suas obras dificilmente poderiam ser desenhadas a princípio, desde os desenhos bases (plantas, cortes e elevações) até os detalhamentos executivos para produção.
Sintetizando, a qualidade expressa na dissociação dos elementos construtivos, dispõe estrutura, cobertura e canteiro representados como única instância. Nesse sentido, a forma nasce a partir do desenvolvimento estrutural, onde a resolução da estrutura gera um trabalho formal surpreendente.
A Igreja Cristo Obrero, localizada em Atlántida no Uruguai possivelmente representa o maior exemplo da aplicação das técnicas desenvolvidas por Dieste. Com paredes e coberturas tidas como um elemento único pelo desdobramento construtivo, a obra apresenta ao nível do piso, geratriz horizontal pousada sobre o solo que, à medida que se verticaliza, serpenteia-se. Ou seja, a variação permite um desenho fluído que só foi possível graças ao aparelhamento de tijolos de pequena dimensão.
Uma dupla camada de tijolos cerâmicos e espaçamento de alguns centímetros preenchido com armação em aço (da base ao serpenteado no topo), posteriormente, recebe uma leve camada de argamassa, conduzindo à horizontalidade espacial da superfície.
Dentro da inventividade do engenheiro aplicada às soluções desta tipologia, há a criação de uma família destas superfícies, após combinações regradas: geratriz reta na base e serpenteada no topo, como é o caso da Igreja Cristo Obrero; geratrizes serpenteadas na base e no topo e reta no nível médio da superfície, como é exemplo a Igreja de Nossa de Nossa Senhora do Rosário; e por fim, geratrizes retas na base e topo e serpenteada no nível médio, a exemplo do Mercado central de Montevidéu.
Além das paredes regradas, também desenvolveu famílias de abóbodas e tanques. Vale destacar que as superfícies e geometrias geradas fundem a ideia ao desenvolvimento e a possibilidade da construção só possível graças ao entendimento material.
Referências Bibliográficas
REBELLO, Y. Bases para Projeto Estrutural na Arquitetura. 4.ed. São Paulo: Zigurate, 2007.
REBELLO, Y. A Concepção Estrutural e a Arquitetura. 9. ed. São Paulo: Zigurate, 2000.
ROMÁN, Claudio Escandell. Eladio Dieste e a cerâmica armada. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília. Brasília, 2012.
STANFORD, Anderson. Eladio Dieste: Innovation in Structural Art. New York, Princeton Architectural Press, 2004.