Inaugurada no último sábado (16) no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo, a mostra “Experimentando Le Corbusier – Interpretações contemporâneas do modernismo”, que conta com curadoria de Pierre Colnet e Hadrien Lelong, da editora de design Cremme e expografia assinada pelo escritório paulistano MNMA Studio, busca instituir uma reflexão aos desdobramentos da obra do arquiteto franco-suíço no que diz respeito à produção arquitetônica, urbana, ideológica e social ao modernismo brasileiro.
Com 20 artistas convidados – arquitetos, designers e artistas plásticos – que desenvolveram trabalhos e pesquisas variadas a partir dos cânones da obra do arquiteto, a mostra busca atuar através da “transdisciplinaridade da arte”, como pontuou Mariana Schmidt, sócia-arquiteta responsável pelo desenvolvimento expográfico.
Nossa equipe foi conferir de perto a inauguração e conta abaixo alguns detalhes das obras:
Estudo Nº1 – Aleph Zero
“Da pré-existência ao ideal de homem. Os olhares entre o novo e o velho mundo transpassam as lentes dos viajantes, que colecionam além de imagens, outros tantos tempos. A releitura da figura traz à tona o encontro dessas épocas e culturas, seja pela técnica ou pela linguagem: O embate na mata virgem entre nativos e estrangeiros.”
Planorama – AR Arquitetos
Por meio da adoção dos tradicionais binóculos de fotos antigas, a obra permite que o público, ao inserir o olhar sobre as lentes, possa “espiar” algumas das obras do arquiteto, como a cobertura do apartamento feita para Charles de Beistegui, de modo que “[...] o periscópio mira (e vigia) um futuro pretérito que se estende à distância para além das paredes à meia altura do terraço jardim burguês.”.
LC+LC=BSB – Bloco Arquitetos
Aludindo às características e releitura dos dogmas corbusianos aplicados na capital brasileira por Lúcio Costa, a obra busca traçar “um hipotético roteiro” entre a cidade de Brasília, projetada por Lúcio Costa, e a Villa Radieuse de Le Corbusier, por meio de maquete e imagens dos dois planos.
Somos todos Ciborgues agora – Estudio Guto Requena
Por meio da temática frequentemente exposta e trabalhada por Guto Requena, o arquiteto e designer junto a sua equipe sintetizam que “o corpo humano e sua objetividade passam por uma profunda transformação no momento atual em que questões orgânicas e tecnológicas convergem. O modo ‘multidirecional’ de troca de informações, tão característico do mundo digital, coloca em questão a natureza humana, pois o homem está mais num espaço e num tempo estável e fixo, a partir do qual calcula racionalmente seus pensamentos”. Portanto, a obra sintetiza que “o modulor de Le Corbusier está morto”.
Fábula – FGMF
Por meio de uma instalação, numa espécie de portal, a obra convida o expectador a “uma vivência sensorial e imersiva, estimulando assim sua leitura individual”.
Exercício sobre planos – Gabriel Ranieri e Pedro Ribeiro
Numa sucessão de folhas brancas de papel – geralmente “compreendida como a base para o próprio ato de criação e de início do projeto”, os artistas dispõe um conjunto destas estrategicamente recortadas e posicionadas frente uma a outra como um bloco, sugerindo que “cada folha não vale por si só, mas concentradas sugerem novas camadas de conhecimento resultantes no conjunto que é metaforicamente o processo contínuo e o projeto como um todo”, de modo que o bloco cria “espaços de luz e sombra, ilustrando a fachada da Notre-Dame-du-Haut”.
S. Paulo como Projeto - Metro Arquitetos Associados
Com a ideia de redes de conexão, o trabalho do escritório “junta o desenho da forma da cidade com a lógica das redes, dando visibilidade material ao território sem reduzir o potencial de transformação e flexibilidade próprias da cidade contemporânea”.
“Os olhos que não veem” – MNMA Studio
Convidando espectadores a colocarem óculos de realidade virtual, a instalação transporta-os pela tecnologia a “dois contextos no Minhocão: dentro de um carro em movimento e dentro de um apartamento”, de forma que “o trabalho desdobra os detalhes que Le Corbusier via e os que decidiram não ver para colocar o seu ‘homem moderno’ a frente do tempo, prevendo o progresso, a frente de construções da época, prevendo um urbanismo de zoneamento, a frente do indivíduo.”.
São Paulo Capital Brasília – Nitsche Arquitetos
Projeções de imagens via satélite das cidades de Brasília e São Paulo, numa variação de escalas isoladas de informações cartográficas evidenciam o desenho do tecido urbano por meio de aproximações em constância geradas pelo vídeo. “O resultado gráfico procura questionar como um pensamento em busca de uma cidade moderna cria vazios tão limitadores quanto os criados pela falta de planejamento de uma cidade contemporânea.”
Topos – Play Arquitetura
Indo em direção oposta à visão do “tradicionalismo moderno”, a obra retrata a “necessidade de renovar as crenças na capacidade de transformação coletiva, vislumbrando uma nova utopia, antes que a ideia de distopia seja a única a ocupar nossos horizontes. Entende-se que o caráter revolucionário do modernismo se diluiu e o que antes era uma postura ética foi se reduzindo em grande parte a exercícios ou cacoetes estilísticos”.
“Ética e Estética formam uma só coisa” – Terra e Tuma
No trabalho do escritório paulistano, “a frase de Wittgenstein é inserida sobre uma folha em branco”, que como ponto inicial a construção da reflexão conjunta, que convida o expectador a carimbar a folha como complemento da ideia inicial, aludindo que “o objeto arquitetônico não se finaliza meramente em sua construção, também tece influências sobre uma narrativa urbana, uma cultura, um ponto de vista”.
Entropical Modernism – Triptyque Architecture
“Um modesto objeto, em contextos diferentes, responde de forma diferente”. É assim que a obra é descrita, proposta que “questiona a razão pelo qual o modernismo teve uma aceitação tão diferente no ambiente tropical quanto no hemisfério norte”. Desta forma, através de um objeto em concreto e espécie vegetal junto à instalação de um espelho sutilmente disposto sob o jardim do museu, a obra busca imaginar “um terreno comum onde à natureza seja o agente e a arquitetura a plataforma para se desenvolver uma relação simbólica entre o construído e o orgânico”.
Precisões em Branco e Preto – Alexandre Benoit, Paulo Mendes da Rocha e Catherine Otondo.
O artista Alexandre Benoit é o responsável por traduzir os questionamentos entre Mendes da Rocha e Otondo à exposição, através de ilustrações monocromáticas. Através de diálogo “espontâneo”, o arquiteto conserva “uma visão ampla da arquitetura como forma de conhecimento, ligada às transformações da História”, de modo que “Teoria e desenho convergem para pensar na responsabilidade social do arquiteto e propor uma reflexão sobre seu lugar na sociedade”.
Architettura Povera – Mickael Labbé
“A exemplo do premiado projeto do escritório Terra e Tuma, Labbé discorre, em seu artigo, sobre as micro histórias cotidianas tecidas pelos encontros da vida urbana”.
Modulor – Carla Chaim
Sob a ideia do sistema de proporções elaborado por Le Corbusier no século XX – o Modulor – a artista realiza uma série de desenhos como “resultado de regras e procedimentos” do conjunto. Ainda vale ressaltar que “a maneira como as cores aparecem no resultado final depende do processo, da dobra e do preenchimento com a cor preta no papel que, com sua transparência enfatiza o corpo como suporte”, de modo que “juntos criam um novo grid”.
O Movimento e a Pausa – Ivan Padovani
A “construção do olhar” sob o espaço que é experienciado pelo público numa fusão entre arquitetura, instalação e fotografia, permeia “diferentes percursos e pontos de vista entre uma série de módulos e fotografias produzidas sobre o próprio espaço”, onde o “trabalho é ativado a partir do expectador por meio desta promenade architecturale”.
White Lies (Vers Une Architecture) - Lucas Simões
Dentro da sala expositiva, uma grelha é formada por seis esculturas dispostas no espaço que, utilizando três materiais diferentes, ferro, papel e concreto, “aparecem como pilares sem fundação de um edifício em construção/demolição”, a partir da “arquitetura moderna, sua intenção utópica, suas promessas, seus fracassos e revisões críticas através do tempo [...]” como ponto central da pesquisa realizada pelo artista.
Releitura Mobiliárias – Instituto Leo
Inspirando-se na obra de Le Corbusier, marceneiros do instituto apresentam “os princípios formais de projetos, como as Unidades de Habitação e a Villa Savoye, refletidos e reinterpretados” através da materialização de cinco peças de mobiliário.
Taquara – Irmãos Campana
O pavilhão construído em bambu funciona como “um abrigo arcaico modernista que se torna um refúgio para a nossa existência inquieta e representa a recriação dos nossos sonhos desde a infância, o retorno às nossas memórias afetivas, o bem-estar, a alegria”.
Comprimentar - Regularswitch
O desenvolvimento gráfico fundamenta-se “no confronto ao Modulor como suporte de comunicação.”. A partir desse pressuposto, “cria-se uma tipografia adaptável, na qual a letra se transforma em elementos tectônicos e a palavra em conjunto em volumes”.
A mostra fica em cartaz até o dia 12 de agosto no Museu da Casa Brasileira. Vale a pena conferir!
Nota: Todas as citações presentes neste artigo foram retiradas do comunicado de imprensa fornecido pelo MCB.