Como parte de nossa cobertura da Bienal de Veneza 2018, apresentamos a seguir a participação do escritório paulistano GrupoSP: uma instalação intitulada "unnamed spaces" que faz parte da exposição FREESPACE. Abaixo, os arquitetos descrevem sua contribuição com suas próprias palavras.
Espaços sem nome [unnamed spaces] era uma forma pela qual o professor e artista Flávio Motta [1] costumava designar os espaços livres, gentis e abertos de arquiteturas radicais que abrigavam a imprevisibilidade da vida. Podem também se referir aos espaços abertos ou as clareiras existentes em nossa urbe.
Vivemos em uma cidade que ocupa quase toda sua superfície e que possui poucos espaços livres. Temos também consequentemente poucos espaços públicos.
Acreditamos que trabalhar como arquiteto aqui é de certo modo fazer um discurso sobre esta condição. Nos parece que a arquitetura é mais interessante quando entendida como uma forma de construir os vazios. Construir os espaços qualificados para a vida.
Ao mesmo tempo cremos que não seria inteligente abdicar de uma inteligência já construída, as arquiteturas anteriores e que vivemos. Desta forma procuramos entender o que a história nos ensina para poder fazer aquilo que fazemos.
Os projetos que apresentamos podem ser entendidos como uma espécie de genealogia. Eles guardam relações óbvias entre si e correspondem a uma forma pela qual entendemos a arquitetura que realizamos em nosso escritório.
Podemos destacar os seguintes aspectos:
1. concentração dos serviços em blocos lineares de infraestrutura, liberando os espaços e gerando vazios qualificados para a vivência;
2. concentração das estruturas nestes mesmos blocos, tornando-os protagonistas da arquitetura;
3. construção entendida como sucessão de superfícies não planares (verticais e horizontais), o que faz com que as etapas realizadas sejam como adições. Estas ações construtivas sobrepostas se transformam em aspectos plásticos da arquitetura resultante.
Os espaços gerados por estas ações projetuais procuram dialogar diretamente com os espaços sem nome marcantes da arquitetura brasileira, reconhecidos historicamente por sua generosidade, dignidade e espírito libertário, em oposição a um discurso formal. São, portanto, esses freespaces que habitam o nosso imaginário e a nossa prática.
Instalação
Dois painéis verticais em chapa de aço 4mm pairando a 1.05m do chão do solo fazem alusão a uma das obras mais importantes do escritório: a sede do SEBRAE em Brasília. Suas dimensões, posicionamento e forma correspondem às empenas periféricas do edifício em escala 1:20.
Estes planos expositivos configuram um espaço interno mais reservado no Arsenale, porém completamente aberto e permeável, e sobre os quais são projetados, internamente, dois filmes: um que enuncia os unnamed spaces no edifício do SEBRAE e em outras obras escritório; outro que apresenta obras referenciais da arquitetura em São Paulo que vieram antes, mas que contextualizam e amparam nossa prática.
No caso do SEBRAE, trata-se de um complexo arquitetônico projetado em um concurso nacional organizado pelo Instituto Brasileiro de Arquitetos de Brasília (IAB-DF). O terreno situa-se na continuidade do eixo comercial de uma superquadra e apresenta declividade típica de Brasília, situado junto a este vale que cai em direção ao Lago Paranoá. O conceito do projeto era manter livre o chão de Brasília como uma continuidade deste solo público a partir das superquadras habitacionais. Teríamos dois térreos: um superior e outro inferior onde situam-se os programas mais coletivos e abertos do SEBRAE.
No térreo superior temos apenas os espaços de acolhimento e acessos. No térreo inferior, temos as funções mais coletivas e abertas à população externa – biblioteca, auditório, café, salas de aula e o pátio interno. Finalmente nos dois últimos pavimentos temos os escritórios. Aqui é possível ver com clareza a organização do programa: a concentração das infraestruturas em planos verticais periféricos e os planos livres de trabalho internos.
Quando o visitante está entre os planos expositivos, sua posição relativa ao edifício original é justamente no pátio interno do complexo. O freespace público destinado a todos.
Diagramas [apresentados em um dos painéis que compõem a instalação]
Sede do SEBRAE a Brasília, 2008-2010
Diagrama / 1:500
Escola Pública em Votorantim, 2006-2009
Diagrama / 1:500
Além de ser um edifício público, permite a inserção da paisagem no interior do edifício, com o desfrute da mesma a partir das rampas abertas.
Edifício Residencial Simpatia, 2007-2010
Diagrama / 1:500
Além de ser um edifício público, permite a inserção da paisagem no interior do edifício, com o desfrute da mesma a partir das rampas abertas.
Casa em Itu, 2014-2018
Diagrama / 1:500
Uma casa aberta para a paisagem, com amplos espaços abertos entre os blocos privados.
Casa no Morro do Querosene, 2004-2008
Diagrama / 1:500
Apesar de ser uma casa, sua materialidade transparente permite a percepção de sua situação na cidade, como no edifício Simpatia.
SESC em Limeira, 2017-2022
Diagramma / 1:500
Programa mais democrático de nossa arquitetura. Os programas estão organizados em torno de uma praça que admite a passagem da cidade.
Sede do CAU/BR e IAB/DF em Brasília, 2016
Diagrama / 1:500
Assim como o SEBRAE, uma rua que estende o chão público da cidade e se multiplica nas atividades públicas destas duas instituições.
Habitação estudantil para UNIFESP em Osasco, 2015
Diagrama / 1:500
Serviços concentrados em estruturas aéreas longitudinais liberam o chão para os caminhos e encontros dos estudantes.
Museu urbano e difuso: o novo MAM de São Paulo, 2013
Diagrama / 1:500
Ampliação da rua como espaços expositivos. Um museu feito de cidade.
Anexo do Museu do Ouro, Sabará, 2004
Diagrama / 1:500
Interposição de uma estrutura longitudinal concentrada contra um edifício histórico conforma os espaços de convivência entre eles.
FICHA TÉCNICA
Projeto Expográfico e Comunicação Visual
Grupo SP
Alvaro Puntoni; João Sodré
Bruno Satin; Miguel Meister; Paola Ornaghi; Ana Carolina Mulky; Otavio Melo [colaboradores]
Filmes
Pedro Kok
Arquiteto local
Martin Weingert
Produção e Montagem
Grupo SP; Pedro Kok; Piero Morello
Consultoria Estrutural
Heloísa Maringoni
Agradecimentos
Alvaro Razuk; Daniele Pisani; Eneida de Almeida; Evelise Grunow; Izadora Bertussi; Marco Ballarin; Massimo Triches; Stefano Tornieri.
* Esta participação não contou com nenhum apoio governamental ou institucional.
[1] MOTTA, Flavio, "Paulo Mendes da Rocha". Acrópole, n.343, pp. 19-20, set. 1967. Flavio Motta (1923-2016) liderou com o arquiteto Vilanova Artigas a reforma educacional na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP)