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Como seria um tradicional parque parisiense para você? Para muitos, só existe uma imagem capaz retratar com exatidão a essência deste espaço: A Sunday Afternoon on the Island of La Grande Jatte, de Georges Seurat. A famosa pintura retrata a burguesia desfrutando de um oásis natural, uma ilha verde em meio a uma cidade industrializada.
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E o típico parque parisiense do século XXI, como seria? Esta questão foi levantada pela primeira vez em 1982, quando o governo francês propôs um concurso público de arquitetura para o projeto do Parc de la Villette, selecionando Bernard Tschumi como o vencedor, o qual concebeu uma paisagem muito inovadora para a época, estabelecendo-se como a principal referência para o projeto de parques urbanos durante as décadas seguintes.
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O Parc de la Villette, foi implantado onde previamente existiu um grande matadouro que funcionou durante boa parte do século XIX e XX. O matadouro, localizado na região nordeste da capital francesa, foi construído em 1867 como parte dos planos de renovação urbana concebidos pelo barão von Haussmann. Fechado em 1974, o antigo matadouro deixou um enorme vazio na cidade que suscitava as mais diversas opiniões. François Mitterrand, então presidente da França, convocou um concurso público de arquitetura com o objetivo de encontrar uma proposta inovadora que reinventasse este enorme espaço urbano. Como parte de uma iniciativa chamada de “Grands Projects”, o concurso para o La Villete servia como uma estratégia de modernização dos monumentos e espaços públicos do país. Uma série de convocatórias foram abertas incluindo inscrições da comunidade internacional de arquitetos, como Zaha Hadid e Rem Koolhaas. O programa do concurso, intitulado de “Um Parque Urbano para o Século XXI”, estabelecia a criação de um novo paradigma, buscando redefinir amplamente o conceito de um parque público urbano.
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A proposta vencedora, concebida pelo arquiteto Bernard Tschumi, utilizava a arquitetura como uma ferramenta para responder aos questionamentos da cidade contemporânea. Diferentemente dos exemplos precedentes, como o Central Park de Nova Iorque projetado por Frederick Law Olmsted, a proposta de Tschumi era o oposto do típico parque urbano. Ao contrário de ser visto como um lugar para escapar da cidade, La Villete seria uma estrutura que reproduziria a condição da cidade onde está inserida. Mais especificamente, o arquiteto contestava o sentimento consensual do final do século XX de que a cidade era grande demais, anônima demais e desumana demais. A partir disso, o seu projeto para o La Villete procurava reproduzir essa sensação de desorientação: a sinalização é propositalmente insuficiente e seus caminhos sinuosos, levam os visitantes do nada à lugar nenhum. Em relação a história do lugar, Tschumi evita propositalmente qualquer referência histórica em uma tentativa de construir um “não-lugar”, onde as pessoas estão livres para apropriar-se deste espaço à sua maneira, sem nenhum acordo prévio ou segundo normas históricas de como comportar-se em um parque parisiense: lembre-se da famosa pintura de Seurat. Como consequência disso, um dos principais críticos do Parc de la Villette – a platforma Project for Public Spaces, ranqueou o parque de Tschumi como o terceiro pior parque do mundo – afirmando que este é um espaço público muito pouco agradável.
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O inovador esquema proposto por Tschumi, atualmente muito conhecido, está baseado em uma grade sobre a qual se localizam pontos, linhas e superfícies; estes elementos teóricos traduziam-se respectivamente em estruturas vermelhas (pontos), caminhos sinuosos sem sentido (linhas) e espaços verdes (superfícies). Os elementos mais famosos são as suas estruturas vermelho-sangue, às quais Tschumi chamou de “follies”, em referência às estruturas caprichosas e pouco funcionais dos tradicionais jardins ingleses. Estas enormes estruturas não-funcionais encontram-se espalhadas uniformemente ao longo do parque, tornando-se elementos de orientação dentro de um parque sem uma lógica muito clara.
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Estes elementos simbólicos do parque, concebidos por Tschumi, de certa maneira se aproximam dos centros culturais que ele abriga. São diferentes museus e salas de espetáculos além da Filarmônica de Paris, projetada por Jean Nouvel. À medida que estas instituições atraem mais visitantes ao parque, ele torna-se cada vez mais uma extensão da cidade – cumprindo exatamente com aquilo que Tschumi propunha. Ainda que hospede uma ampla e diversa programação, muitos dos visitantes que procuram o parque são atraídos mais por sua peculiaridade e estrutura sem sentido do que por suas atividades culturais. Mas quem diria que visitar La Villete não é um programa cultural por si só?
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Então, como é o típico parque parisiense do século XXI ? Para Bernard Tschumi, é um lugar onde as pessoas brincam com suas estruturas sem sentido, navegam por caminhos desconhecidos e, finalmente, interagem umas com as outras. Se os burgueses retratados por Seurat procuravam um lugar à sombra para relaxar em meio à caótica metrópole industrial do século XIX, o parque urbano do século XXI ainda atrai muitos visitantes pelas mesmas razões, mas agora com um novo propósito: a interação social. De fato, como pode ser visto em inúmeros artigos acadêmicos além de projetos como o Reimagining the Civic Commons (patrocinado pela The Knight Foundation, The JPB Foundation, The Kresge Foundation e The Rockefeller Foundation), é consensual que o parque urbano contemporâneo tem se transformado em um espaço vital para o multiculturalismo, as relações inter-bairro e o contato entre as pessoas em uma sociedade cada vez mais digital e segregada. O incentivo à interação humana é, ao que tudo indica, um dos principais elementos que definem um bom parque no século XXI.
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